Leia a íntegra do segredo de Fátima e saiba como a Igreja interpreta as visões dos pastorinhos na Cova da Iria
André Cunha
Da redação, com produção de Kelen Galvan
A visão que os pastorinhos, Lúcia, Francisco e Jacinta, tiveram durante a aparição de Nossa Senhora de Fátima, ficou conhecido como “O Segredo de Fátima”.
De acordo com os relatos de Irmã Lúcia, Nossa Senhora concedeu-lhes a visão em 13 de julho de 1917. Um segredo revelado em três partes pela Irmã Lúcia, guardado até 1941, quando foi feito a primeira divulgação. Neste ano, segundo conta o padre dehoniano, João Carlos de Almeida, a religiosa escreveu o segredo em uma carta, mas sem a terceira parte.
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Em 1944, o bispo de Leiria, hoje Fátima, pediu que escrevesse a terceira parte. Ela escreveu, fechou em um envelope e pediu que fosse aberto somente depois de 1960. O bispo acatou o pedido e entregou o envelope à Congregação para a Doutrina da Fé.
Em 1960, o Papa João XXIII pediu para abrir o envelope. Após ler, mandou de volta à Congregação e disse que não interessaria a ninguém, e pediu que mantivesse fechado, conforme conta padre Joãozinho.
Paulo VI leu o segredo durante seu pontificado e devolveu a carta à Congregação.
Por fim, João Paulo II também quis ler, após ter sofrido um atentado, na Praça São Pedro, em 1981. Após ler, ele mandou fechar o envelope novamente.
Somente no ano 2000, o Santo Padre pediu que o segredo de Fátima fosse revelado ao mundo.
O que diz o segredo?
A pedido do Papa João Paulo II, o Vaticano divulgou a íntegra das narrativas da Irmã Lúcia relativas às três partes. Uma exposição em Portugal tornou acessível os manuscritos originais da religiosa.
Veja a seguir o relato da duas primeiras partes divulgadas inicialmente, como consta no site oficial do Vaticano:
“A primeira foi pois a vista do inferno!
Nossa Senhora mostrou-nos um grande mar de fogo que parecia estar debaixo da terra. Mergulhados nesse fogo, os demônios e as almas, como se fossem brasas transparentes e negras, ou bronzeadas com forma humana, que flutuavam no incêndio levadas pelas chamas que delas mesmas saiam, juntamente com nuvens de fumo, caindo para todos os lados, semelhante ao cair das folhas em os grandes incêndios sem peso nem equilíbrio, entre gritos e gemidos de dor e desespero que horrorizava e fazia estremecer de pavor. Os demônios distinguiam-se por formas horríveis e ascorosas de animais espantosos e desconhecidos, mas transparentes e negros. Esta vista foi um momento, e graças à nossa boa Mãe do Céu; que antes nos tinha prevenido com a promessa de nos levar para o Céu (na primeira aparição) se assim não fosse, creio que teríamos morrido de susto e pavor.
