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Discurso do Papa Francisco à comunidade católica em Luxemburgo

VIAGEM DO PAPA FRANCISCO A LUXEMBURGO E À BÉLGICA
DISCURSO DO PAPA FRANCISCO NO ENCONTRO COM A COMUNIDADE CATÓLICA NA CATEDRAL DE NOTRE-DAME, EM LUXEMBURGO
Quinta-feira, 26 de setembro de 2024

Boletim da Santa Sé

Sua Alteza Real,
Senhor Cardeal e irmãos Bispos,
Queridas irmãs, queridos irmãos!

Estou muito feliz por estar aqui convosco, nesta magnífica Catedral. Agradeço a presença do Grão-Duque e sua família, as amáveis palavras do senhor Cardeal Jean-Claude Hollerich, bem como os testemunhos do Diogo, da Christine e da Irmã Maria Perpétua.

O nosso encontro coincide com um importante Jubileu Mariano, com o qual a Igreja luxemburguesa comemora quatro séculos de devoção a Maria, Consoladora dos Aflitos e Padroeira do País. Este título condiz bem com o tema que escolhestes para esta visita: “Para servir”. Na verdade, consolar e servir são dois aspectos fundamentais do amor que Jesus nos deu, nos confiou como missão (cf. Jo 13, 13-17) e nos indicou como único caminho para a alegria completa (cf. At 20, 35). Por isso, dentro de alguns instantes, na oração de abertura do Ano Mariano, pediremos a Mãe de Deus que nos ajude a ser “missionários prontos a testemunhar a alegria do Evangelho”, conformando o nosso coração ao seu “para nos colocarmos a serviço dos irmãos”. Detenhamo-nos, então, a refletir precisamente sobre estas três palavras: serviço, missão e alegria.

Antes de mais, o serviço. Foi dito, há momentos, que a Igreja do Luxemburgo quer ser “a Igreja de Jesus Cristo, que não veio para ser servido, mas para servir” (cf. Mt 20, 28; Mc 10, 45). Foi também recordada a figura de São Francisco abraçando o leproso e curando as suas feridas. Eu, sobre o serviço, gostaria de vos recomendar um aspecto hoje muito premente: o acolhimento. Faço-o aqui entre vós, de modo especial porque, neste campo, o vosso País tem e mantém viva uma tradição secular, como nos recordou a Irmã Maria Perpétua, e surgiu várias vezes também nos outros testemunhos, com o grito: “todos, todos, todos!”, repetido em várias ocasiões. Sim, o espírito do Evangelho é um espírito de acolhimento, de abertura a todos, e não admite qualquer tipo de exclusão (cf. Exortação Apostólica Evangelii gaudium, 47). Encorajo-vos, portanto, a permanecer fiéis a esta vossa herança, a esta riqueza que possuís, continuando a fazer do vosso País uma casa amiga para quem quer que bata à vossa porta em busca de ajuda e hospitalidade.

Trata-se de um dever de justiça antes ainda do dever de caridade, como já dizia São João Paulo II ao recordar as raízes cristãs da cultura europeia. Ele encorajava precisamente os jovens luxemburgueses a traçar caminho para «uma Europa não só das mercadorias e dos bens, mas dos valores, dos homens e dos corações», na qual o Evangelho fosse transmitido «na palavra do anúncio e nos sinais do amor» (Discurso aos jovens do Grão-Ducado do Luxemburgo, 16 de maio de 1985, 4). Ambas as coisas. Sublinho isto porque é importante: uma Europa, e um mundo, em que o Evangelho seja transmitido através da palavra do anúncio unida aos sinais do amor.

E isto leva-nos ao segundo tema: a missão. Há pouco, o senhor Cardeal falou da “evolução da Igreja luxemburguesa numa sociedade secularizada”. Gostei desta expressão. Numa sociedade secularizada, a Igreja evolui, amadurece, cresce. Não se fecha em si mesma, triste, resignada, ressentida. Não! Antes pelo contrário, fiel aos valores de sempre, aceita o desafio de redescobrir e reavaliar de um modo novo os caminhos de evangelização, passando cada vez mais de uma simples lógica de cura pastoral a um anúncio missionário – o que implica coragem. E para tal está disposta a evoluir, por exemplo na partilha de responsabilidades e ministérios – como nos recordou Christine –, caminhando juntos enquanto Comunidade que anuncia e fazendo da sinodalidade um “modo duradouro de relacionamento” entre os seus membros.

