O Santo Padre convidou representantes das três congregações mais antigas na América Latina para participarem da V Conferência, dentre eles, está presente aqui em Aparecida o Padre José Rodriguez Carballo, Ministro Geral dos Franciscanos, que concedeu uma riquíssima entrevista à TV Canção Nova.
A visita do Papa Bento XVI ao Brasil proporcionou aos franciscanos um momento especial de graça. O primeiro santo brasileiro ser um frade menor e a visita do Santo Padre à Fazenda da Esperança, dirigida também por um franciscano. Padre José partilha a experiência vivida nestes dias, e fala sobre os preparativos para as comemorações do 8º centenário da congregação franciscana.
Canonização de Frei Galvão – um franciscano
Tenho que dizer que foi uma experiência maravilhosa, única, eu penso que um momento de graça que vai dar frutos no futuro,mas que já no presente se estão sentindo. Um momento de graça porque a Igreja canonizou a um frade menor, um franciscano. Um frade que professou a mesma regra que professamos hoje, que viveu a mesma forma de vida deixada por são Francisco.
Tudo isso é para nós momento de emoção, mas também de renovação profunda, para seguir as pegadas de São Francisco e de tantos irmãos e irmãs, que ao longo destes oito séculos professaram esta forma de vida.
Frei Galvão é também o primeiro santo brasileiro, isto é importante para nós que tivemos a graça de celebrar a Primeira Missa no Brasil. A primeira Eucaristia no Brasil foi celebrada por um franciscano e, agora, o primeiro santo do Brasil é um franciscano, isso é para nós duplamente significativo.
Bento XVI na Fazenda da Esperança
Depois também foi significativa a visita do Santo Padre à Fazenda da Esperança que, como sabemos, é conduzida por um franciscano, melhor, por vários franciscanos, entre outros.
E isto também é importante, porque é uma obra que tenta dar uma resposta a umas das maiores necessidades do nosso tempo, uma resposta da espiritualidade franciscana e de um carisma que coloca ao centro a Palavra de Deus, a pessoa, a relação com Deus.
Vemos que o problema da droga, como o Santo Padre recordou na Audiência Geral que fez na Praça São Pedro não é só um problema físico ou psicológico, mas é, também, um problema de valores. Muitas vezes se vê a droga como uma enfermidade mas não a vêem como uma falta de valores. Penso que a pedagogia que se utiliza na Fazenda Esperança é colocar os valores no centro da pessoa e deste jeito a pessoa recupera a sua dignidade e, certamente, pode sair do abismo que é a droga.
Amplitude da missão franciscana
É seguir o caminho que nos ensinou Jesus primeiro, mas também que viveu Francisco.
Francisco foi um homem profundamente apaixonado por Jesus Cristo. Ele era todo aberto a Deus, e ao mesmo tempo, como conseqüência, era todo aberto ao homem, aos excluídos daquele tempo, aos últimos que eram os leprosos.
Nós franciscanos, hoje sobretudo, quando estamos celebrando os 800 anos da fundação, queremos afirmar essa paixão por Deus, por Cristo, e a paixão pelo homem. Porque, desde que a Palavra se fez carne, não se pode chegar a Deus senão através do homem.
Sobretudo daqueles que são os privilegiados de Deus, que são os pobres, que são os excluídos, e cada tempo tem os seus excluídos e, neste tempo, que tantos jovens são vítimas da violência, das drogas e de outras dependências penso, que neste momento, nós franciscanos estamos sendo chamados a ajudar. Que as nossas palavras façam-os chegar a Jesus. O importante é que o jovem chegue a Jesus, depois Jesus será para ele o Caminho, a Verdade e a Vida.
Preparação 8º centenário franciscano
Desde o ano de 2006, nós já fizemos muitas atividades.Quero recordar que a principal foi um Capítulo Geral Extraordinário, pois o último que se havia feito na nossa ordem fora a 30 anos atrás, e nós fizemos este novo Capítulo Geral Extraordinário em Assis, o altar da memória franciscana por excelência.
