Na íntegra

Discurso do Papa aos presbíteros, consagrados e catequistas em Díli

VIAGEM DO PAPA FRANCISCO À INDONÉSIA, PAPUA-NOVA GUINÉ, TIMOR-LESTE E SINGAPURA
DISCURSO DO PAPA FRANCISCO NO ENCONTRO COM OS BISPOS, SACERDOTES, DIÁCONOS, CONSAGRADOS (AS), SEMINARISTAS E CATEQUISTAS EM DÍLI, EM TIMOR-LESTE
Terça-feira, 10 de setembro de 2024

Boletim da Santa Sé

Prezados irmãos bispos,
Amados sacerdotes e diáconos,
consagradas, consagrados e seminaristas,
Queridos catequistas,
irmãos e irmãs, bom dia!

Estou feliz por me encontrar entre vós, no contexto de uma viagem que me vê como peregrino nas terras do Oriente. Agradeço a D. Norberto do Amaral as palavras que me dirigiu, recordando que Timor-Leste é um País “nos confins do mundo”. Pois, gostaria de dizer: precisamente porque está nas fronteiras, encontra-se no centro do Evangelho! Porque no coração de Cristo, como sabemos, as periferias da existência são o centro: o Evangelho está repleto de pessoas, figuras e histórias que se encontram nas margens, nas fronteiras, mas são convocadas por Jesus e tornam-se protagonistas da esperança que Ele veio trazer.

Alegro-me convosco e por vós, porque sois nesta terra os discípulos do Senhor. Pensando nas vossas canseiras e nos desafios que sois chamados a enfrentar, veio-me à mente um trecho muito sugestivo do Evangelho de João, que conta um episódio de ternura e intimidade ocorrido na casa dos amigos de Jesus: Lázaro, Marta e Maria (cf. Jo 12, 1-11). A certa altura, durante o jantar, Maria «ungiu os pés de Jesus com uma libra de perfume de nardo puro, de alto preço, e enxugou-lhos com os seus cabelos. A casa encheu-se com a fragrância do perfume» (v. 3).

Maria unge os pés de Jesus e aquele perfume difunde-se pela casa. Gostaria de me deter convosco precisamente nisto: o perfume, o perfume de Cristo e do seu Evangelho, dom que devemos guardar e que somos chamados a difundir. Guardar o perfume, difundir o perfume. Meditemos sobre isto.

Guardar o perfume. Sentimos sempre necessidade de voltar à origem do dom recebido, do nosso ser cristãos, sacerdotes, consagrados ou catequistas. Recebemos a própria vida de Deus através do seu Filho Jesus, que morreu por nós e nos deu o Espírito Santo. Fomos ungidos com o Óleo da alegria e, escreve o apóstolo Paulo, «somos para Deus o bom odor de Cristo» (2 Cor 2, 15).

Caríssimos, vós sois o perfume de Cristo! E este símbolo não vos é estranho: aqui em Timor, efetivamente, crescem em abundância árvores de sândalo, com o seu perfume muito apreciado e procurado também por outros povos e Nações. A própria Bíblia enaltece o seu valor, quando narra que a Rainha de Sabá visitou o Rei Salomão, oferecendo-lhe madeira de sândalo (cf. 1 Rs 10, 12).

Irmãos e irmãs, vós sois o perfume do Evangelho neste país. Como uma árvore de sândalo, de folha perene, forte, que cresce e dá frutos, também vós sois discípulos missionários, perfumados com o Espírito Santo para inebriar a vida do vosso povo.
Não esqueçamos, porém, uma coisa: o perfume recebido do Senhor deve ser guardado com cuidado, como Maria de Betânia o tinha conservado precisamente para Jesus. Também nós devemos guardar o amor com que o Senhor perfumou a nossa vida, para que não se dissipe nem perda o seu aroma. O que significa isto? Significa ter consciência do dom recebido, recordar que o perfume não é para nós, mas para ungir os pés de Cristo, anunciando o Evangelho e servindo os pobres; significa vigiar sobre nós mesmos, porque a mediocridade e a tibieza espiritual andam sempre à espreita.

