CATEQUESE
Praça São Pedro – Vaticano
Quarta-feira, 30 de agosto de 2016
Boletim da Santa Sé
Tradução livre: Jéssica Marçal (Canção Nova)
Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
Hoje gostaria de voltar a um tema importante: a relação entre a esperança e a memória, com particular referência à memória da vocação. E tomo como ícone o chamado dos primeiros discípulos de Jesus. Em sua memória permanece tão impressa esta experiência que alguém registrou até a hora: “Eram cerca de quatro da tarde” (Jo 1, 39). O evangelista João narra o episódio como uma nítida recordação de juventude, que ficou intacta na sua memória de ancião: porque João escreve essas coisas quando era já um idoso.
O encontro havia acontecido próximo ao rio Jordão, onde João Batista batizava; e aqueles jovens galileus tinham escolhido o Batista como guia espiritual. Um dia vem Jesus e se fez batizar no rio. O dia seguinte passou de novo e então o Batizador – isso é, João o Batista – disse a dois de seus discípulos: “Eis o Cordeiro de Deus” (v. 36).
E para aqueles dois é a “faísca”. Deixam seu primeiro mestre e se colocam ao seguimento de Jesus. No caminho, Ele se vira para eles e coloca a pergunta decisiva: “O que procurais?” (v. 38). Jesus aparece nos Evangelhos como um especialista do coração humano. Naquele momento havia encontrado dois jovens em busca, saudavelmente inquietos. De fato, que juventude é uma juventude satisfeita, sem uma busca de sentido? Os jovens que não buscam nada não são jovens, estão aposentados, envelheceram antes do tempo. É triste ver jovens aposentados…E Jesus, através de todo o Evangelho, em todos os encontros que lhe acontecem ao longo do caminho, aparece como um “incendiário” dos corações. Daqui aquela sua pergunta que procura fazer emergir o desejo de vida e de felicidade que cada jovem traz dentro de si: “o que procurais?”. Também eu gostaria hoje de perguntar aos jovens que estão aqui na praça e aqueles que nos ouvem pela mídia: “Você, que é jovem, o que procura? O que procura no teu coração?”.
A vocação de João e de André começa assim: é o início de uma amizade com Jesus tão forte a ponto a criar uma comunhão de vida e de paixão com Ele. Os dois discípulos começam a estar com Jesus e logo se transformam em missionários, porque quando termina o encontro não voltam para casa tranquilos: tanto é verdade que seus respetivos irmãos – Simão e Tiago – logo são envolvidos no seguimento. Foram até eles e disseram: “Encontramos o Messias, encontramos um grande profeta”: dão a notícia. São missionários daquele encontro. Foi um encontro tão tocante, tão feliz que os discípulos recordarão para sempre aquele dia que iluminou e orientou sua juventude.
Como se descobre a própria vocação neste mundo? Pode-se descobri-la de tantos modos, mas esta página do Evangelho nos diz que o primeiro indicador é a alegria do encontro com Jesus. Matrimônio, vida consagrada, sacerdócio: toda vocação verdadeira começa com um encontro com Jesus que nos dá uma alegria e uma esperança nova; e nos conduz, mesmo através de provações e dificuldades, a um encontro sempre mais pleno, cresce, aquele encontro, o encontro com Ele e leva à plenitude da alegria.
O Senhor não quer homens e mulheres que caminham atrás Dele com má vontade, sem ter no coração o vento da alegria. Vocês, que estão aqui na Praça, pergunto a vocês – cada um responda a si mesmo – vocês têm no coração o vento da alegria? Cada um se pergunte: “Eu tenho dentro de mim, no coração, o vento da alegria?”. Jesus quer pessoas que experimentaram que estar com Ele dá uma felicidade imensa, que se pode renovar todos os dias na vida. Um discípulo do Reino de Deus que não seja alegre não evangeliza este mundo, é um triste. Torna-se pregadores de Jesus não aperfeiçoando as armas da retórica: você pode falar, falar, falar, mas se não tem algo mais… Como se torna pregador de Jesus? Protegendo nos olhos o brilho da verdadeira felicidade. Vemos tantos cristãos, também entre nós, que com os olhos transmitem a alegria da fé: com os olhos!
Por este motivo o cristão – como a Virgem Maria – protege a chama do seu enamoramento: enamorados de Jesus. Certo, há provações na vida, há momento em que é preciso seguir adiante apesar do frio e dos ventos contrários, apesar de tantas amarguras. Porém os cristãos conhecem o caminho que conduz àquele fogo sagrado que acendeu neles uma vez para sempre.
Mas por favor, recomendo: não demos ouvido às pessoas desiludidas e infelizes; não escutemos quem recomenda cinicamente para não cultivar esperança na vida; não confiemos em quem apaga logo que surge todo entusiasmo dizendo que nenhuma empresa vale o sacrifício de toda uma vida; não escutemos os “velhos” de coração que sufocam a euforia juvenil. Busquemos os velhos que têm os olhos brilhantes de esperança! Cultivemos, em vez disso, sãs utopias: Deus nos quer capazes de sonhar como Ele e com Ele, enquanto caminhamos bem atentos à realidade. Sonhar um mundo diferente. E se um sonho se apaga, tornar a sonhá-lo, indo com esperança à memória das origens, aquelas brasas que, talvez depois de uma vida não tão boa, estão escondidos sob as cinzas do primeiro encontro com Jesus.
Eis, portanto, uma dinâmica fundamental da vida cristã: recordar-se de Jesus. Paulo dizia ao seu discípulo: “Recorda-te de Jesus Cristo” (2 Tm 2, 8); este o conselho do grande São Paulo: “Recorda-te de Jesus Cristo”. Recordar-se de Jesus, do fogo do amor com que um dia concebemos a nossa vida como um projeto de bem e reavivar com esta chama a nossa esperança.