Homilia

Após rezar pelas vítimas da covid-19, Papa diz: Não há fé sem liberdade

Na Missa desta terça-feira, 5, o Pontífice pensou naqueles que morreram por causa do coronavírus; na homilia, afirmou que, sem liberdade, homens e mulheres não podem caminhar rumo a Jesus

Da redação, com Vatican News

Papa durante adoração na Capela da Casa Santa Marta/ Foto: Vatican Media

Na manhã desta terça-feira, 5, da IV Semana da Páscoa, o Papa Francisco presidiu a Missa na Casa Santa Marta, no Vaticano. Na introdução, dirigiu seu pensamento àqueles que morreram por causa do novo coronavírus: “Rezemos hoje pelos defuntos que morreram por causa da pandemia. Morreram sozinhos, morreram sem a carícia de seus entes queridos, muitos deles, nem mesmo com o funeral. Que o Senhor os receba na glória”.

Na homilia, o Santo Padre comentou o Evangelho do dia (Jo 10,22-30) em que os judeus pedem a Jesus para dizer abertamente se Ele é o Cristo. Mas o Senhor responde: “Já vo-lo disse, mas vós não acreditais. As obras que eu faço em nome do meu Pai dão testemunho de mim; vós, porém, não acreditais, porque não sois das minhas ovelhas”. Isso – disse o Pontífice – suscita uma dúvida: eu creio? O que me detém diante da porta que é Jesus?.

“Há atitudes prévias à confissão de Jesus. Também para nós, que estamos no rebanho de Jesus. São como ‘antipatias prévias’, que não nos deixam seguir adiante no conhecimento de Jesus”, destacou o Pontífice. O primeiro obstáculo elencado pelo Papa é a riqueza: “Também muitos de nós, que entramos pela porta do Senhor, depois nos detemos e não seguimos adiante porque somos aprisionados nas riquezas. Jesus foi duro com as riquezas porque são um impedimento para seguir adiante. Mas devemos cair no pauperismo? Não. Mas não ser escravos das riquezas, não viver para as riquezas, porque as riquezas são um senhor, são o senhor deste mundo e não podemos servir a dois senhores. E as riquezas nos detêm”.

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Outra coisa que impede de seguir adiante no conhecimento de Jesus, na pertença a Jesus, disse Francisco, é a rigidez: a rigidez de coração. Também a rigidez na interpretação a Lei. “Jesus reprende os fariseus, os doutores da Lei por essa rigidez. Que não é fidelidade: a fidelidade é sempre um dom a Deus; a rigidez é uma segurança para si mesmo”.

O Santo Padre contou um episódio: uma senhora que tinha participado de um matrimônio sábado à tarde perguntou-lhe se valia como Missa dominical, mas as leituras eram diferentes e temia ter caído em pecado mortal, porque tinha ido a “uma Missa que não era verdadeira, porque as Leituras não eram verdadeiras”. “Aquela senhora pertencia a um movimento eclesial… Rigidez. Isso nos distancia da sabedoria de Jesus, da sabedoria de Jesus; e lhe tira a liberdade. E muitos pastores aumentam esta rigidez nas almas dos fiéis, e essa rigidez não nos deixa entrar pela porta de Jesus.”

O Papa descreveu outro impedimento: a preguiça. Aquele cansaço que “nos tira a vontade de seguir adiante”, e “leva você à tepidez e lhe faz tornar-se morno. A preguiça é outra coisa que nos impede de seguir adiante”. Outra atitude ruim é o clericalismo, porque “se coloca no lugar de Jesus”. “Isso é assim e assim e se você não faz assim não pode entrar”. Um clericalismo que tira a liberdade dos fiéis. “É uma doença, esta; muito ruim, na Igreja: a atitude clericalista”.

Outra coisa que impede homens e mulheres de seguir adiante no conhecimento de Jesus “é o espírito mundano. Quando a observância da fé, a prática da fé acaba em mundanismo. E tudo é mundano. Pensemos na celebração de alguns sacramentos em algumas paroquias: quanto mundanismo há ali! E não se entende bem a graça, a presença de Jesus”.

Em todos essas atitudes – afirmou o Papa – falta a liberdade. “E não se pode seguir Jesus sem liberdade”. É claro, às vezes a liberdade vai além e alguém escorrega” – observou Francisco –, mas pior é escorregar antes de começar a caminhar rumo a Jesus. Ao término da homilia o Papa pediu ao Senhor que ilumine a humanidade para que veja dentro de si se existe a liberdade de caminhar rumo a Jesus e se tornar ovelha de seu rebanho.

Íntegra da homilia

Jesus estava no templo, a festa da Páscoa estava próxima (conf. Jo 10,22-30). Também os judeus, naquele tempo, “Rodeavam-no e disseram: ‘Até quando nos deixarás em dúvida? Se tu és o Messias, dize-nos abertamente’” (vers. 24). Eles faziam perder a paciência e com tanta mansidão  “Jesus respondeu: “Já vo-lo disse, mas vós não acreditais” (vers. 25). Continuavam dizendo: “Mas és tu? És tu?” – “Sim, o disse, mas não acreditais!” “Porém, não acreditais, porque nãos sois das minhas ovelhas” (vers. 26). E isso, talvez, nos suscite uma dúvida: eu creio e faço parte das ovelhas de Jesus. Mas se Jesus nos dissesse: “Vós não podeis acreditar porque não fazeis parte”: existe uma fé prévia, ao encontro com Jesus? Qual é este fazer parte da fé de Jesus? O que é que me detém diante da porta que é Jesus?

