Prática penitencial marca a Quaresma que entra em sua reta final, rumo à proposta de conversão e vida nova na Páscoa de Cristo
Mauriceia Silva
Da Redação
A Quaresma está quase terminando, mas nessa reta final em preparação à Páscoa ainda é tempo de recolhimento, silêncio e das penitencias próprias desse período. Antiga prática da vida espiritual cristã, em tempos recentes a mortificação pode perder espaço na vida de alguns católicos, na de outros, tem passado por adaptações.
Segundo o professor de História da Igreja, Felipe Aquino, os santos venceram porque eles dominaram a carne e viveram pela Cruz. “Todos os santos fizeram muitas penitências porque eles entendiam que a penitência não era só para dominar a carne, subjugar a carne ao espírito, mas também para unir à paixão de Cristo. Dentro daquilo que São Paulo dizia: ‘completo na minha carne o que falta à paixão de Cristo no seu corpo que é a Igreja’.”
O padre Alex de Lima Freitas, da Comunidade Canção Nova, afirma que podemos fundamentar a penitência em Jesus Cristo, pois Ele também fez penitência. Além disso, também é possível ver isso no Antigo Testamento, nos momentos de conversão do povo de Deus quando eles se arrependiam. “Como não lembrar de Jonas que vai pregar em Nínive, e o povo todo se converte, se veste de sacos, põe cinzas na cabeça e reza com força, para quem sabe Deus tenha piedade. É um sinal de humildade e de pedido de perdão. O próprio verbo encarnado fez penitência, não por Ele, era santo e imaculado, mas fez por nós”.
Vale lembrar que muitos santos na idade média usaram o cilício, e ainda hoje há quem faça uso do cilício como penitência. Segundo o Professor Felipe, muitas pessoas ficaram desconcertadas ao saberem que o Papa João Paulo II, mesmo depois de Papa, continuava usando o cilício. O cilício é uma espécie de corrente com pontos que é colocada em torno da cintura como forma de penitência.
Para o professor, uma propaganda anticristã tem tentado, até com pouco sucesso, transformar esse tradicional método de penitência em uma prática de aparência masoquista, embora não seja. “Evidentemente não é uma prática masoquista pra fazer a pessoa sofrer e também não é desordenada, desde que seja usada dentro de um critério. Para viver essa penitência, a pessoa tem que estar preparada para isso, e também precisa querer, de certa forma, dominar alguma paixão desordenada dentro dela, e o sofrimento ajuda, se a pessoa quer oferecer um sacrifício à Deus. A Igreja não recomenda que uma penitência desse tipo seja algo que possa prejudicar a vida da pessoa.”
Penitência e o caminho de santidade
Professor Felipe ressalta ainda que o objetivo da penitência não é o sofrimento, mas o caminho de santidade. Por isso mesmo, a escolha da penitência pode diferir de uma pessoa para outra.
“Pra um pode ser bom não ver internet. Pra outro pode ser bom não ver televisão, pra outro pode ser ser bom deixar de comer alguma coisa que gosta. Se a minha dificuldade está em partilhar, então nesses quarenta dias eu devo caprichar em dar esmolas para a Igreja, para os pobres, um atendimento à pessoa necessitada. Não só necessitada de recursos materiais, mas também necessitada de carinho, de atenção”, explicou.
A secretária Isabela Maria Simião de Campos escolheu como penitência não acessar as redes sociais, alocando o tempo com outras coisas. “Eu decidi fazer a penitência, percebi que passava muito tempo vendo coisas fúteis, como vídeos, stories, fotos e não dedicava nenhum tempo à vida de oração”.
Sejam penitências gastronômicas, corporais ou morais, ao longo dos anos os fiéis têm mudado a sua forma de vivê-la. Isabela percebeu que a penitência escolhida por ela é um sacrifício, mas tem valido muito a pena. “Perco muitas notícias, por exemplo minha amiga que foi pedida em namoro e eu não soube no dia, só fui saber quando ela me mandou mensagem lembrando que eu estava sem rede social, entre tantas outras. A penitência não só tem ajudado a viver bem a Quaresma, mas também me ajudou a crescer na vida espiritual, a dedicar mais tempo às orações e ao meu relacionamento de intimidade com Deus”.
Fortalecer as fraquezas
A penitência também ajuda a pessoa a se fortalecer naquilo que em que é mais fraca. O padre Alex explica isso fazendo uma comparação: “Se um atleta tem uma deficiência em determinado membro do corpo e ele precisa crescer ali, talvez no tórax, é claro que ele vai centrar suas forças para que possa resolver essa sua deficiência nessa área. Então muita gente vai dizer ‘meu calcanhar de Aquiles é aqui, minha fraqueza é essa’.”
Unida à súplica e à oração, a penitência faz muito bem, acrescenta o sacerdote, pois ali Deus vê a humilhação, a humildade da pessoa de reconhecer sua fraqueza. “A penitência nos coloca no nosso lugar de criatura de Deus que nos ama, e inclusive fez penitência por nós. Não foi por ouro ou prata que fomos comprados, mas pelo Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, ele que fez penitência pela nossa salvação”, concluiu o padre.