A Igreja Católica presta tributo, num livro, a oito religiosos e leigos considerados “mártires”, entre os quais dois belgas, que derramaram o próprio sangue, em sua luta pela paz, pela justiça e pela verdade na Guatemala. A obra, que foi apresentada ontem à noite, na presença de familiares desses mártires e de representantes da sociedade civil, faz parte das iniciativas para recordar o 5º aniversário do assassinato do então Bispo Auxiliar de Cidade da Guatemala, Dom Juan Gerardi Conedera.
A obra foi elaborada por Ir. Teresa Martínez, do Departamento de Direitos Humanos, do Arcebispado de Cidade da Guatemala. Seu título é “Testemunhas da fé pela paz” e contém relatos assustadores sobre a maneira como foram vilmente assassinados esses religiosos.
O menino catequista, Juan Barrera, de apenas 12 anos de idade, foi seqüestrado pelo exército, nos anos 80, num vilarejo do departamento ocidental de Quiché, depois que seus três irmãos (que haviam sido presos pelos militares) conseguiram escapar. Juan Barrera “foi torturado sem piedade: seus pés sofreram uma série de cortes com uma faca, fizeram-no caminhar sobre pedras, amputaram suas orelhas, quebraram suas pernas e, finalmente, dispararam nele, matando-o” _ narra Ir. Martinez, no livro.
Sobre o sacerdote belga Pe. Walter Voordeckers, a obra recorda que ele foi assassinado em 12 de maio de 1980, na costa sul guatemalteca, por ter apoiado as mobilizações do, então recém-nascido, Comitê de Unidade Camponesa (CUC), que teve como um de seus líderes, Rigoberta Menchú, Prêmio Nobel da Paz-1992. Esse sacerdote belga foi assassinado com sete tiros _ cinco dos quais, no tórax _ diante da Igreja de Santa Lucía Cotzumalguapa. Outros “mártires” são o catequista guatemalteco Rosalío Benito, assassinado no dia 22 de julho de 1982 em Quiché, e o sacerdote belga, Pe. Alfonso Stessel, “executado” no dia 19 de dezembro de 1994, na colônia “Tierra Nueva”, na capital guatemalteca.
Além disso, na obra são narradas as vicissitudes de Madre Victoria de la Roca, seqüestrada e desaparecida desde o dia 6 de janeiro de 1982, na localidade oriental de Esquipulas, e do catequista Manuel Tzalam, assassinado no dia 20 de setembro de 1986, numa aldeia de Petén. “As testemunhas da fé pela paz” foram capazes de restaurar a dignidade das pessoas que, submersas na pobreza e na violência, tiveram que romper o silêncio, para restabelecer um sinal de esperança, de liberdade, de verdade e de paz” _ disse a autora do livro, Ir. Teresa Martinez.
O sacerdote de origem espanhola, Pe. Cirilo Santamaría, disse, por sua vez, que “este livro nos conduz aos anos negros da história da Guatemala”, aludindo especialmente aos casos do menino catequista, Juan Barrera, e do Pe. Hermógenes López, assassinado no dia 30 de junho de 1978, por ter desafiado o exército. “A Guatemala é uma terra abençoada _ acrescentou Pe. Santamaría _ mas não por água benta e sim pelo sangue que recebeu de seus mártires.”
O livro inicia-se com a apresentação da vida e da obra de Dom Juan Gerardi Conedera, assassinado em 26 de abril de 1998, depois de ter acusado o exército da maioria das violações dos direitos humanos perpetradas nos anos de guerra civil na Guatemala.