"A radicalidade de nossas opções, vividas dia a dia no estilo de Jesus diante dos tantos desafios que o momento atual nos apresenta, é a medida de nosso amor para Ele", foi o que declarou em sua homilia o Monsenhor Álvaro Leonel Ramazzini Imeri, bispo de São Marcos, Guatemala.
A Santa Missa nessa manhã de sexta-feira, 25, na V Conferêcia do Episcopado Latino Americano e do Caribe que acontece em Aparecida (SP) desde o dia 13, foi presidida pelo bispo de Jalapa, Guatemala, Monsenhor Julio Cabrera Hoyos, pois por motivo de doença Dom Álvaro não pode estar presente, mas enviou sua profunda reflexão, que foi lida pelo presidente da celebração.
Confira na íntegra a homilia
Irmãos e irmãs: Através de mim o Monsenhor Álvaro Ramazini vos saúda e pede desculpa por não poder presidir esta Eucaristia, por razões de saúde. Ele escreveu esta homilia que eu compartilho hoje com vocês.
Três vezes pergunta Jesus a Pedro se o ama. Três vezes Pedro responde que sim, consertando assim sua tríplice negação durante a Paixão do Senhor. As perguntas vêm depois que o Senhor lhes preparou sobre brasas, peixe e pão. É Pedro mesmo quem retirou a rede do mar cheia de 153 peixes grandes, símbolo dos futuros discípulos de Jesus. Esta passagem se interpretou normalmente em referência pessoal a Pedro, e se singularizou sua aplicação a seu sucessor, o Papa. No entanto, nada impede ver nestas declarações de amor, às que segue a encomenda de Jesus a Pedro de cuidar e apascentar suas ovelhas, o fundamento do ministério pastoral na Igreja, começando pelo ministério episcopal.
Nosso ministério se fundamenta num discipulado de amor. A história de nossas vidas como pastores é uma história de amor entre cada um de nós e Aquele que nos conhecia antes de termos sido formados no seio de nossas mães. Esta é também a história da vocação à vida consagrada. Nossas vidas encontram seu sentido mais profundo no amor total, incondicional, Àquele que nos amou primeiro dando sua vida na cruz. Nós O amamos porque Ele nos ama, e a medida de seu amor é amar-nos sem medida. Este é o fundamento da vida cristã.
Viemos a Aparecida porque queremos dizer ao mundo inteiro que estamos convictos que somente a sabedoria e a força do amor, que é Deus, reorientará o rumo da história, e vencerá o ódio, a violência, a injustiça e a mentira. Mas o mundo de hoje, mais do que palavras, precisa de fatos. Já o diz o provérbio: “obras são amores e não boas razões”. E aí entramos nós.
Como cristãos, e como bispos, ou presbíteros, ou pessoas da vida consagrada, nossa condição de discípulos nos exige ser testemunhas do amor de Deus prolongando seu amor na história, especialmente para os mais pobres e marginalizados. Ou, como escutávamos numa das intervenções, nosso amor àqueles que já não somente são excluídos, senão totalmente considerados como excedentes, já que não contam para nada.
Hoje, como a Pedro, o Senhor nos pergunta: “me amas?”. Com toda modéstia, sabendo o mais indigno de todos, permitam-me que compartilhe com vocês alguns pontos de referência para dar uma resposta honesta ao Senhor.
Se seguimos mantendo em nossas relações interpessoais o formalismo e o protocolo dos títulos em lugar do protocolo da irmandade verdadeira, chamando-nos de coração “irmãos”, “amigos”, podemos dizer-lhe ao Senhor que o amamos?
Se não ajudamos a resolver o problema da grave e injusta distribuição do clero em nossas igrejas particulares, podemos dizer a Jesus que o amamos porque cremos que na Eucaristia Ele atualiza o mistério de sua paixão, morte e ressurreição, e queremos que a ninguém falte a possibilidade de participar dela?
Se não nos comprometemos ativamente em ajudar a eliminar as causas pelas quais milhões de pessoas morrem de fome ou de frio, ou vivem em condições desumanas, ou têm que emigrar a outros países porque no próprio, não encontram o que precisam para viver dignamente, podemos dizer-lhe a Jesus que o amamos?
Se somos rígidos e duros em nossos juízos contra aqueles que consideramos pecadores, heterodoxos, e os condenamos e discriminamos; se fazemos do monólogo nossa ferramenta preferida; se vemos a realidade do mundo desde o castelo de nossa verdade sem animar-nos a baixar à planície do sofrimento e a desesperança de conhecidos e estranhos, podemos dizer-lhe a Jesus que o amamos?
A radicalidade de nossas opções, vividas dia a dia no estilo de Jesus diante dos tantos desafios que o momento atual nos apresenta, é a medida de nosso amor para Ele.
Jesus termina anunciando a Pedro que quando ele for velho o atarão e o levarão onde ele não quer. Deixa-lhe o lema de “Segue-me”. O pastor segue a Jesus porque o ama, e o segue também como discípulo para aprender a ser pastor como Ele. Como fez Paulo, prisioneiro por Cristo diante de Festo, de Agripa e Berenice.
Para Paulo, como para outras muitas testemunhas da fé em nosso querido continente, incluídos aqueles bispos que deram sua vida por Ele – e quero recordar hoje de maneira especial a dois bispos da América Central, Monsenhor Óscar Arnulfo Romero e Monsenhor Juan Gerardi Conedera -, sua vida foi Cristo, e por Ele deram sua vida. Jesus, nos dê a força para fazer o mesmo.