Em especial sobre o Oriente Médio, cristãos sofrem com extremismo religioso. Quem sofreu de perto atrocidades do Estado Islâmico deixa seu relato
Cristiane Henrique
Correspondente na Terra Santa
Mais de 200 milhões de cristãos, em todo o mundo, estão sendo perseguidos por causa de sua fé, assim afirma a instituição “Ajude à Igreja que Sofre” (AIS), organismo ligado à Santa Sé. Segundo estimativas, o número tende a aumentar.
Em entrevista ao Jornalismo Canção Nova, a presidente da AIS em Portugal, Catarina Martins Bettencourt, mencionou um fato importante: o afogamento de, pelo menos, 12 cristãos imigrantes que seguiam ilegalmente da Líbia para a costa italiana em um barco (em abril de 2015). Segundo testemunhas, uma discussão religiosa teria sido a motivação para que os cristãos fossem jogados ao mar.
Catarina diz que este fenômeno tem nome: extremismo religioso, algo que tem se espalhado também no Ocidente. Jovens, na sua grande maioria europeus, têm se unido ao exército de combatentes do Estado Islâmico, que proclamou seu califado em junho de 2014 e, desde então, vem promovendo uma série de atrocidades contra a população da região onde atua.
Testemunho
Muitas pessoas estão sofrendo devido às ações violentas do grupo. Uma delas é a jovem Mina, que é do Iraque, mas hoje se encontra em um campo de refugiados da Jordânia. Ela conta o drama que viveu nas mãos dos combatentes desde que foi expulsa de sua casa.
Confira o breve relato:
“Estávamos no carro e um grupo do Estado Islâmico nos parou. Eles pegaram meu marido, que se chama Abu Rita, e nos levaram para uma caravana. Tínhamos pouco dinheiro, um telefone, um relógio e medicamentos para as meninas. Eles levaram tudo e nos disseram: ‘Vocês cristãos merecem somente ser trucidados’. Nós imploramos a eles e eles nos pouparam. Ficamos até o dia 6 de agosto, quando eles atacaram novamente: um tiro de morteiro caiu em um complexo residencial, duas crianças de 6 e 9 anos morreram e também uma jovem de 30. Houve confrontos entre as forças curdas e o Estado Islâmico. Então, nós tivemos de fugir de novo. Durante a noite, ouvimos o alto-falante que dizia: ‘Vocês cristãos devem escolher entre o Islã, serem mortos, pagar tributo ou deixar as suas casas. Porém, estamos firmes em nossa fé em Jesus Cristo, por isso deixamos tudo e fomos embora levando nossas roupas e algumas coisas”.
Em 29 de junho de 2014, o líder do Estado Islâmico – um dos grupos extremistas que cometem assassinatos em massa –, Abu Bark Al-Baghdadi, foi proclamado califa da região dominada pelo grupo, entre o Iraque e a Síria. O grupo reivindica o domínio sobre um vasto território entre esses dois países, que já possuem um longo histórico de guerras e conflitos.
Catarina Martins recorda ainda o importante papel da Igreja nas regiões onde essas perseguições têm ocorrido, pois é um local de acolhimento e refúgio não só para os cristãos, mas para toda a população que tem sofrido essas atrocidades. Ela comentou ainda sobre o silêncio da comunidade internacional, uma “omissão” que pode fazer desaparecer os cristãos nessas terras do Oriente Médio, pois, cada dia mais, o número de imigrantes tem aumentado e a possibilidade de retorno fica cada vez mais difícil.
Situação na Terra Santa
A perseguição aos cristãos não chegou claramente à Terra Santa. O alto número de migração se deve ao fator Israel e Palestina. Na região da Cisjordânia, a grande maioria é de religião Islâmica, mas o culto religioso encontra espaço para a liberdade com procissões realizadas pelas cidades, e as paróquias árabes seguem a vida com suas atividades.
A ameaça de uma possível extinção, porém, também existe, pois as condições econômicas se tornam cada vez mais difíceis. Uma minoria cristã está presente na faixa de Gaza, um número que não passa de 1500 fiéis entre cristãos de rito latino e rito ortodoxo, que buscam viver sua fé numa realidade de guerras constantes e com pouca perspectiva de desenvolvimento.
A equipe do Jornalismo Canção Nova esteve, algumas vezes, nessas regiões e coletou entrevistas sobre as realidades vividas neste pequeno trecho de terra. Quando se fala de Faixa de Gaza, logo vêm à mente guerras, combates e divisões. Mas como as pessoas de lá vivem essa realidade? Confira dois testemunhos:
Hatem nasceu em Gaza e fez um apelo à Comunidade Internacional: “A Comunidade Internacional deve saber que Gaza está completamente destruída. O povo morre lentamente. Precisamos de ajuda para a população de Gaza. A situação dos cristãos é ainda mais difícil, não podemos trabalhar e não podemos sair. Nós, cristãos de Gaza, precisamos de ajuda, de assistência e trabalho. Deve-se dar oportunidade de trabalho aos jovens, pois nós, os pais, não temos trabalho, não temos salário, e isso não é justo”.
Dalia, uma jovem de 18 anos, também relata seu drama: “Depois de terminar meus estudos universitários, permaneci em casa, fiz somente quatro meses de experiência junto a um instituto de crédito. Quando saio de casa, tenho medo. Se vou de um lugar a outro, tenho medo de não conseguir voltar para casa. Nas ruas, vemos mulheres com véu; em algumas regiões, as mulheres sem véu não são aceitas. Aqui, existem pessoas que não sabem nem o que é ser cristão. É muito difícil! Vivo na esperança de um dia deixar Gaza. Eu penso que essa situação será pior daqui a 10 anos. A mentalidade das pessoas está em constante declínio, em direção ao extremismo. Não existe vida para os adultos. Agora, imagine a vida para os jovens! Se nós, como cristãos, quisermos viver com segurança em Gaza, devemos permanecer dentro de casa. Sempre escutamos dizer que os jovens correm risco se não estiverem em casa. Por tanto só deixamos nossas casas em companhia da nossa família.”