E sobre a importância deste crescimento, há pouco, foi-nos dada uma belíssima imagem pelos jovens amigos que representaram algumas cenas do musical Laudato si. Parabéns, esteve muito bem! Obrigado pelo presente que nos destes! O vosso trabalho, fruto dum esforço comunitário que envolveu tanta gente na Arquidiocese, é para nós um sinal duplamente profético! Em primeiro lugar, recorda as nossas responsabilidades para com a “casa comum”, da qual somos guardiães e não déspotas. Depois, faz também refletir sobre como esta missão, vivida em conjunto, é em si mesma um maravilhoso instrumento coral para comunicar a todos a beleza do Evangelho. E isto é importante para todos nós. Com efeito, o que nos impele à missão não é a necessidade de “fazer número”, de “fazer proselitismo”, mas o desejo de dar a conhecer a alegria do encontro com Cristo ao maior número possível de irmãos e irmãs. E neste ponto quero recordar uma linda expressão de Bento XVI: “A Igreja não cresce por proselitismo, mas por atração”.

Eis então, para além das dificuldades, o dinamismo vivo do Espírito Santo que atua em nós! O amor impele-nos a anunciar o Evangelho abrindo-nos aos outros; e o desafio do anúncio faz-nos crescer enquanto comunidade, na medida em que nos ajuda a superar o medo de arriscar novos caminhos e nos leva a acolher com gratidão o contributo de todos. É uma dinâmica bela, sã, alegre, que nos fará bem cultivar dentro de nós e à nossa volta.

E assim chegamos à terceira palavra: a alegria. O Diogo, ao falar da experiência da Jornada Mundial da Juventude, recordou a felicidade que sentiu na vigília, quando aguardava juntamente com colegas de todas as origens e nações o momento do nosso encontro, bem como a emoção de acordar na manhã seguinte rodeado de tantos amigos; e ainda o entusiasmo experimentado durante a preparação feita em conjunto em Portugal e a alegria de se reunir, passado um ano, com outros aqui em Luxemburgo. Estais a ver? A nossa fé é assim: é alegre, “dançante”, porque diz que somos filhos de um Deus amigo do homem, que nos quer felizes e unidos, e que se alegra sobretudo com a nossa salvação (cf. Lc 15, 4-32; São Gregorio Magno, Homilias sobre o Evangelho, 34, 3). A propósito, aqueles cristãos tristes, aborrecidos e amuados prejudicam a Igreja. Não, esses não são cristãos. Por favor, conservai a alegria do Evangelho: isso faz-nos acreditar e crescer tanto.

A este respeito, gostaria de concluir recordando uma bela tradição do vosso País, de que me falaram: a procissão da primavera – Springprozession –, que tem lugar no Pentecostes em Echternach, em memória do incansável trabalho missionário de São Willibrod, o evangelizador destas terras. Toda a cidade se junta nas ruas e praças para dançar, juntamente com os muitos peregrinos e visitantes que ali acorrem, e a procissão transforma-se numa grande e única dança. Recordemos que o rei David dançava diante do Senhor e isso é uma expressão de fidelidade. Grandes e pequenos, todos dançam em conjunto rumo à Catedral (este ano até debaixo de chuva, segundo ouvi dizer), testemunhando com entusiasmo, em memória do santo Pastor, como é belo caminhar juntos e descobrirmo-nos todos como irmãos à volta da mesa do nosso Senhor. E aqui, apenas uma breve palavra: por favor, nunca percais a capacidade de perdoar. Vós sabeis que todos devemos perdoar, mas sabeis por quê? Porque todos fomos perdoados e todos precisamos de perdão.

Queridas irmãs, queridos irmãos, é linda missão que o Senhor nos confia: consolar e servir, a exemplo e com a ajuda de Maria. Obrigado a todos vós, consagrados e consagradas, seminaristas, padres, todos, pelo trabalho que realizais e, também, pela ajuda generosa que quisestes partilhar com os necessitados. Onde se encontra um necessitado, ali está Cristo. Abençoo-vos e rezo por vós. E vós, por favor, rezai também por mim. Obrigado.

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