Cardeal Joseph Jean Poupard testemunha o que vivenciou durante o Concílio convocado por João XXIII
Luciane Marins, com colaboração de Danusa Rego
Da Redação
“Conceder esta entrevista me rejuvenesce 50 anos. Eu era um jovem sacerdote, trabalhava na Secretaria de Estado de João XXIII, me recordo como se fosse ontem o dia de abertura do Concilio Vaticano II”. A lembrança é do Cardeal Paul Joseph Jean Poupard, Presidente emérito do Pontifício Conselho para Cultura e para o Diálogo Inter-religioso.
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Por ocasião dos 50 anos do Concílio Vaticano II, em outubro do ano passado, a correspondente da Canção Nova em Roma, Danusa Rego, conversou com o Cardeal Poupard. Ele conta que o discurso do Papa João XXII na abertura do Concílio o impressionou, tanto pela vitalidade do pontífice como pelo conteúdo. “Fez um discurso que permanece impresso no meu coração. Disse, fortemente: nós somos a Igreja de Cristo, e nossa tarefa é infundir nas veias do mundo moderno a essência do Evangelho.”
O evento, que trouxe grandes mudanças para a Igreja Católica, foi convocado pelo então Papa João XXIII em 25 de dezembro de 1961, aberto por ele em 11 de outubro de 1962 e encerrado pelo seu sucessor Paulo VI em 8 de dezembro de 1965.
“Eu me preparei para ser catedrático na minha universidade, me pediram para ‘dar uma mão’ na Secretaria de Estado, para ficar algumas semanas e fiquei por 12 anos,” recorda o cardeal que é francês e estava ali por conta de seu idioma.
Ele conta que teve o “privilégio” de ver as sugestões que os bispos do mundo davam ao Papa, que os havia consultado a respeito do Concílio. “Ele [o Papa] interpelou todos os bispos e Universidades Católicas. ‘O que vocês sugerem para o Concílio?’ Dezenas,
centenas, milhares de respostas chegaram. Eu deveria ler tudo”. Ao final do Concílio, 16 documentos foram publicados.
Com a morte de João XXIII, em junho de 1963, foi seu sucessor Paulo VI que deu continuidade ao Concílio Vaticano II. O cardeal recorda a ida do pontífice às Nações Unidas em Nova Iorque em 4 de outubro de 1965, festa de São Francisco de Assis.
“Paulo VI foi às Nações Unidas levar uma mensagem em nome dos bispos reunidos no Concílio: ‘Não lhes pedimos nada, somente a permissão de trazer a boa notícia que temos há 2 mil anos: o Amor. Nunca que uns controlem os outros, mas que sejamos uns com os outros, pelos outros.'”
João Paulo II era um dos padres mais jovens no Concílio, e um dos mais “presentes”, trabalhava como perito, conta o cardeal. “Foram muitos encontros entre bispos, peritos e assim por uma providência conheci meus futuros Papas”.
Para o cardeal, mesmo tendo se passado 50 anos, ainda há um grande trabalho a ser feito para que o Concílio seja mais conhecido. “Milhões de pessoas sabem o que foi dito do Concílio Vaticano II, alguém sabe o que disseram ao Concílio, mas poucos sabem o que o Concílio Vaticano II disse e ensinou”.
A convocação do Ano da Fé, de 11 de outubro de 2012 a 24 de novembro de 2013, feita pelo Papa emérito Bento XVI, quis contribuir para isso, já que nesse período os ensinamentos do Concílio foram amplamente estudados na Igreja.
Muitos consideram que o Concílio Vaticano II foi uma revolução na Igreja, o cardeal destaca que não. Ele explica que João XXIII queria somente levar a energia do Evangelho, da bondade e do amor de Deus “nas veias” do mundo moderno.
“Paulo VI falava: ‘o que a Igreja fazia no Concílio? A Igreja
amava, rezava pelo mundo e dizia: vocês cultuam o homem, mas nós, mais do que vocês, cultuamos o homem porque a religião de Jesus foi feita para o homem”, lembra o cardeal.
Recordação pessoal de João XXIII
João XXIII, antes de ser Papa, foi núncio apostólico na França. O cardeal conta que depois de eleito Sumo Pontífice da Igreja, ele conservou ‘carinho’ pelos franceses.
“Quando me recebia me dizia: ‘Caro filho belo!’ Quando eu apresentei meus dois primeiros livros, me disse ‘Bravo filho belo, continue, porque eu também, quando tinha sua idade, me esforcei. Continue, é muito importante!’ E eu nunca me esqueci disso!”