Em seguida, levantámos os olhos para Nossa Senhora que nos disse com bondade e tristeza:
— Vistes o inferno, para onde vão as almas dos pobres pecadores. Para salvá-las, Deus quer estabelecer no mundo a devoção a meu Imaculado Coração. Se fizerem o que eu disser salvar-se-ão muitas almas e terão paz. A guerra vai acabar, mas se não deixarem de ofender a Deus, no reinado de Pio XI, começará outra pior. Quando virdes uma noite, iluminada por uma luz desconhecida, sabei que é o grande sinal que Deus vos dá de que vai punir o mundo de seus crimes, por meio da guerra, da fome e de perseguições à Igreja e ao Santo Padre. Para a impedir, virei pedir a consagração da Rússia a meu Imaculado Coração e a comunhão reparadora nos primeiros sábados. Se atenderem a meus pedidos, a Rússia se converterá e terão paz, se não, espalhará seus erros pelo mundo, promovendo guerras e perseguições à Igreja; os bons serão martirizados, o Santo Padre terá muito que sofrer, várias nações serão aniquiladas, por fim o meu Imaculado Coração triunfará. O Santo Padre consagrar-me-á a Rússia, que se converterá, e será concedido ao mundo algum tempo de paz.(7)”
A Irmã Lúcia, a pedido do bispo de Leiria, escreveu então a terceira parte. O relato é exatamente como consta no site oficial do Vaticano:
“Depois das duas partes que já expus, vimos ao lado esquerdo de Nossa Senhora um pouco mais alto um Anjo com uma espada de fogo em sua mão esquerda; ao centilar, despedia chamas que pareciam incendiar o mundo; mas apagavam-se com o contato do brilho que da mão direita expedia Nossa Senhora ao seu encontro. O Anjo apontando com a mão direita para a terra, com voz forte disse: Penitência, Penitência, Penitência! E vimos numa luz imensa, que é Deus: (algo semelhante a como se veem as pessoas num espelho quando lhe passam por diante), um Bispo vestido de Branco (tivemos o pressentimento de que era o Santo Padre). Vários outros Bispos, Sacerdotes, religiosos e religiosas subir uma escabrosa montanha, no cimo da qual estava uma grande Cruz de troncos toscos como se fora de sobreiro com a casca; o Santo Padre, antes de chegar aí, atravessou uma grande cidade meia em ruínas, e meio trêmulo com andar vacilante, acabrunhado de dor e pena, ia orando pelas almas dos cadáveres que encontrava pelo caminho; chegado ao cimo do monte, prostrado de joelhos aos pés da grande Cruz foi morto por um grupo de soldados que lhe dispararam vários tiros e setas, e assim mesmo foram morrendo uns trás outros os Bispos, Sacerdotes, religiosos e religiosas e várias pessoas seculares, cavalheiros e senhoras de várias classes e posições. Sob os dois braços da Cruz estavam dois Anjos, cada um com um regador de cristal em sua mão, neles recolhiam o sangue dos Mártires e com ele regavam as almas que se aproximavam de Deus”.
A interpretação do segredo
Em 27 de abril de 2000, o Papa João Paulo II enviou a Portugal, o Secretário da Congregação para a Doutrina da Fé, Dom Tarcisio Bertone, com o encargo de ouvir de Irmã Lúcia a interpretação do segredo. O encontro aconteceu, numa quinta-feira, no Carmelo de Santa Teresa em Coimbra.
Dentre outras questões, Dom Bertone perguntou à irmã por que 1960 foi o ano escolhido para abrir o envelope. “Por que o limite de 1960? Foi Nossa Senhora que indicou aquela data?”, perguntou o monsenhor. Irmã Lúcia respondeu: “Não foi Nossa Senhora; fui eu que coloquei a data de 1960, porque, segundo intuição minha, antes de 1960 não se perceberia, compreender-se-ia somente depois. Agora, pode-se compreender melhor. Eu escrevi o que vi; não compete a mim a interpretação, mas ao Papa”, disse.
O relato da conversa de Dom Tarcisio Bertone com Irmã Lúcia pode ser lido no site do Vaticano.
O Papa João Paulo II pediu à Congregação para a Doutrina da Fé que elaborasse então um documento com uma interpretação teológica do segredo. Na ocasião, o cardeal Joseph Ratzinger, hoje Papa emérito Bento XVI, era o Prefeito da Congregação.
Ratzinger diz no documento que quem lê com atenção o texto do chamado terceiro “segredo” de Fátima, ficará “presumivelmente desiludido ou maravilhado depois de todas as especulações que foram feitas”. Ele afirma que não há nenhum grande mistério no segredo e que o “véu do futuro não é rasgado”. “Vemos a Igreja dos mártires deste século, que está para findar, representada através duma cena descrita numa linguagem simbólica de difícil decifração”, escreveu o cardeal em 2000.
Leia a íntegra da interpretação teológica escrita pelo Cardeal Joseph Ratzinger, ao final da página