MENSAGEM
Mensagem do Papa Francisco ao Prior geral da Ordem dos Irmãos da Beata Virgem Maria do Monte Carmelo em ocasião do Capítulo Geral
Quinta-feira, 5 de setembro de 2013
Boletim da Santa Sé
Tradução: Jéssica Marçal
Ao reverendíssimo padre
Fernando Millán Romeral
Prior Geral da Ordem dos Irmãos da Beata Virgem Maria do Monte Carmelo
Dirijo-me a vocês, queridos Irmãos da Ordem da Beata Virgem Maria do Monte Carmelo, que celebram neste mês de setembro o Capítulo Geral. Em um momento de graça e renovação, que vos chama a discernir a missão da gloriosa Ordem carmelita, desejo oferecer a vocês uma palavra de encorajamento e de esperança. O antigo carisma do Carmelo foi por oito séculos um dom para toda a Igreja e ainda hoje continua a oferecer a sua peculiar contribuição para a edificação do Corpo de Cristo e para mostrar ao mundo a face luminosa e santa. As vossas origens contemplativas decorrem da terra da epifania do amor eterno de Deus em Jesus Cristo, Verbo feito carne. Enquanto refletem sobre a vossa missão de Carmelitas de hoje, sugiro-vos considerar três elementos que podem guiar-vos na realização plena da vossa vocação que é a subida ao monte da perfeição: a lealdade a Cristo, a oração e a missão.
Lealdade
A Igreja tem a missão de levar Cristo ao mundo e por isto, como Mãe e Mestra, convida cada um a aproximar-se Dele.
Na liturgia carmelita para a festa de Maria do Monte Carmelo contemplamos a Virgem que está “junto à Cruz de Cristo”. Aquele é também o lugar da Igreja: próximo a Cristo. E é também o lugar de cada filho fiel da Ordem carmelita. A vossa Regra começa com a exortação aos irmãos de “viver uma vida de lealdade a Jesus Cristo”, para segui-Lo e servi-Lo com coração puro e indivisível. A estreita relação com Cristo se realiza na solidão, na assembleia fraterna e na missão. “A opção fundamental de uma vida concretamente e radicalmente dedicada a seguir Cristo” (Ratio Institutionis Vitae Carmelitanae, 8) faz da vossa existência uma peregrinação de transformação no amor. O Concílio Ecumênico Vaticano II recorda o papel da contemplação no caminho da vida: a Igreja tem “de fato a característica de ser ao mesmo tempo humana e divina, visível, mas dotada de realidade invisível, zelosa na ação e dedicada à contemplação, presente no mundo e todavia peregrina” (Sacrosanctum Concilium, 2). Os antigos eremitas do Monte Carmelo conservaram a memória daquele lugar santo e, mesmo exilados ou distantes, mantiveram o olhar e o coração constantemente fixos na glória de Deus. Refletindo sobre as vossas origens e sobre a vossa história e contemplando o imenso grupo de pessoas que viveram nos séculos o carisma carmelita, descobrirão também a vossa vocação atual de ser profetas de esperança. E é justamente nesta esperança que serão regenerados. Muitas vezes aquilo que parece novo é algo muito antigo iluminado por nova luz.
Na vossa Regra há o coração da missão carmelita de então e também de hoje. Enquanto vocês se preparam para celebrar o oitavo centenário da morte de Alberto, Patriarca de Jerusalém, em 1214, recordem que ele formulou um “percurso de vida”, um espaço que torna capaz de viver uma espiritualidade totalmente orientada a Cristo. Ele delineou elementos externos e interiores, uma ecologia física do espaço e armadura espiritual necessária para responder adequadamente à vocação e cumprir eficazmente a própria missão.
Em um mondo que muitas vezes desconhece Cristo e, de fato, rejeita-O, vocês são convidados a aproximarem-se e a aderirem sempre mais profundamente a Ele. É um chamado contínuo a seguir Cristo e a ser conforme Ele. Isto é de vital importância no nosso mundo tão desorientado, “porque quando a sua chama se apaga também todas as outras luzes acabam perdendo o seu vigor” (Lumen fidei, 4). Cristo está presente na vossa fraternidade, na liturgia comunitária e no ministério confiado a vocês: renovem a lealdade de toda a vossa vida!
Oração
O Santo Padre Bento XVI, antes do vosso Capítulo Geral de 2007, recordou a vocês que “a peregrinação interior de fé rumo a Deus começa na oração”; e em Castel Gandolfo, em agosto de 2010, disse-vos: “Vocês são aqueles que nos ensinam a rezar”. Vocês se definem contemplativos em meio ao povo. De fato, se é verdade que vocês são chamados a viver nas alturas do Carmelo, é também verdade que vocês são chamados a dar testemunho em meio ao povo. A oração é aquela “estrada real” que abre à profundidade do mistério de Deus Uno e Trino, mas é também o sentido obrigatório que perpassa em meio ao povo de Deus peregrino no mundo rumo à Terra Prometida.