Foi um momento muito forte para renovação espiritual profunda da ordem, mas tivemos muitas outras atividades. Aqui mesmo no Brasil celebramos no ano de 2006 um Congresso Internacional de Justiça e Paz. Depois, neste mesmo ano, celebramos um Congresso Internacional para os Mestres de Noviços, agora em 2007 vamos ter um Congresso Internacional para os Moderadores de Formação Permanente, também em Assis.
Nesse oitavo centenário, queremos escutar a voz dos mais jovens, por isso, nos primeiros quinze dias do mês de julho, vamos celebrar em Nazaré, um ponto itinerante nos lugares bíblicos, mas, sobretudo Nazaré, Jerusalém e Belém, o Terceiro Capítulo Geral dos Jovens Franciscanos. Pedimos a cada província que mande representantes e ali vamos refletir sobre as necessidades dos jovens frades de hoje, as respostas que a Igreja e a ordem espera deles e sobretudo vamos centrar-nos na espiritualidade da Palavra, do Evangelho. Queremos que os jovens franciscanos voltem realmente a assumir o Evangelho como regra e vida, como quis São Francisco. Eu penso que vai ser uma graça extraordinária.
Outra iniciativa vai acontecer agora já no mês de junho em Assis, pela primeira vez na história da nossa ordem, convidamos todos os bispos franciscanos do mundo inteiro, são mais de 100, a participarem deste encontro. Vamos refletir sobre a eclesialidade da ordem, da vocação franciscana, e ao mesmo tempo, como um bispo pode ser bispo sem deixar de ser franciscano. Penso que vai ser um encontro importante, esperamos que o Santo Padre Bento XVI nos receba também em audiência e, vão ser momentos significativos em toda essa preparação espiritual para 2009.
Mudança de época
Sinto que não só estamos vivendo um tempo de mudanças, mas estamos num momento de transição e, neste sentido, eu utilizo também a palavra crise. Nós estamos num momento de crise, não no sentido negativo que tem esta palavra, mas a crise, no sentido etimológico da palavra grega, que é um momento em que se exige tomar uma decisão.
Nós temos neste momento, como Igreja, e também como ordem franciscana uma grande responsabilidade, porque das decisões que tomamos hoje dependem o nosso futuro, depende o futuro da Igreja e o futuro da ordem. Certamente o nosso futuro está nas mãos de Deus, mas nós também temos que preparar esse futuro, por isso eu creio que a Igreja neste momento e a ordem, têm que viver uma atitude de discernimento.
São Francisco expressava aquela pergunta diante do crucifixo de São Damião: "Senhor que queres que eu faça?", mas seus apóstolos tem uma outra pergunta, que a comunidade cristã também fazia: "Irmãos que temos que fazer?". Pois é um momento de graça, porque algo novo está germinando.
Pentecostes na Igreja
É um momento de um grande compromisso porque, como já disse, muito do nosso futuro depende do presente, depende de nós e é um momento maravilhoso, porque nos pede dinamismo, nos pede muita audácia, a parresia, estamos esperando o Espírito Santo, Pentecostes.
A parresia é um dos dons do Espírito Santo. Eu creio que a Igreja, a ordem franciscana, neste momento, tem que ter a parresia que nos vem do Espírito Santo, do Senhor, para não ter medo de encarar o futuro, porque o Senhor está conosco. E o Senhor continua a escrever conosco uma grande história. Não só Igreja, não só a ordem, temos uma grande história que transmitir, mas temos sobretudo uma grande história que construir. Isso que queremos fazer neste momento, e eu estou convencido que é isso que quer fazer a Igreja na América Latina com esta V Conferência.
Presença na V Conferência
Certamente. Nós somos Igreja, estamos na Igreja e, em profunda comunhão com a Igreja, queremos viver o Evangelho, como viveu são Francisco, tal como movimento eclesial tem que ser acolhido pela ordem como um momento de graça pela mesma ordem. Então a V conferencia é um momento de graça para a ordem, sobretudo diria, com um espírito de comunhão que está existindo na Conferência.
