Santa Sé destaca que armas automáticas permanecem proibidas pelos ditames da moral, dos valores espirituais, da experiência e das virtudes militares
Vatican News
“Desde o início dos debates na ONU, sobre os sistemas de armas letais automáticas, a Santa Sé sempre afirmou: Os desafios apresentados pelas tecnologias emergentes, neste âmbito, não se limitam às normas do Direito Internacional Humanitário, mas representam também graves implicações potenciais para a paz e a estabilidade”.
Assim, a Missão Permanente da Santa Sé, junto às Nações Unidas e outras Organizações internacionais, em Genebra, se expressou, este ano, durante a reunião do Grupo de Peritos Governamentais sobre os Sistemas Automáticos de Armas Letais da Convenção em relação a algumas Armas Convencionais.
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Na ordem do dia da reunião, estava previsto, precisamente, um debate sobre o aspecto do direito internacional humanitário. O tema foi abordado pela Santa Sé em três pontos principais.
Respeitar o direito humanitário internacional
“As Convenções e Tratados do Direito Internacional Humanitário estão repletos de frases formuladas, cuidadosamente, como ‘previsto’, ‘pode-se esperar’, ‘prejuízo supérfluo’, ‘sofrimento inútil’, que denotam uma referência fundamental à interpretação, boa fé e julgamento prudente. Esses aspectos estão, em parte, informados e baseados no contexto evolutivo das operações, para as quais a pessoa humana é insubstituível. Por isso, é preciso levar em consideração as ações, que requerem a intervenção da razão humana, por exemplo: distinção, proporcionalidade, precaução, necessidade e vantagem militar. O respeito e a aplicação de tais princípios requerem a interpretação e compreensão pontuais, em contextos e situações particulares, que não são fáceis de programar”.
“Sabe-se que as decisões legais e éticas requerem, muitas vezes, uma interpretação das regras para salvar o espírito das próprias regras. A este respeito, sistemas de armas autônomos, dotados de capacidades de autoaprendizagem ou autoprogramação, deixam, necessariamente, espaço a um nível de imprevisibilidade, que poderia, por exemplo, ser ‘desviado’ para ações destinadas a não combatentes, a fim de aumentar a sua eficiência, violando assim o princípio da distinção”.
Drones como armas
A Missão Permanente da Santa Sé faz uma referência à possibilidade de se usar enxames de mini “drones kamikazes”, ou seja, numerosos sistemas de armas com capacidades autônomas:
“O seu uso, em áreas urbanas, poderia causar altos riscos para a população civil. Se forem utilizados, sem nenhuma supervisão humana, tais sistemas poderiam cometer erros na identificação dos alvos previstos. O conceito de um enxame de armas autônomas agrava ainda mais este risco, pois a natureza aleatória do enxame poderia levar a lesões excessivas e a efeitos indiscriminados, em clara contradição com o direito internacional humanitário”.
Neste sentido, observa a Santa Sé, surge uma consciência emergente também entre eminentes cientistas, engenheiros, pesquisadores, militares, eruditos e uma comunidade mais ampla da sociedade civil: “Há, cada vez mais, casos de empregados e empresários, que se opõem, por motivos éticos, a certos projetos concernentes ao armamento de inteligência artificial”.
Esta forma de consciência crescente representa, naturalmente, certa mudança na percepção do público, que também é uma força motriz para a implementação e o desenvolvimento do direito internacional humanitário.
Por isso, a Santa Sé conclui, dizendo: “Embora os sistemas de armas autônomos possam ser considerados ‘normais’, no sentido estatístico do termo e, portanto, aceitáveis, mesmo que não explicitamente proibidos, eles permanecem proibidos pelos ditames da moral, dos valores espirituais, da experiência e das virtudes militares”. Daí, a cláusula Martens, que se situa entre o direito internacional humanitário e a ética, mas, além do mais, representa uma obrigação jurídica, sancionada em vários tratados de direito internacional humanitário, oferece, a priori, uma bússola normativa crucial para o nosso trabalho”.