Padroeiro dos animais

Celebrando São Francisco de Assis, Igreja recorda cuidado com a Criação

Frei destaca que São Francisco louvava a Deus por toda a Criação e lembra o respeito que deve estiver por todas as manifestações da vida

Thiago Coutinho
Da redação

A Igreja celebra neste sábado, 4, a vida de São Francisco de Assis, padroeiro dos animais / Foto: Edson Junior por Unsplash

O padroeiro da ecologia, também conhecido como protetor dos animais, São Francisco de Assis, é celebrado neste sábado pela Igreja Católica. O fundador dos Franciscanos é também conhecido por seu desapego às coisas materiais e renúncia às riquezas.

Segundo Frei Rodrigo da Silva Santos, OFM, responsável pela Secretaria Franciscana Imaculada Conceição do Brasil, a associação de São Francisco de Assis com a natureza e os animais surgiu em sua própria vivência bíblica, em seus momentos de meditação com Deus-Criador. “Ao mesmo tempo que Francisco dirige sua ação de graças e o seu louvor ao ‘altíssimo e sumo Deus, Senhor rei do céu e da Terra, criador de todos os seres espirituais e corporais’, também se volta à inteira criação e a convida para bendizer o Senhor: ‘toda criatura que há no céu e sobre a terra, que há debaixo da terra e no mar e as que nele existem'”, detalha.

Era parte intrínseca da vida e formação religiosa de São Francisco louvar a Deus por toda a Criação. “A partir desse ocular de fé, todos os seres criados, também a criatura humana, criam uma grande irmandade. Por isso, não por acaso, e passando por terríveis enfermidades, há menos de dois anos antes da sua morte, São Francisco de Assis compõe o ‘Cântico das Criaturas’, também conhecido como ‘Cântico do Irmão Sol’, assim narrado pela biografia [nesta obra, São Francisco faz uma profunda reflexão sobre seu amor por Deus e toda a Criação]”, afirma o frade.

São Francisco tornou-se o padroeiro dos animais pela sua admiração e relação estreita com a natureza. “E não só isso, podemos também afirmar que o ponto culminante da associação de São Francisco com a criação fez nascer na Igreja a grandiosa Carta Encíclica Laudato Si’ e a Exortação Apostólica Laudate Deum, do Papa Francisco”, contextualiza o frade.

A responsabilidade humana sobre a Criação

A teologia franciscana, conforme narrada nas obras deixadas pelo próprio São Francisco, deixa claro que o santo tinha uma relação afetuosa e, sobretudo, de respeito com a Criação e a vida. “A teologia franciscana, no que toca à relação de São Francisco com a Criação, nos diferentes relatos que vão desde a pregação aos pássaros, ao contato com o falcão no Monte Alverne; ou da proximidade com o Lobo de Gúbio, à soltura da lebre e de outros animais etc., nos transmite acima de tudo um olhar respeitoso sobre todas as criaturas que são espelhos da bondade do Deus-Criador de todas as coisas”, observa Frei Rodrigo.

O frade atenta-se para o fato de que as criaturas são, por assim dizer, uma mensagem clara de Deus que nos remete à primeira página da Criação: “E Deus viu que tudo era bom”. “Assim sendo, de nada podemos nos apoderar ou apropriar de forma egoísta porque tudo é pertença de Deus. Há em Francisco uma profunda fé e intuição teológica da universal paternidade de Deus. A partir desta compreensão teológica da paternidade universal de Deus, é fácil compreender que todas as criaturas são ‘irmãos’ e ‘irmãs’, porque todas, a seu modo louvam, obedecem e agradecem o Criador, e muitas vezes melhor do que a criatura humana quando esta se deleita em vícios e em pecados”.

A convivência com a vida animal

A convivência com animais de estimação pode ajudar em diversos aspectos: no desenvolvimento da compaixão, no cuidado com o próximo e até com a saúde mental. “A convivência com os animais de estimação é, de fato, uma grande ajuda para a vida humana”, concorda o frade. “Vários animais de estimação são ‘presenças terapêuticas’ na vida de muitas pessoas, uma vez que estes animais de estimação criam por si mesmos elos afetivos de presença fiel, companhia, apoio, ajuda na diminuição do estresse e espantam por vezes a solidão que os humanos não mais conseguem oferecer a seus semelhantes”, reitera.

Mas há um limite que, de acordo com Frei Rodrigo, deve ser respeitado. As pessoas, por vezes, não compreendem a diferença entre a sacralidade da alma humana e o sentimento carinhoso para com um animal pelo que se cria afeto.

“Até suplicamos as bênçãos divinas sobre os nossos animais de estimação ou rebanhos. Mas o que acontece quando, por exemplo, morre um animalzinho de estimação?”, indaga o freire. “É claro que não rezamos pela ‘alma’ do animal, ou, como vem ocorrendo, surgem pedidos para celebrar missa de sétimo dia pela ‘alma do animalzinho’ que morreu. Sim, podemos e devemos rezar pelas pessoas que sofrem a perda de um animal de estimação. Agradecemos a Deus pelas pessoas que tão bem cuidam da criação. Mas não podemos incorrer no erro de misturar a alma transcendente e imortal dos seres humanos com a alma sensitiva dos animais que tem sua existência terminada com a morte”, pondera.

Sob este ponto de vista, a Igreja apresenta alguns princípios éticos que guiam a relação entre humanos e animais. Assim, há um equilíbrio no respeito à vida e a proteção da dignidade de cada criatura, como ensina o exemplo de São Francisco.

“Existe um princípio ético e moral que deve estar presente na vida dos seres humanos: o respeito por todas as manifestações da vida, entendidas como procedentes do Criador”, afirma Frei Rodrigo. “Não nos foi dado o direito de manipular a vida de quem quer que seja, desde seu germe. Este é um tema muito delicado em tempos de tantos experimentos genéticos”, alerta.

A inspiração franciscana

Questionado sobre como a figura de São Francisco de Assis e sua visão de fraternidade com toda a criação inspiram e desafiam a sociedade contemporânea a adotar práticas mais sustentáveis e a reconhecer o valor de cada ser vivo, Frei Rodrigo sugere inspiração nas palavras do Papa Francisco, quando divulgou a “Economia de Francisco e Clara”.

“Trata-se de uma conscientização global, proposta pelo Papa Francisco, que busca repensar a economia a partir dos princípios de justiça social, solidariedade e cuidado com a vida e o meio ambiente. A Economia de Francisco e Clara contrasta com o modelo capitalista que prioriza o lucro sobre o bem-estar das pessoas e da vida do planeta”, adverte Frei Rodrigo.

“Nesse sentido”, prossegue o frei, “a visão de São Francisco de Assis desafia a nossa contemporaneidade e, inspirada na radicalidade, na pobreza, no cuidado e no reto uso dos dons da Criação, obriga-nos a criar um novo pacto econômico mais humano, respeitoso e inclusivo, promovendo a partilha sóbria e a construção de um mundo mais justo e sustentável”.

Assim como São Francisco resgatou o “paraíso perdido”, recorda Frei Rodrigo, ao mundo de hoje cabe a missão de renovar esta utopia para recriar um paraíso renovado. “Atribuir ao Senhor Deus altíssimo todos os bens; reconhecer que todos os bens lhe pertencem; dar graças por tudo, pois dele procedem todos os bens. E assim a alma límpida e serenada de São Francisco foi capaz de cantar: ‘Altíssimo, onipotente, bom Senhor… Louvado sejas com todas as tuas criaturas'”, finaliza.

Evite nomes e testemunhos muito explícitos, pois o seu comentário pode ser visto por pessoas conhecidas.

↑ topo