Grupos como o Estado Islâmico realizam perseguições e ações bárbaras em defesa de seus ideais; professor comenta as possíveis motivações, como a questão política
Alessandra Borges e Jéssica Marçal
Da Redação
Estado Islâmico, Boko Haram, Al Qaeda e Al Shabab são grupos radicais que se tornaram conhecidos em especial pelas barbaridades que cometem para defender, a todo custo, seus ideais. Em grande parte, os atos de violência são cometidos contra cristãos e minorias étnicas e religiosas no Oriente Médio. Mas qual é a motivação desses grupos? Eles agem por interesses religiosos, políticos, econômicos?
O doutor em Sociologia pela USP e professor de Política Internacional, Williams da Silva Gonçalves, acredita que as motivações são políticas. O professor, que chefia o Departamento de Relações Internacionais da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), explica que estes grupos surgem e atuam em áreas onde grupos étnicos e religiosos são forçados a conviver e onde os Estados não estão consolidados ou são vítimas da intervenção de grandes potências interessadas em explorar recursos naturais.
“No caso do Oriente Médio, o petróleo é o principal motivo. O caso do Iraque é exemplar. Numa ação juridicamente condenada pela ONU, uma vez que se revestia de argumentos evidentemente mentirosos, os Estados Unidos desmontaram o Iraque. (…) E é justamente lá e na vizinha Síria, onde os Estados Unidos igualmente estimularam a derrubada do governo, que vicejam esses grupos politicamente desorientados que dizem agir com inspiração religiosa”.
Na opinião do professor de Política Internacional, não é legítimo rotular as ações criminosas de grupos como Estado Islâmico, Boko Haram e outros mais de terrorismo religioso, já que, na visão dele, trata-se de ações político-militares. “Nenhum líder religioso dá seu apoio a esses grupos. Não há nenhum indício de que tenhamos voltado à Idade Média e estejamos em Cruzadas. Pelo contrário. O que temos assistido é justamente a um entendimento cada vez maior entre os líderes religiosos. A ação do Papa Francisco nesse sentido tem sido notável”.
A violência contra minorias
Notáveis também têm sido os casos de perseguição realizadas por esses grupos, com destaque para as ações do Estado Islâmico. E tais perseguições são realizadas, em grande parte, aos cristãos e demais minorias, tanto religiosas como étnicas. Em maio desse ano, por exemplo, o grupo destruiu a fachada de uma das mais antigas igrejas da cidade iraquiana de Mosul, adornada com uma grande cruz em relevo. Somam-se a isso diversos sequestros e decapitações de cristãos, todas essas ações assumidas pelo próprio Estado Islâmico.
“Esses grupos são formados por indivíduos desenraizados, que se formaram num ambiente violento de guerra, e que são treinados e armados por governos aos quais interessa promover a desestabilização política de determinados países (…) São grupos que não têm qualquer substância. Embora seus líderes tenham a inegável capacidade de seduzir jovens que se sentem marginalizados pela cor da pele ou pela religião de seus pais nos países ocidentais ou de jovens desesperançados pela triste realidade que os cerca no Oriente Médio, o fato é que esses grupos não dispõem de nenhum projeto político e social. São incapazes de criar e solidificar um Estado”
Terrorismo x extremismo
O terrorismo é antigo. Williams considera que, no mundo moderno, é uma prática que está associada à construção do Estado-Nacional e vem sendo exercida desde o início do século XIX, com aperfeiçoamentos técnicos e tecnológicos.
É muito difícil, porém, definir o terrorismo, afirma o professor. “Ninguém se apresenta como terrorista. Todos se apresentam como combatentes de uma causa, que apelam para atos de terror em virtude da desproporção que há entre suas forças e as forças opressoras”. Apesar da falta de uma definição clara, Williams ressalta que todos sabem o que é um ato de terror.
Entendido o que é terrorismo, o professor destaca a necessidade de diferenciá-lo do extremismo. “O extremismo é outra coisa. Extremismo é um rótulo político dado àqueles que não aceitam as regras do jogo político estabelecido e pretendem mudá-las. Evidentemente que os extremistas, por entenderem que a mudança radical não é viável, podem apelar para o terrorismo, assim como a reação daqueles que defendem o status quo pode levar à guerra civil. Isso depende, é claro, do contexto de cada um desses casos hipotéticos”.