Há atitudes prévias à confissão de Jesus. Também para nós, que estamos no rebanho de Jesus. São como “antipatias prévia”, que não nos deixam seguir adiante no conhecimento do Senhor. A primeira de todas são as riquezas. Também muitos de nós, que entramos pela porta do Senhor, depois nos detemos e não seguimos adiante porque somos aprisionados nas riquezas. O Senhor foi duro, com as riquezas: foi muito duro, muito duro. A ponto de dizer que era mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no reino dos céus (conf. Mt 19,24) É duro, isso. As riquezas são um impedimento para seguir adiante. Mas devemos cair no pauperismo? Não. Mas não ser escravos das riquezas, não viver para as riquezas, porque as riquezas são um senhor, são o senhor deste mundo e não podemos servir a dois senhores (conf. (Lc 16,13). E as riquezas nos detêm.

Outra coisa que impede de seguir adiante no conhecimento de Jesus, na pertença a Jesus, é a rigidez: a rigidez de coração. Também a rigidez na interpretação da Lei. Jesus repreende os fariseus, os doutores da Lei por esta rigidez (conf. Mt 23,1-36). Que não é fidelidade: a fidelidade é sempre um dom a Deus; a rigidez é uma segurança para mim mesmo. Lembro-me uma vez que entrava na paróquia e uma senhora – uma boa senhora – se aproximou de mim e disse: “Padre, um conselho…” “Diga…” – “Na semana passada, sábado, não ontem, sábado retrasado, fomos em família a um matrimônio: era com a Missa. Era sábado à tarde, e pensamos que com esta Missa tínhamos cumprido o preceito dominical. Mas depois, voltando para casa, pensei que as Leituras daquela Missa não eram as do domingo. E assim me dei conta de que estou em pecado mortal, porque no domingo não fui porque fui no sábado, mas a uma Missa que não era verdadeira, porque as Leituras não eram verdadeiras”. Aquela rigidez… e aquela senhora pertencia a um movimento eclesial… Rigidez. Isso nos distancia da sabedoria de Jesus, da sabedoria de Jesus; lhe tira a liberdade. E muitos pastores aumentam essa rigidez nas almas dos fiéis, e essa rigidez não deixa entrar pela porta de Jesus (conf. Jo 10,7). É mais importante observar a Lei como está escrita ou como eu a interpreto, que a liberdade de caminhar adiante seguindo Jesus?

Outra coisa que não nos deixa seguir adiante no conhecimento de Jesus é a preguiça. Aquele cansaço… pensemos naquele homem da piscina: 38 anos ali (conf. Jo 5,1-9). A preguiça. Tira-nos a vontade de seguir adiante e tudo é “sim, mas… não, agora não, não, mas…” que leva você à tepidez e o faz morno. A preguiça… é outra coisa que nos impede de seguir adiante.

Outra que é muito ruim é a atitude clericalista. O clericalismo se coloca no lugar de Jesus. Diz: “Não, isso deve ser assim, assim, assim…” – “Mas, o Mestre…” – “Deixa quieto o Mestre: isso é assim, assim, assim, e se não faz assim, assim, assim você não pode entrar”. Um clericalismo que tira a liberdade da fé dos fiéis. É uma doença, esta: muito ruim, na Igreja: a atitude clericalista.

Depois, outra coisa que nos impede de seguir adiante, de entrar para conhecer Jesus e confessar Jesus é o espírito mundano. Quando a observância da fé, a prática da fé acaba em mundanismo. E tudo é mundano. Pensemos na celebração de alguns sacramentos em algumas paróquias: quanto mundanismo há ali! E não se entende bem a graça da presença de Jesus.

Essas são as coisas que nos impedem de fazer parte das ovelhas de Jesus.

Somos “ovelhas” (no seguimento) de todas estas coisas: das riquezas, da preguiça, da rigidez, do mundanismo, do clericalismo, de modalidades, de ideologias, de formas de vida. Falta a liberdade. E não se pode seguir Jesus sem liberdade. “Mas, às vezes, a liberdade vai além e alguém escorrega”: sim, é verdade. É verdade. Podemos escorregar caminhando em liberdade. Mas pior é escorregar antes de caminhar, com estas coisas que impedem começar a caminhar.

Que o Senhor nos ilumine para ver dentro de nós se existe a liberdade de passar pela porta que é Jesus e ir além Jesus para tornar-nos rebanho, para tornar-nos ovelhas de seu rebanho.

Comunhão e adoração

Ao término da liturgia eucarística, o Papa convidou a fazer a Comunhão espiritual com a seguinte oração: “Meu Jesus, eu creio que estais presente no Santíssimo Sacramento do Altar. Amo-vos sobre todas as coisas, e minha alma suspira por Vós. Mas, como não posso receber-Vos agora no Santíssimo Sacramento, vinde, ao menos espiritualmente, a meu coração. Abraço-me convosco como se já estivésseis comigo: uno-me Convosco inteiramente. Ah! não permitais que torne a separar-me de Vós!”.

Francisco terminou a celebração com adoração e a bênção eucarística. Antes de deixar a Capela dedicada ao Espírito Santo, foi entoada a antífona mariana “Regina caeli”, cantada no tempo pascal: “Rainha dos céus, alegrai-vos. Aleluia! Porque Aquele que merecestes trazer em vosso seio. Aleluia! Ressuscitou como disse. Aleluia! Rogai por nós a Deus. Aleluia! D./ Alegrai-vos e exultai, ó Virgem Maria. Aleluia! C./ Porque o Senhor ressuscitou, verdadeiramente. Aleluia!”.

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