Advogada esclarece como consumidores e empresas devem agir em casos extraordinários como esse, de uma pandemia de coronavírus: “O bom senso é a palavra de ordem”, observou
Julia Beck
Da redação

Sonhos e planos precisaram ser adiados após OMS declarar pandemia de coronavírus/ Fotos: Foto: Drew Coffman – Unsplash/ Freestocks via Unsplash/ Alfuhigi via Unsplash
O mundo soube, no dia 11 de março, que vivia uma pandemia de coronavírus (covid-19). Mais que o anúncio feito pela Organização Mundial da Saúde (OMS), as consequências geradas por essa declaração tornaram possível a constatação da situação do vírus nos muitos países e a iminência de sua propagação no Brasil. Grandes eventos culturais e religiosos, cerimônias e shows precisaram ser adiados, assim como sonhos e planos particulares. Mas como agir diante de um período de tantas incertezas?
Nova data para o casamento
Esperança. Esse sentimento foi essencial para que a pedagoga Priscila Alves e o militar Jonathan Leal tomassem a decisão de adiar o casamento que estava previsto para o último sábado, 28 de março. A escolha precisou ser feita após igrejas no Brasil e no mundo (inclusive a diocese onde o casamento aconteceria) decidirem restringir o número de pessoas em celebrações eucarísticas e sacramentais ou até mesmo cancelá-las.
“Rezamos, e para que pudéssemos viver esse sonho por inteiro ao lado de todos que amamos e são especiais para nós, adiamos a data”, explicou Priscila. Segundo a pedagoga, mesmo com o sentimento de tristeza pelo adiamento, o cancelamento do casamento nunca foi uma opção. “A nossa fé em Deus faz entendermos que o melhor sempre está por vir. (…) Não é sobre adiar nosso dia, e sim cuidar do nosso para sempre”, complementou.
A decisão de adiar o casamento, apesar de ter sido tomada pelo casal, tornou-se mais complexa por envolver outras empresas e pessoas que estavam diretamente ligadas à prestação de serviços para o casamento. A forma como foi realizada a negociação com esses fornecedores e a grande sensibilidade e humanidade deles foram consideradas por Priscila como fundamental para que as escolhas fossem realizadas com tranquilidade e bom senso.

Priscila e o noivo em ensaio fotográfico que antecede o casamento/ Foto: Lucas Lima – Arquivo Pessoal Priscila
“As empresas fizeram o que estava ao alcance (…). Deram todas as opções de datas possíveis para remarcarmos e, assim, evitar o transtorno do cancelamento do contrato, para que não fosse necessário gerar multas. Eu tive a graça de conseguir uma data em que todos os meus fornecedores estavam disponíveis. Por isso, não foi preciso encerrar o contrato com nenhum deles. A alteração da data foi realizada sem custo e não houve a necessidade de multa”, conta a pedagoga.
A advogada Mariana Freitas explica que, em casos extraordinários como esse, de uma pandemia, o bom senso é a palavra de ordem. “Por motivo de força maior, o consumidor e a empresa contratada devem procurar agir com boa fé, e sempre formalizar o que for definido por ambas as partes. Nesse caso, cumpre informar que a formalização não precisa ocorrer pessoalmente, sendo válidas trocas de mensagens e e-mails como meios de prova. Vale lembrar que tal formalidade é essencial para se evitar futuras cobranças ou multas por cancelamentos de contratos”.
Adiar ou cancelar um sonho?

A advogada Mariana Freitas/ Foto: Arquivo Pessoal – Mariana
O cancelamento e o adiamento de um contrato são ações diferentes, assim como seus desdobramentos contratuais, esclarece Mariana. “Adiar um contrato significa dizer que estamos postergando, retardando o cumprimento do que está previsto neste. Já cancelar o contrato significa encerrar o acordo antes deste ser totalmente executado pelas partes”. Sobre este último, a advogada dá maiores detalhes:
“Caso o consumidor prefira cancelar o evento e o serviço, deverá entrar em contato, primeiramente, com a empresa contratada. Após as partes chegarem a uma decisão, é preciso formalizar o que ficou acordado para não haver cobranças abusivas no futuro. Se o consumidor ficar em dúvida se a proposta da empresa é abusiva ou não, ele pode fazer uma consulta no PROCON. Ainda nesse sentido, caso um dos lados prefira buscar a justiça, por se tratar de uma situação excepcional, os dois lados poderão alegar o cancelamento do contrato por ‘força maior’, informando que não prestou o serviço por recomendação das autoridades, e por isso não pode arcar com um prejuízo”.
Remarcando viagens
Assim como Priscila e Jonathan, o engenheiro Caio Marques Luiz também precisou escolher entre adiar e cancelar um plano: uma viagem para a Indonésia. “Quando comprei a passagem, ainda não tinha ouvido falar sobre o coronavírus. Quando começaram os casos na China, não pensei em cancelar, porque não sabia da proporção que poderia chegar. E ainda não sei”, revela Caio. O engenheiro optou por adiar a viagem.
O compromisso de Caio envolvia o contrato com uma agência de viagem, uma companhia aérea e férias programadas no trabalho. “A negociação, diante do cenário, já era esperada. Com certeza, existem muitos casos iguais, e o mundo parou. Dei entrada através da agência, que já sabia como seria o processo, e as férias cancelei sob aprovação da minha chefe (que cancelou o próprio casamento)”. Para o engenheiro, o bom senso das empresas e do consumidor é o melhor caminho.

O engenheiro Caio Marques/Foto: Arquivo pessoal – Caio
“Estamos em um momento de cooperação, todos estão perdendo algo. Neste caso, a empresa deixando de vender, e eu me sujeitando a esperar 12 meses pelo reembolso. Esse momento é delicado para definir planos e compromissos, principalmente por saber que ainda não conseguimos controlar a contaminação. Então, a esperança está no bom senso coletivo. Se está se protegendo, então há esperança!”, opinou.
Como consumidora, a advogada Mariana conta que passa pelo mesmo transtorno que Caio. “Precisei adiar uma viagem que estava prevista para o dia 10 de abril por conta da Covid-19; no meu caso, a agência de viagens que contratei cancelou a viagem”. Mariana explica que a empresa concedeu a ela um crédito integral para utilizar posteriormente em uma nova viagem durante o período de 12 meses.
“O risco de contaminação pelo covid-19 dá aos consumidores o direito de solicitar o adiamento ou até mesmo o cancelamento de passagens aéreas junto às operadoras. Em situações normais, remarcar uma viagem de avião pode sair caro e, dependendo do contrato estabelecido com a empresa aérea, o valor da multa a ser paga pode ser o mesmo cobrado pela própria passagem, por exemplo. No entanto, o risco de contaminação pelo vírus, em nível mundial, é capaz de mudar esse cenário, sendo que esse fator atípico dá aos consumidores o direito de pedir a revisão de contratos”.
Em relação às empresas aéreas, a advogada afirma que o consumidor poderá pleitear o cancelamento gratuito ou a remarcação sem nenhum tipo de custo.