As células tronco continuam em pauta. Não são apenas vedetes permanentes, mas aparecem sempre como sendo a chave de todos os segredos da saúde e da doença. Há cerca de um mês veio uma notícia até certo ponto surpreendente: seria possível reprogramar células adultas de tal forma que elas exerçam as mesmas múltiplas funções que se imagina poderem ser exercidas pelas embrionárias.
Claro que embora ainda se trate de uma hipótese a ser comprovada, estaríamos diante de uma grande virada em termos de caminho a seguir para a cura de certas doenças de cunho genético e até mesmo para a produção de certos órgãos: as esperanças já não se colocariam nas células embrionárias, mas exatamente nas células maduras, como a Igreja vem sustentando há um bom número de anos.
As opiniões logo se dividiram, entre os que exaltaram estas descobertas e os que procuraram descaracterizá-las. Os que as exaltam o fazem na perspectiva de que se isto se confirmar ninguém mais teria nenhuma razão para produzir e manipular embriões humanos. Com isto se evidencia que, assim como uma árvore sempre conserva algo vitalidade da sua semente, da mesma forma as células adultas carregariam consigo a carga genética inicial.
Célula adulta seria como uma pessoa adulta: evolui, transforma-se, mas não perde sua identidade mais profunda. Já outros passaram a sugerir que esta seria uma operação arriscada, podendo deslanchar um processo cancerígeno e que, de qualquer forma, as pesquisas com células embrionárias deveriam prosseguir para o avanço das ciências. Curiosa esta última posição, uma vez que o que se evidenciou até agora no campo científico foi justamente o contrário: perigosa mesmo seriam as experiências a partir das células embrionárias.
Agora, no dia 11 de janeiro de 2008, surge mais uma notícia apresentada de maneira sensacionalista, como costuma acontecer com tudo o que diz respeito à genética e à biotecnologia: agora já não seria mais necessário eliminar o embrião para aproveitar suas células: pode-se extrair uma entre as oito primeiras e o embrião continuaria disponível. Além disto a extração de uma das oito células não prejudicaria a vida do embrião….
Os comentários da mídia foram incisivos: agora já não haveria mais nenhuma objeção de cunho ético para o uso de células embrionárias para pesquisas e tentativas terapêuticas. Aparentemente isto é verdade, pois de fato, certos cientistas e até mesmo alguns setores ligados às igrejas afirmavam, de modo cabal, que fazer experiências com embriões significa eliminá-los, e portanto interromper um processo vital. Aqui estaria a questão central.
Entretanto, de um ponto de vista ético, além da razão acima aludida, há outras razões que se interpõem às experiências com células embrionárias humanas. Por exemplo, quem pode afirmar, com base científica que a extração de uma das oito células não prejudicaria em nada o embrião? Se a célula está lá ela deverá ser responsável por alguma função.
As razões que se interpõem às experiências com células embrionárias humanas aparecem mais claramente ainda quando se faz uma pergunta, poucas vezes levantada, mas de vital importância: como se conseguem os embriões? Ora, é nesta pergunta que se encontra a razão primeira para não se admitir pesquisas com embriões humanos. E a resposta é simples, mas carrega consigo muitas implicações: o verdadeiro batalhão de embriões congelados nos laboratórios do mundo inteiro foram obtidos através da fecundação artificial. E fecundação artificial significa mecanização da vida. Através destes procedimentos de reprodução assistida em laboratório, a transmissão da vida deixa de ser fruto de um gesto concreto de amor entre um homem e uma mulher, para se tornar num processo meramente técnico. E como dizia já há quase 20 anos o então Cardeal Ratzinger, nem tudo o que é tecnicamente possível é eticamente admissível.
Para se entender ainda melhor a pergunta que não é feita, mas que é de vital importância, “ como são obtidos os embriões”, convém acrescentar uns adendos. A reprodução assistida, em muitos casos, passou a ser um comércio, e muito lucrativo, na medida em que se procedem a todo tipo de transações, de espermatozóides, de óvulos, de embriões, com fecundação não só homóloga, mas também heteróloga e até independente. E mesmo que algum laboratório se restringisse à fecundação homóloga, ou seja, trabalhando com óvulos e espermatozóides do casal, haverá sempre um distanciamento entre o sentido da fecundidade humana e matrimônio, e a mera produção de uma ser humano. A produção em série é compreensível no reino animal, mas não em se tratando da vida humana. Cada ser humano é dom de Deus. Cada um é chamado pelo nome. Como diz o Evangelho de São Lucas sobre a consagração de Jesus: “ e deram-lhe o nome de Jesus, como o havia chamado o anjo, antes de ser concebido no seio materno” ( Lc 2,22).
Para concluir, percebe-se em certos ambientes ligados à reprodução humana em laboratório um certo nervosismo e até uma certa afobação, no sentido de justificar, a todo custo, tanto a denominada reprodução assistida, quanto todo tipo de experiências com células embrionárias. E maior ainda é o nervosismo com o qual estes ambientes aguardam o pronunciamento do Supremo Tribunal: se, como se espera, a sentença for de acordo com nossa Constituição que garante a proteção da vida humana desde seu início, portanto desde a fecundação, então muitos projetos bem lucrativos deixarão de existir. E com isto, quem sabe, muitas verbas encontrarão seu verdadeiro destino, que é o de subsidiar o tratamento de casais acometidos de infertilidade ou esterilidade, e não de substituí-los.