Vítimas da violência no leste da República Democrática do Congo estiveram com o Papa, testemunhando os atos brutais sofridos; a eles, a oração e a proximidade de Francisco
Jéssica Marçal
Da Redação
Palavras repletas de esperança, mas também de dor pela violência sofrida por tantas pessoas no leste da República Democrática do Congo. O Papa Francisco, em sua viagem ao país, se encontrou, nesta quarta-feira, 1º, com algumas dessas vítimas e pôde ouvir de perto as histórias de seu sofrimento e mostrar a elas sua proximidade e oração. O encontro foi na nunciatura apostólica, em Kinshasa.
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Os relatos chocaram o Santo Padre, que disse não haver palavras diante de tamanha violência: resta chorar e permanecer em silêncio. As pessoas que deram seu testemunho ao Papa são de várias cidades – Bunia, Beni-Butembo, Goma, Masisi, Rutshuru, Bukavu, Uvira – lugares quase nunca mencionados nos meios de comunicação internacionais, ressaltou Francisco.
“Estou com vocês, quero trazer-vos a carícia de Deus. O seu olhar terno e compassivo pousa sobre vocês. Enquanto os violentos vos tratam como objetos, o Pai que está nos Céus vê a sua dignidade e diz a cada um de vocês: «És precioso aos meus olhos, estimo-te e amo te» (Is 43, 4).”
Francisco condenou a violência das armas, os massacres e estupros, bem como a destruição e ocupação das aldeias. Também a exploração sangrenta e ilegal das riquezas do país. E destacou que é sobretudo a ganância que alimenta uma economia de guerra. E aos que movem essa engrenagem da guerra, Francisco lançou um apelo:
“Escutai o grito do seu sangue (cf. Gn 4, 10), prestai ouvidos à voz de Deus, que vos chama à conversão, e à voz da vossa consciência: fazei silenciar as armas, acabai com a guerra. Basta! Basta de se enriquecer na pele dos mais frágeis, basta de se enriquecer com recursos e dinheiro manchados de sangue!”
“Não” à violência e à resignação
O que fazer diante de tanta violência, de tantos relatos de crueldade? O Santo Padre indicou , primeiramente, dois “nãos”: à violência e à resignação.
Francisco lembrou que o ódio só gera mais ódio e que não há violência em nome de Deus. Para combatê-la, é preciso acabar com as raízes da violência e ter a coragem de desarmar o coração. “Tirar o veneno, rejeitar o ódio, desativar a ganância, cancelar o ressentimento; dizer ‘não’ a tudo isso parece fazer-nos débeis, mas, na realidade, torna-nos livres, porque dá paz. Sim, a paz nasce dos corações, dos corações libertos do rancor.”
Novamente, o Santo Padre renovou o apelo a todos os que vivem na República Democrática do Congo para que não desistam e se empenhem em construir um futuro melhor. “Um futuro de paz não vai cair do céu, mas poderá chegar se se eliminarem dos corações o fatalismo resignado e o medo de se envolver com os outros”.
Dois “sins” pela paz
Ainda falando de caminhos para a paz, Francisco citou o “sim” à reconciliação, convidando as vítimas a serem “árvores da vida”. O Papa usou a metáfora da árvore – que absorve ar poluído e devolve oxigênio – para falar da importância de responder ao mal com o bem, como é a profecia cristã.
“Reconciliar-se é gerar o amanhã: é crer no futuro em vez de ficar ancorados no passado; é apostar na paz em vez de se resignar com a guerra; é escapar da prisão das próprias razões para se abrir aos outros e saborear, juntos, a liberdade.”
Por fim, Francisco destacou o “sim” à esperança, cuja fonte é Jesus. Repetiu, como já havia falado na Missa, mais cedo, que com Jesus o mal não tem a última palavra sobre a vida. Trata-se de uma esperança que precisa ser semeada, pensando nas gerações futuras, não em resultados imediatos.
“Jesus, nosso irmão, Deus da reconciliação que plantou a árvore de vida que é a cruz no coração das trevas do pecado e do sofrimento, Deus da esperança que acredita em vós, no vosso país e no vosso futuro, vos abençoe e console; derrame a sua paz nos vossos corações, nas vossas famílias e em toda a República Democrática do Congo”, concluiu.