"É verdade que existe uma forma arrogante de fazer Teologia, uma soberba da razão, que se coloca acima da Palavra de Deus. Mas a verdadeira Teologia, o trabalho racional da verdadeira Teologia tem outra origem, não a soberba da razão. Quem ama deseja conhecer sempre mais e melhor o amado; a verdadeira Teologia não empenha a razão e a pesquisa motivada pela soberba, mas é 'sed propter amorem eius cui assentit' – 'motivada pelo amor por Ele, a quem deu o seu consentimento'".
.: NA ÍNTEGRA: Catequese de Bento XVI sobre São Boaventura (3)
O Papa continuou a aprofundar outros aspectos da figura de São Boaventura, personagem central das Catequeses nas últimas três semanas.
Dessa vez, o enfoque centrou-se nas diferentes abordagens de investigação teológica entre esse santo franciscano e outro pensador, seu contemporâneo, o dominicano São Tomás de Aquino.
"Ambos exploraram os mistérios da Revelação, valorizando os recursos da razão humana, naquele diálogo frutífero entre fé e razão que caracteriza o Medievo cristão, tornando-o uma época de grande vivacidade intelectual, bem como de fé e renovação eclesial, muitas vezes não suficientemente realçada".
O Pontífice ressaltou que uma das diferenças entre esses dois Doutores da Igreja é a resposta à pergunta se a Teologia é uma ciência prática ou teórica. Para São Tomás, a Teologia implica nesses dois aspectos, de tal forma que o primado da consciência é uma orientação fundamental.
Já São Boaventura oferece uma resposta semelhante, embora com focos diferentes – além da prática e da teórica, ele acrescenta uma terceira atitude, que chama de 'sapiencial', e que abrange as outras duas. "A sabedoria busca a contemplação (como a mais alta forma de conhecimento) e tem como intenção ut boni fiamus – que nos tornemos bons, sobretudo isso: tornar-se bom", explica Bento XVI.
Felicidade plena
O Santo Padre salienta que os dois santos definem de modo diferente o destino último do homem. Para São Tomás, a felicidade plena é ver a Deus; enquanto isso, São Boaventura defende que o conceito mais apropriado da felicidade é amar a Deus.
"Trata-se de focos diferentes de uma visão fundamentalmente comum. Ambos os focos formaram tradições diversas e espiritualidade diversas e, assim, demonstraram a fecundidade da fé, una na diversidade de suas expressões".
Além do exemplo do Pobrezinho de Assis, outra fonte para a elaboração do "primado do amor" – indicado por São Boaventura – são os escritos de um teólogo do século VI, conhecido como Dionísio, que discorreu longamente sobre as diferentes ordens de anjos.
São Boaventura fez uma analogia entre essas ordens e os graus de aproximação da criatura a Deus, salientando que São Francisco pertencia à ordem seráfica (a mais alta). Da mesma forma, sabia que esse nível de proximidade a Deus não poderia se tornar uma norma jurídica; antes, é sempre um dom particular de Deus.
O Papa complementa: "Somente com as nossas forças, não podemos subir rumo à altura de Deus. Deus mesmo deve nos ajudar, deve 'levar-nos' para o alto. Por isso é necessário a oração. A oração – assim diz o Santo – é a mãe e a origem da elevação – sursum actio, ação que nos leva para o alto".
O Doutor franciscano também acrescenta que, na subida rumo a Deus, chega-se a um ponto em que a razão não mais enxerga, mas o amor ainda vê. O Santo Padre comenta: "O amor se estende para além da razão, vê mais, entra mais profundamente no mistério de Deus. São Boaventura foi fascinado por essa visão, que ia ao encontro da espiritualidade franciscana. […] Tudo isso não é anti-intelectual e nem antirracional: supõe o caminho da razão, mas o transcende no amor de Cristo crucificado".
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