Em seu discurso de abertura do Sínodo dedicado à juventude, Francisco frisou importância do diálogo e da escuta para o alcance do discernimento
Da redação, com Boletim Santa Sé
Reunido com cardeais, bispos e participantes da XV Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, Papa Francisco discursou nesta quarta-feira, 3, no Auditório do Sínodo, no Vaticano, sobre elementos primordiais que devem permear as atividades durante o período sinodal. “O Sínodo é um exercício eclesial de discernimento. Franqueza no falar e abertura na escuta são fundamentais para que o Sínodo seja um processo de discernimento”, pontuou.
Os jovens, tema do Sínodo deste ano, foram citados pelo Pontífice no início de seu discurso. Segundo o Santo Padre, a juventude, capaz de exalar positividade e entusiasmo, alegra toda a Igreja e o mundo inteiro. “Agradeço-lhes por terem querido apostar que vale a pena sentir-se parte da Igreja ou entrar em diálogo com ela, (…) vale a pena colocar-se à escuta uns dos outros; vale a pena nadar contracorrente e aderir a valores altos, como a família, a fidelidade, o amor, a fé, o sacrifício, o serviço, a vida eterna”, declarou o Papa.
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Francisco destacou para os bispos que o Sínodo é um momento de partilha, de se posicionar com coragem, liberdade, verdade e caridade, e afirmou que somente o diálogo fará com que a Igreja cresça. O Pontífice chamou atenção para as bisbilhotices, murmurações, ilações e preconceitos, situações classificadas por ele como inúteis, e reafirmou que uma crítica honesta e transparente é o melhor caminho para um diálogo construtivo e de ajuda.
A mesma coragem para falar deve corresponder à humildade de escutar, de acordo com o Santo Padre. “A escuta que abre espaço ao diálogo. (…) Muitos de vós já prepararam, antes de vir, a sua intervenção – e agradeço-vos por este trabalho –, mas convido a sentir-vos livres para considerar aquilo que preparastes como um projeto provisório aberto a eventuais acréscimos e alterações que o caminho sinodal possa sugerir a cada um”, incentivou Francisco que prosseguiu afirmando: “Mudar as nossas convicções e posições é sinal de grande maturidade humana e espiritual”.
Para o Papa, o discernimento deve ser visto pelos participantes como o método e, simultaneamente, o objetivo proposto. “Somos chamados a colocar-nos à escuta daquilo que nos sugere o Espírito, segundo modalidades e direções muitas vezes imprevisíveis”, lembrou. O Pontífice estabeleceu que, durante os trabalhos tanto na assembleia plenária como nos grupos, depois de cada cinco intervenções, seja realizado um tempo de silêncio – cerca de três minutos – para reflexão. “Que cada um preste atenção às ressonâncias que as coisas ouvidas suscitam no seu coração, para aprofundar e apreender o que mais o impressiona. Esta atenção à interioridade é a chave para se efetuar o percurso reconhecer, interpretar e escolher”, anunciou.
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Ser sinal de uma Igreja à escuta e em caminho, este foi o pedido de Francisco durante sua reflexão. De acordo com o Santo Padre, o caminho de preparação para o Sínodo dedicado à juventude destacou uma Igreja com déficit de escuta inclusive para com os jovens, além de apontar que a juventude muitas vezes se sente não-compreendida pela Igreja na sua originalidade. “Uma Igreja que não escuta mostra-se fechada à novidade, fechada às surpresas de Deus, e não poderá ser credível, especialmente para os jovens, os quais, em vez de se aproximar, afastar-se-ão inevitavelmente”, alertou o Pontífice, que seguiu pedindo a renúncia a preconceitos e estereótipos por parte dos participantes.
“Quando pensamos já saber quem é o outro e o que quer, então teremos verdadeiramente dificuldade em escutá-lo seriamente”, frisou o Papa ao citar as relações entre as gerações como repletas de preconceitos e estereótipos. “Os jovens são tentados a considerar ultrapassados os adultos; os adultos são tentados a julgar os jovens inexperientes. (…) A maioria dos presentes não pertence à geração dos jovens, pelo que devemos claramente ter cuidado sobretudo com o risco de falar dos jovens a partir de categorias e esquemas mentais já superados. Se soubermos evitar este risco, então contribuiremos para tornar possível uma aliança entre gerações”, exortou.
Sobre a relação dos jovens com os idosos, o Papa afirmou que os jovens devem superar a tentação de não prestar ouvidos aos adultos e considerar os idosos coisa antiga, passada e chata, esquecendo-se que é insensato querer partir sempre do zero, como se a vida começasse apenas com cada um deles. “Negligenciar o tesouro de experiências que cada geração herda e transmite à outra é um ato de autodestruição”. Além da relação entre geração, Francisco citou também a necessidade de superar decididamente o flagelo do clericalismo.
“O clericalismo nasce duma visão elitista e excludente da vocação, que interpreta o ministério recebido mais como um poder a ser exercido do que como um serviço gratuito e generoso a oferecer; e isto leva a julgar que se pertence a um grupo que possui todas as respostas e já não precisa de escutar e aprender mais nada, ou então finge escutar. O clericalismo é uma perversão e é raiz de muitos males na Igreja: destes devemos pedir humildemente perdão e sobretudo criar as condições para que não se repitam”, destacou o Santo Padre.
A autossuficiência e as conclusões precipitadas de muitos jovens foram também criticadas pelo Pontífice, que as caracterizou como vírus. “Repudiar e rejeitar tudo o que foi transmitido ao longo dos séculos leva apenas àquele perigoso extravio que está, infelizmente, a ameaçar a nossa humanidade; leva ao estado de desilusão que invadiu os corações de gerações inteiras. A acumulação das experiências humanas ao longo da história é o tesouro mais precioso e fiável que as gerações herdam uma da outra; sem nunca esquecer a revelação divina, que ilumina e dá sentido à história e à nossa existência”, comentou.
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O Santo Padre chamou atenção dos bispos para os raciocínios teológicos e afirmou não haver necessidade de ideias complexas para demonstrar ajuda ao mundo atual. Pediu a renúncia de profecias de desgraças e alertou o clero para que não gaste energias na contabilização de falências e na recordação de amarguras, mas que mantenha o olhar fixo no bem que muitas vezes não faz barulho.
“Esforcemo-nos, pois, por procurar ‘frequentar o futuro’ e por fazer sair deste Sínodo não só um documento – que geralmente é lido por poucos e criticado por muitos – mas sobretudo propósitos pastorais concretos”, concluiu.