Na Missa do Crisma, Francisco reafirmou a preferência do Senhor pelos pobres, prisioneiros de guerra, cegos e oprimidos
Da redação, com Vatican News
O Papa Francisco presidiu a Missa do Crisma, nesta Quinta-feira Santa, 18, na Basílica de São Pedro. Junto com o Papa, além de cardeais e bispos, concelebraram os sacerdotes da Diocese de Roma, significando a unidade da Igreja reunida em torno de seu bispo.
Em sua homilia, o Pontífice sublinhou que o Evangelho de Lucas faz reviver a emoção do momento em que o Senhor se assume a profecia de Isaías, lendo-a solenemente no meio do seu povo. “A sinagoga de Nazaré estava cheia de parentes, vizinhos, conhecidos, amigos… e outros não muito amigos. E todos tinham os olhos fixos n’Ele”, recordou.
Com frequência, o Santo Padre afirmou que os Evangelhos apresentam a imagem do Senhor no meio das multidões, cercado e comprimido pelas pessoas que lhe trazem os doentes, pedem-lhe que expulse os espíritos malignos, escutam os seus ensinamentos e caminham com Ele. “O Senhor nunca perdeu este contato direto com o povo, sempre manteve a graça da proximidade, com o povo no seu conjunto e com cada pessoa no meio daquelas multidões”, ressaltou Francisco.
O Papa explicou: “Aqui, o termo ‘multidões’ não é depreciativo. Talvez para alguém, poderia soar como uma massa anônima, indiferenciada; mas no Evangelho, quando as multidões interagem com o Senhor, que se coloca no meio delas como um pastor no rebanho, vemos que as multidões se transformam: no espírito do povo, desperta o desejo de seguir Jesus, brota a admiração, toma forma o discernimento”.
Em seguida, o Santo Padre refletiu com os fiéis sobre três graças que caracterizam o relacionamento entre Jesus e as multidões: a graça do seguimento, a graça da admiração e a graça do discernimento. Na primeira graça, a do seguimento, Francisco ressalta que as multidões procuram e seguem Jesus, o empurram e o apertam.
“Esse seguimento do povo não é calculista, é um seguimento sem condições, cheio de carinho. Contrasta com a mesquinhez dos discípulos, cujo comportamento com o povo se revela quase cruel quando sugerem ao Senhor que mande as pessoas embora para irem procurar algo para comer. Creio que o clericalismo começou aqui: nesta atitude de querer assegurar-se o próprio alimento e comodidade, desinteressando-se das pessoas. O Senhor cortou pela raiz esta tentação, dizendo-lhes: ‘Vocês é que têm de lhes dar de comer’. Cuidem do povo!”, pediu o Pontífice.
A segunda graça que a multidão recebe ao seguir Jesus é a graça da admiração, uma admiração caracterizada pelo Papa como cheia de alegria. Francisco completou: “O povo fica admirado com Jesus, com os seus milagres, mas sobretudo com a sua própria Pessoa. O povo gostava muito de saudá-Lo ao longo da estrada, ser abençoado por Ele e bendizê-Lo, como aquela mulher que do meio da multidão bendisse a sua Mãe. E o Senhor, por sua vez, ficava admirado com a fé do povo, regozijava-Se e não perdia ocasião de o fazer notar”.
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A terceira graça, que recebe o povo, é a do discernimento. O Santo Padre recordou que a multidão ficava impressionada com os ensinamentos de Jesus, porque Ele ensinava como alguém que tem autoridade, e não como os doutores da Lei.
“Cristo, a Palavra de Deus feita carne, suscita nas pessoas este carisma do discernimento; certamente, não um discernimento de especialistas em assuntos controversos. Quando os fariseus e os doutores da lei discutiam com Ele, aquilo que o povo reconhecia era a Autoridade de Jesus: a força da sua doutrina, capaz de penetrar nos corações, e o fato de os espíritos malignos Lhe obedecerem; e ainda deixar sem palavra aqueles que urdiam diálogos insidiosos. O povo alegrava-se com isso”, completou o Papa.
Segundo o Pontífice, o evangelista Lucas indica quatro grandes grupos que são destinatários preferenciais da unção do Senhor: os pobres, os prisioneiros de guerra, os cegos e os oprimidos. Segundo Francisco, os pobres são aqueles que estão curvados, como os mendigos que se inclinam para pedir. Mas é pobre também a viúva, que unge com os seus dedos as duas moedinhas que constituíam tudo o que tinha naquele dia para viver.
“A unção daquela viúva para dar a esmola passa despercebida aos olhos de todos, exceto aos de Jesus, que vê com bondade a sua pequenez. Com ela, o Senhor pode cumprir plenamente a sua missão de anunciar o Evangelho aos pobres”, revelou o Santo Padre.
Sobre os cegos, o Papa comentou: “Os cegos são representados por um dos rostos mais simpáticos do Evangelho: Bartimeu o mendigo cego que recuperou a vista e, a partir daquele momento, só teve olhos para seguir Jesus pela estrada. A unção do olhar!”
Para designar os oprimidos, o Santo Padre sublinhou que São Lucas usa um termo que contém a palavra ‘trauma’. “Isto é suficiente para evocar a parábola do Bom Samaritano, que unge com azeite e enfaixa as feridas do homem que fora espancado deixando-o meio morto na beira da estrada. A unção da carne ferida de Cristo! Naquela unção, está o remédio para todos os traumas que deixam pessoas, famílias e populações inteiras fora de jogo, como excluídas e supérfluas, à margem da história”, revelou o Pontífice.
Os prisioneiros são definidos pelo Papa como os cativos de guerra, aqueles que eram conduzidos a ponta de lança. “Hoje as cidades são feitas prisioneiras não tanto a ponta de lança, como sobretudo com os meios mais sutis de colonização ideológica. Só a unção da nossa cultura própria, forjada pelo trabalho e a arte dos nossos antepassados, é que pode libertar as nossas cidades destas novas escravidões”, comentou.
Nesta Quinta-feira Santa em que os sacerdotes renovam na missa do Crisma as promessas sacerdotais pronunciadas no dia da ordenação, o Papa disse:
“Queridos irmãos sacerdotes, não devemos esquecer que os nossos modelos evangélicos são este ‘povo’, esta multidão com estes rostos concretos, que a unção do Senhor levanta e vivifica. São aqueles que completam e tornam real a unção do Espírito em nós, que fomos ungidos para ungir. Fomos tomados dentre eles e podemos, sem medo, identificar-nos com esta gente simples. Cada um de nós tem a própria história. Recordar nos fará muito bem. Eles são imagem da nossa alma e imagem da Igreja. Cada um encarna o coração único do nosso povo. Não somos distribuidores de azeite em garrafa. Ungimos, distribuindo-nos a nós mesmos, distribuindo a nossa vocação e o nosso coração. Enquanto ungimos, somos de novo ungidos pela fé e pela afeição do nosso povo. Ungimos, sujando as nossas mãos ao tocar as feridas, os pecados, as amarguras do povo; ungimos perfumando as nossas mãos ao tocar a sua fé, as suas esperanças, a sua fidelidade e a generosidade sem reservas da sua doação que muitos ilustrados qualificam como superstição”.
O Santo Padre disse que quando crisma e ordena, gosta de espalhar bem o Crisma na testa e nas mãos daqueles que são ungidos. “Ungindo bem, experimenta-se que ali se renova a nossa própria unção. Enquanto ungimos, somos de novo ungidos pela fé e pela afeição do nosso povo. Aquele que aprende a ungir e a abençoar fica curado da mesquinhez, do abuso e da crueldade”, concluiu o Papa.