Entre as medidas de prevenção da Covid-19 está o isolamento social, que pode gerar solidão, insegurança e para alguns também medo
Da redação, com VaticanNews
O medo de contrair a Covid-19 e as medidas de prevenção obrigaram a uma mudança radical dos comportamentos e hábitos pessoais. Já estamos nos acostumando a tomar todas as medidas de proteção toda a vez que saímos de casa. Mantemos a distância de segurança, não apertamos a mão, nada de abraços, apenas pressa de nos afastarmos para evitar o contágio do coronavírus.
Perguntamo-nos: com o tempo, esses comportamentos provocarão o aparecimento de problemas psicológicos? Os especialistas preveem um aumento de pedidos de ajuda, como conta o psiquiatra Dr. Luigi Janiri, responsável da Unidade de Psiquiatria da Fundação do Hospital Universitário Agostino Gemelli de Roma.
Leia, abaixo, a entrevista na íntegra:
Máscaras e isolamento social se tornaram a normalidade. A máscara pode nos tornar anônimos e a distância de segurança impede de nos aproximarmos, de dar a mão, de abraçar. Que consequências psicológicas poderão ocorrer a longo prazo?
Dr. Janiri: O que podemos imaginar é que essa imposição, certamente, modificará as relações sociais e interpessoais, no sentido que as manifestações de afeto e as emoções compartilhadas serão absolutamente menos expressas onde há maior intensidade de emoções que não poderão ser manifestadas. Isso não levará a uma maior frieza, mas a uma maior reserva, uma maior inibição das relações sociais, porque irá favorecer determinados comportamentos que evitam pessoas com problemas, de algum modo, de socialidade. Já podemos perceber isso com os nossos pacientes internados, não podemos estar ao seu lado, dar-lhes a mão, nos perguntamos se podemos vê-los nas suas camas, provavelmente não.
Creio que voltaremos a vê-los no consultório, por enquanto só pelo Skype, mas é uma modalidade absolutamente distanciadora. Publicamos, há pouco tempo, um trabalho sobre as possíveis modificações a serem introduzidas na psicoterapia com a modalidade Skype, portanto, é um mundo que está mudando, não sabemos se é uma mudança temporária, porque poderia ser temporária, mas, certamente, é a mudança dos costumes, dos hábitos sociais, da manifestação de afeto, e será muito consistente.
Vemos, na televisão, a dor das pessoas pela morte de parentes, amigos, por causa do coronavírus. Além do sofrimento em si, profundamente doloroso, há a dor de não acompanhar para o último adeus. Pessoas que deixaram parentes vivos no hospital e depois não os viram mais. Como é possível preencher esse vazio?
Dr. Janiri: Certamente, isso representa um trauma, trauma coletivo, que é encoberto apagando-o da memória como todos os traumas. As pessoas tentam, obviamente, esquecer ou de não aprofundar esses aspectos buscando, por exemplo, não ouvir os telejornais, o que de algum modo, dentro de certos limites, é certamente um dado positivo. As pessoas não devem estar continuamente ouvindo notícias – isso faz parte das regras e dos deveres da mídia –, porque são notícias muito perturbadoras.
Com efeito, esse trauma, que pode ser confrontado apenas com os traumas bélicos, ou seja, os traumas de guerra, o fato de ter pessoas que morrem, desaparecem, não saber onde vão essas pessoas, ou melhor, saber sim, mas não poder as acompanhar na última parte de suas vidas, são grandes traumas que, certamente, ficarão sedimentados na psique das pessoas.
Nós psiquiatras, psicoterapeutas, prevemos um grande aumento das síndromes pós-traumáticas de estresse, justamente porque, de modo geral, o clima que esse vírus gera é um clima de tipo persecutório. As pessoas se sentem perseguidas não apenas porque sabem que estão arriscando a vida, mas pelo fato que se sentem reclusas dentro de casa com um tipo de prisão domiciliar. A isso deve-se acrescentar o que seria o aspecto mais vulnerável da psique humana, o fato de serem atingidas pela morte das pessoas que mais amam e de modo tão traumático. Por isso, esperamos um aumento desse tipo de problema.