Um dos caminhos mais belos para entrar na oração passa através da Palavra de Deus. A lectio divina introduz à conversação direta com o Senhor e abre os tesouros da sabedoria. A íntima amizade com Aquele que nos ama nos torna capazes de ver com os olhos de Deus, de falar com a sua Palavra no coração, de conservar a beleza desta experiência e de partilhá-la com aqueles que têm fome de eternidade.
O retorno à simplicidade de uma vida centrada no Evangelho é o desafio para a renovação da Igreja, comunidade de fé que encontra sempre caminhos novos para evangelizar o mundo em contínua transformação. Os santos carmelitas foram grandes percussores e mestres de oração. Isto é o que uma vez mais se pede ao Carmelo do século XXI. Ao longo de toda a vossa história, os grandes Carmelitas foram um forte lembrete às raízes da contemplação, raízes sempre fecundas de oração. Aqui está o coração do vosso testemunho: a dimensão de “contemplatividade” da Ordem, de viver, de cultivar e de transmitir. Gostaria que cada um se perguntasse: como é a minha vida de contemplação? Quanto tempo dedico durante o meu dia à oração e à contemplação? Um carmelita sem esta vida de contemplação é um corpo morto! Hoje, talvez mais que no passado, é fácil deixar-se distrair pelas preocupações e pelos problemas deste mundo e fazer-se aproximar de falsos ídolos. O nosso mundo está dividido de muitas formas; o contemplativo, em vez disso, leva à unidade e constitui um forte apelo à unidade. Agora, mais do que nunca, é o momento de redescobrir o sentido interior do amor através da oração e oferecer ao povo de hoje no testemunho da contemplação, bem como na pregação e na missão, não atalhos desnecessários, mas aquela sabedoria que emerge do meditar “dia e noite na Lei do Senhor”, Palavra que sempre conduz junto à Cruz gloriosa de Cristo. E, unida à contemplação, a austeridade de vida, que não é um aspecto secundário da vossa vida e do vosso testemunho. É uma tentação muito forte mesmo para vocês aquela de cair na mundanidade espiritual. O espírito do mundo é inimigo da vida de oração: não se esqueçam nunca disso! Exorto-vos a uma vida mais austera e penitente, segundo a vossa mais autêntica tradição, uma vida distante de toda mundanidade, distante dos critérios do mundo.
Missão
Queridos Irmãos Carmelitas, a vossa missão é a mesma de Jesus. Todo planejamento, toda comparação seria inútil se o Capítulo não realizasse antes de tudo um caminho de verdadeira renovação. A Família Carmelita conheceu uma maravilhosa “primavera”, em todo o mundo, aquele fruto, doado por Deus, do empenho missionário do passado. Toda missão coloca muitas vezes árduos desafios, porque a mensagem evangélica não é sempre acolhida e às vezes é rejeitada com violência. Não devemos nunca esquecer que, mesmo se somos jogados em águas turvas e desconhecidas, Aquele que nos chama à missão nos dá também a coragem e a força de fazê-la. Por isso, celebrem o Capítulo animados pela esperança que não morre nunca, com um forte espírito de generosidade no recuperar a vida contemplativa e a simplicidade e austeridade evangélica.
Dirigindo-me aos peregrinos na Praça São Pedro tive oportunidade de dizer: “Cada cristão e cada comunidade é missionária à medida que leva e vive o Evangelho e testemunha o amor de Deus para todos, especialmente para quem se encontra em dificuldade. Sejam missionários do amor e da ternura de Deus! Sejam missionários da misericórdia de Deus, que sempre nos perdoa, sempre nos espera, nos ama tanto!” (Homilia, 5 de maio de 2013). O testemunho do Carmelo no passado pertence à profunda tradição espiritual crescida em uma das grandes escolas de oração. Essa suscitou também a coragem de homens e mulheres que enfrentaram o perigo e até mesmo a morte. Recordemos somente os dois grandes mártires contemporâneos: Santa Teresa Benedita da Cruz e o Beato Titus Brandsma. Pergunto-me então: hoje entre vós, vive-se com a têmpera, com a coragem destes santos?
Queridos irmãos do Carmelo, o testemunho do vosso amor e da vossa esperança, enraizados na profunda amizade com o Deus vivo, pode vir a ser uma “leve brisa” que renova e revigora a vossa missão eclesial no mundo de hoje. A isso vocês foram chamados. O Rito da Profissão coloca em seus lábios estas palavras: “Com esta profissão confio-me à família carmelita para viver a serviço de Deus e na Igreja e aspirar à caridade perfeita com a graça do Espírito Santo e a ajuda da Beata Virgem Maria” (Rito da Profissão Ord. Carm.).
A Beata Virgem Maria, Mãe e Rainha do Carmelo, acompanhe os vossos passos e torne fecundo de frutos o cotidiano caminho rumo ao Monte de Deus. Invoco sobre toda a Família Carmelita, e particularmente sobre os Padres Capitulares, abundantes dons do Divino Espírito e a todos concedo de coração a Benção Apostólica.
Do Vaticano, 22 de agosto de 2013
Francisco