E gostaria de acrescentar uma outra coisa: olhamos com gratidão para a história que nos precedeu, para a semente da fé aqui lançada pelos missionários, para as escolas de formação de agentes pastorais, e tantas outras coisas. Mas será isto suficiente? Efetivamente, devemos sempre alimentar a chama da fé. Por isso, gostaria de vos dizer: não vos descuideis de aprofundar a doutrina cristã, de amadurecer a partir da formação espiritual, catequética e teológica; porque tudo isto serve para anunciar o Evangelho na vossa cultura e, ao mesmo tempo, para a purificar de formas e tradições arcaicas, por vezes supersticiosas. Há tantas coisas belas na vossa cultura! Penso, especialmente, na fé na ressurreição e na presença das almas dos defuntos; mas tudo isto deve ser sempre purificado à luz do Evangelho e da doutrina da Igreja. Empenhai-vos para tal, porque «toda a cultura e todo o grupo social necessitam de purificação e amadurecimento» (Exort. ap. Evangelii gaudium, 69).

E chegamos ao segundo aspecto: difundir o perfume. A Igreja existe para evangelizar, e nós somos chamados a levar aos outros o doce perfume da vida nova do Evangelho. Maria de Betânia não usa o precioso nardo para se perfumar a si mesma, mas para ungir os pés de Jesus, e assim espalha o aroma por toda a casa. Além disso, o Evangelho de Marcos especifica que Maria, para ungir Jesus, parte o frasco de alabastro que continha o unguento perfumado (cf. 14, 3). A evangelização acontece quando temos a coragem de “partir” o frasco que contém o perfume, de quebrar a “casca” que muitas vezes nos fecha em nós mesmos e de sair de uma religiosidade preguiçosa e cômoda, vivida apenas para as necessidades pessoais. Gostei da expressão que a Irmã Rosa utilizou no seu testemunho: uma Igreja em movimento, uma Igreja que não está parada, que não gira em torno de si mesma, mas que é abrasada pela paixão de levar a alegria do Evangelho a todos.

Também o vosso país, radicado numa longa história cristã, precisa hoje de um renovado impulso na evangelização, para que chegue a todos o perfume do Evangelho: um perfume de reconciliação e de paz, depois dos sofridos anos da guerra; um perfume de compaixão, que ajude os pobres a reerguerem-se e que suscite o empenho em levantar os destinos econômicos e sociais do país; um perfume de justiça contra a corrupção. E, em particular, o perfume do Evangelho deve ser difundido contra tudo o que humilha, deturpa e até destrói a vida humana, contra as chagas que geram vazio interior e sofrimento, como o alcoolismo, a violência e a falta de respeito pela dignidade das mulheres. O Evangelho de Jesus tem o poder de transformar estas realidades obscuras e gerar uma sociedade nova.

Caríssimos, precisamos deste impulso do Evangelho; e, por isso, são necessários sacerdotes, consagrados e catequistas apaixonados, preparados, criativos. Agradeço o testemunho do senhor Florentino, um catequista que dedicou grande parte da sua vida a este belíssimo ministério. E particularmente aos sacerdotes, quero dizer o seguinte: soube que o povo se dirige a vós com muito carinho, chamando-vos “Amu”, que é o título mais importante entre vós e significa “senhor”. Mas isso não deve provocar em vós um sentimento de superioridade em relação ao povo, induzindo à tentação do orgulho e do poder; não deve fazer-vos pensar no ministério como um prestígio social, agindo como chefes que dominam sobre os outros. Lembremo-nos disto: com o perfume se ungem os pés de Cristo, que são os pés dos nossos irmãos na fé, a começar pelos mais pobres. É eloquente o gesto que, aqui, os fiéis têm quando encontram os sacerdotes: tomam a vossa mão consagrada e aproximam-na da fronte em sinal de bênção. É bonito ver neste sinal o afeto do povo santo de Deus, porque o padre é um instrumento de bênção: nunca deve aproveitar-se da sua função, mas deve sempre abençoar, consolar, ser ministro de compaixão e sinal da misericórdia de Deus.

Caríssimos, um diplomata português do século XVI, Tomé Pires, escreveu assim: «Os comerciantes malaios dizem que Deus criou Timor para o sândalo» (The Summa Oriental, Londres 1944, 204). Nós, porém, sabemos que existe um outro perfume, o de Cristo e do Evangelho, que enriquece a vida e a enche de alegria.

Não desanimeis! Como nos recordou o Padre Sancho no seu comovente testemunho: «Deus sabe cuidar daqueles que Ele chamou e enviou para a missão». Abençoo-vos do fundo do meu coração. E peço-vos o favor de rezardes por mim. Obrigado.

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