Realmente estou muito contente, todos podem participar com muita liberdade, com muita espontaneidade, simplicidade. Até mesmo como o tema fala de discípulos e missionários, a nossa ordem tem precisamente essas duas características marcadas, nós que seguimos o Evangelho como regra e vida queremos ser discípulos, mas o discípulo tem que ser missionário.
Para nós este tema é muito familiar e propício, neste momento que queremos renovar-nos no ser discípulo, na comunhão com Jesus e de levar o Evangelho a todos para proclamar como diz São Francisco, na carta a toda ordem: "não há outro como nosso Deus, senão nosso Senhor Jesus Cristo".
Três congregações representadas na V Conferência
Certamente temos que dizer que os protagonistas naturais desta Conferência são os Bispos da Conferência Geral do Episcopado, mas a Igreja quis abrir essa participação a todos os setores da Igreja, então há muitos leigos e leigas, religiosos que representam os religiosos da América Latina.
O Santo Padre convidou a três representantes dos religiosos a nível de Igreja a nível geral pois estão presentes o Reitor-Mor dos Salesianos, 9 Sucessor de Dom Bosco, Padre Pascual Chaves Villanueva; o Coordenador Geral dos Jesuítas na América Latina, que vem representando o Superior Geral dos Jesuítas, Padre Ernesto Cavassa, e estou eu representando também a todos os franciscanos do mundo.
Eu penso que deste jeito o Santo Padre quis fazer presente o apreço que a Igreja tem a todos os religiosos, particularmente a estas três ordens, que estão presentes aqui na América Latina desde o princípio. Nós, desde o princípio da evangelização, mas também os jesuítas e certamente a presença muito significativa dos salesianos. Então a nossa participação, digamos, tem uma dupla vertente histórica. Se reconhece o que se fez no passado, mas também no presente se está reconhecendo e, disto sou muito grato ao Santo Padre e aos Bispos da América Latina, o papel que os religiosos e religiosas tem na evangelização no momento presente e seguramente no futuro.
150 mil religiosos e religiosas na América Latina
Temos que recordar que na América Latina temos 150 mil religiosos e religiosas neste momento. É uma grande presença e muitos deles em regiões muito pobres, em regiões onde a violência é muito forte. Mas eu penso que é o lugar próprio dos religiosos e religiosas, por isso nós estamos muito contentes de estar aqui, e sentir-nos em casa na América Latina, ainda que venhamos de longe. E, ao mesmo tempo, estamos muito contentes de que estes irmãos e irmãs nossos sigam sendo testemunhas do Evangelho de Jesus Cristo neste momento decisivo para a América Latina.
Digo aos meus irmãos e irmãs, que nós precisamos seguir colaborando ativamente na evangelização. Esta conferência decide uma missão continental, eu penso que a família franciscana deva colaborar ativamente nessa missão. Não podemos estar ausentes desse compromisso que nos chama o Papa Bento XVI, em favor deste nosso continente tão querido e amado e ao mesmo tempo eu diria a todos: "Não tenhamos medo".
Incentivo aos Missionários
Os momentos presentes não são fáceis, como dissemos, há muitas mudanças e isto leva, muitas vezes, há insegurança. Se nós temos fé nós sabemos que a promessa de Jesus se faz realidade: "Não tenhais medo", repitiu constantemente o Ressuscitado, "eu estou convosco".
Os tempos não são mais propícios para o otimismo, porque o otimismo nasce das nossas forças, mas são momentos para a Esperança, porque a Esperança nasce de Deus, nasce dessa confiança absoluta de que Deus é nossa força, de que Ele é a nossa rocha, de que Deus está conosco. Por isso eu diria a todos: Se somos convocados a essa missão continental, de aportar o que cada um de nós pode aportar. Um pode aportar um, outro 10, outro 30, isso não é importante. O que importa é que a Igreja conta com cada um de nós. A todos Paz e Bem.