Catequese

Papa: comprar produtos que usam trabalho infantil é ser cúmplice

Na Catequese desta quarta-feira, 15, Francisco enfatizou que a consciência do que se compra é o primeiro passo para não ser cúmplice desta chaga social, que é “desprezível e atroz”

Da redação, com Vatican News

Papa Francisco na Catequese desta quarta-feira, 15/ Foto: Joyce Mesquita

As crianças estiveram mais uma vez no centro da Catequese do Papa Francisco. Na Audiência Geral desta quarta-feira, 15, na Sala Paulo VI, o Pontífice voltou a enfatizar o problema do trabalho infantil. Na semana passada, ele salientou que Jesus falou várias vezes sobre a importância de proteger, acolher e amar os mais pequenos.

“No entanto, ainda hoje no mundo, milhões de menores, mesmo não tendo a idade mínima para cumprir com as obrigações da vida adulta, são obrigados a trabalhar e muitos deles são expostos a trabalhos particularmente perigosos. Sem falar das crianças que são traficadas para prostituição ou pornografia, e dos casamentos forçados”, disse o Santo Padre.

O Pontífice frisou que “infelizmente”, existem muitas formas pelas quais “as crianças são abusadas e maltratadas”. “O abuso infantil, de qualquer natureza, é um ato desprezível e atroz. Não é simplesmente um flagelo social e um crime; é uma violação muito grave dos mandamentos de Deus”, afirmou. Segundo o Papa, nenhuma criança deveria sofrer abusos.

Despertar consciências, praticar a proximidade e a solidariedade concreta com as crianças e jovens vítimas de abusos e, ao mesmo tempo, construir confiança e sinergias entre aqueles que se comprometem a oferecer-lhes oportunidades e locais seguros para crescerem em paz é a indicação de Francisco.

Pobreza e falta de apoio

O Papa contou que conhece um país da América Latina, que produz uma fruta chamada “arando”, um tipo de mirtilo. “Para colher o arando são necessárias mãos delicadas e são as crianças a fazê-lo, escravizam as crianças para uma colheita”, denunciou.

“A pobreza generalizada, a falta de ferramentas sociais de apoio às famílias, o aumento da marginalização nos últimos anos, a par do desemprego e da precariedade laboral, são fatores que descarregam sobre os mais jovens o preço mais elevado a pagar. Nas metrópoles, onde a exclusão social e a degradação moral são ‘gritantes’, existem crianças envolvidas no tráfico de drogas e nas mais diversas atividades ilícitas”.

São muitas as crianças vítimas de sacrifício, alertou o Pontífice. Ele lamentou que por vezes, “tragicamente”, menores são induzidos a se tornarem “carrascos” de seus semelhantes, além de prejudicarem a si mesmos, sua própria dignidade e humanidade. No entanto, o Santo Padre salientou que muitos ao se depararem com estas vidas, olham para o “outro lado”.

Desaparecimento na Argentina

Na sequência, Francisco recordou o caso que aconteceu em seu país, Argentina, do menino Loan Peña, de 5 anos. Ele desapareceu na cidade Nove de Julho, em Corrientes, em junho do ano passado.

“Loan foi sequestrado e ninguém sabe onde ele está”, disse o Papa. Uma das hipóteses é que tenha sido sequestrado para tráfico de órgãos. “Isso acontece. Alguns voltam com cicatrizes, outros morrem. É por isso que eu gostaria de lembrar esse menino, Loan, hoje”, disse.

Reconhecer os problemas sociais

“É difícil para nós reconhecer a injustiça social que leva duas crianças, talvez residentes no mesmo bairro ou prédio de apartamentos, a tomarem caminhos e destinos diametralmente opostos, porque uma delas nasceu numa família desfavorecida. Uma fratura humana e social inaceitável: entre aqueles que podem sonhar e aqueles que devem sucumbir”, opinou.

Jesus quer que todos sejam livres e felizes, defendeu o Papa, e pede que o sofrimento dos que não têm voz, dos que não têm escola sejam ouvidos. O Santo Padre ressaltou que combater a exploração, sobretudo a infantil, é a principal forma de construir um futuro melhor para toda a sociedade.

 “Alguns países tiveram a sabedoria de incluir por escrito os direitos das crianças. As crianças têm direitos, pesquisem para descobrir quais são os direitos da criança”.

Foto: Joyce Mesquita

Contribuir para erradicação do trabalho infantil

O Pontífice pediu que todos os católicos pensem em como ajudar na erradicação do trabalho infantil, principalmente não sendo cúmplices dele. De acordo com ele, pessoas são cumplices desse crime quando compram produtos que utilizam trabalho infantil:

“Como posso comer e vestir-me sabendo que por detrás daquela comida ou daquela roupa estão crianças exploradas, que trabalham em vez de irem à escola?”

Ter consciência do que se comprar é o primeiro passo para não ser cúmplice desta chaga social, indicou o Santo Padre. “Veja de onde vêm esses produtos. Alguns podem dizer que, como indivíduos, não podemos fazer muito. É verdade, como indivíduos não podemos fazer muito, mas cada um de nós pode ser uma gota que, juntamente com muitas outras gotas, se pode transformar num mar”.

Francisco também lembrou as instituições, incluindo as eclesiásticas, e as empresas da sua responsabilidade, de que elas podem fazer a diferença transferindo os seus investimentos para empresas que não utilizam, nem permitem o trabalho infantil.

Muito mais pode ser feito

Muitos estados e organizações internacionais já promulgaram leis e diretivas contra o trabalho infantil, mas muito mais pode ser feito, frisou o Pontífice. “Peço também aos jornalistas que façam a sua parte: podem ajudar a aumentar a consciencialização sobre o problema e ajudar a encontrar soluções. Não tenham medo, denunciem, denunciem essas coisas”.

Por fim, o Santo Padre agradeceu a todos aqueles que não se afastam quando veem crianças forçadas a tornarem-se adultos”. Ele recordou Santa Teresa de Calcutá, alegre serva na vinha do Senhor, que foi mãe das crianças mais desfavorecidas e esquecidas. “Com a ternura e a atenção do seu olhar, ela pode acompanhar-nos para ver os pequenos invisíveis, os muitos escravos de um mundo que não podemos abandonar às suas injustiças”.

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