Sob a alegação de não cumprimento da declaração de impostos, Estado nicaraguense retira personalidade jurídica da Companhia e confisca bens
Da Redação, com Vatican News
A ordem dos jesuítas foi declarada ilegal na Nicarágua. O governo liderado por Daniel Ortega estabeleceu, por meio de um acordo ministerial, nesta quarta-feira, 23, o confisco de todos os bens da Companhia de Jesus no país. O Estado alega que a declaração de impostos da organização não havia sido cumprida: assim, a entidade perdeu a personalidade jurídica.
Na última semana, o governo nicaraguense já havia confiscado os bens da Universidade Centro-Americana em Manágua na quinta-feira, 17, e despejado jesuítas que viviam em uma casa ao lado da instituição no sábado, 19. Neste último fato, os religiosos chegaram a mostrar documentos provando que a propriedade pertencia à Companhia de Jesus, mas a polícia prosseguiu com a ordem de despejo.
Manifestação jesuíta
Em comunicado, a Província Centro-Americana da Companhia de Jesus manifestou que a decisão se deu sem seguir os processos administrativos previstos por lei, sem dar oportunidade de legítima defesa e sem haver uma instância judicial imparcial para julgar e frear “estes abusos de autoridade totalmente injustificados e arbitrários”.
Lembrando do despejo ocorrido no sábado, a entidade também citou que a ação foi realizada sem tempo hábil para que os residentes na casa recolhessem e levassem seus pertences pessoais.
Por fim, a Província Centro-Americana condenou esta “nova agressão contra os jesuítas da Nicarágua”, considerando-a parte de uma repressão sistemática qualificada como “crime contra a humanidade”, que se encaminha para o “pleno estabelecimento de um regime totalitário”.
No documento, o órgão jesuíta também responsabilizou Daniel Ortega e sua esposa, vice-presidente da Nicarágua, pelos fatos ocorridos, e pediu que ambos cessem com a repressão, aceitem a busca por uma solução em que impere a verdade, a justiça, o diálogo e os direitos humanos e respeite a liberdade dos jesuítas no país.
Situação da Igreja na Nicarágua
A relação do governo da Nicarágua, liderado por Daniel Ortega com a Igreja Católica, tornou-se cada vez mais tensa nos últimos tempos. Em julho do ano passado, missionárias da Caridade foram expulsas do país e alguns veículos de comunicação católicos foram fechados.
Em agosto, o bispo de Matagalpa, Dom Rolando Álvarez, foi preso – primeiro, na Cúria diocesana, e depois, em prisão domiciliar –, acusado de “conspiração”. Em fevereiro deste ano, ele foi formalmente condenado a 26 anos de prisão, após se recusar a embarcar em um avião com outras 222 pessoas, deportadas para os Estados Unidos. No veredito, dado antes do início do julgamento, o bispo foi chamado de “traidor da pátria”. Após a condenação, diversos órgãos da Igreja se manifestaram e prestaram solidariedade ao religioso.
Leia mais
.: Bispos rejeitam perseguição à Igreja na Nicarágua
.: CNBB se solidariza com Igreja na Nicarágua e bispo condenado a prisão
“Ditadura grosseira”
Em 8 de março, duas universidades foram “confiscadas” pelo governo nicaraguense e o estatuto jurídico da Caritas no país foi cancelado. Depois, o representante da Santa Sé na Nicarágua, Monsenhor Marcel Diouf, precisou deixar o país no dia 19 de março após “solicitação” do fechamento da Sede Diplomática, datada de 10 de março. Desde maio, algumas contas bancárias de dioceses locais foram congeladas, com a alegação de investigação por parte da polícia nicaraguense.
No final de junho, a Corte Interamericana de Direitos Humanos ordenou que Dom Rolando fosse libertado por meio de uma resolução de medidas provisórias, dando como prazo o dia 7 de julho. No dia 3, o governo da Nicarágua anunciou a libertação do bispo, mas devido à sua recusa em sair do país, ele voltou a ser preso no dia 5. Diante desta situação, dezenas de personalidades católicas publicaram uma carta denunciando a perseguição religiosa no país e solicitando a libertação do religioso.