RIBOFLAVINA

RTD: encontro nacional conscientiza causas e efeitos de doença rara

Especialista explica como uma doença rara, que atinge atualmente 300 pessoas no mundo, precisa ser debatida e estudada para conscientizar a sociedade quanto à sua complexidade

Thiago Coutinho,
Da redação

Encontro nacional desta segunda-feira, 15, discutirá a Deficiência do Transportador de Riboflavina (RTD) / Foto: DCStudio por Freepik

Nesta segunda-feira, 15, profissionais da área de saúde, estudantes, pacientes e familiares se reúnem para o I Encontro Nacional de RTD, sigla para Deficiência do Transportador de Riboflavina. Trata-se de uma doença raríssima — estimativas da fundação estadunidense Cure RTD Foundation apontam que existem 300 pessoas que sofrem desta doença no mundo todo, nove delas no Brasil.

“Deficiência do Transportador de Riboflavina é uma doença rara, de origem genética, que pode ser classificada como um erro inato do metabolismo”, explica Rodrigo Fock, médico especialista em Genética Médica pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). “Existe uma alteração em dois possíveis genes, o CLC52A2 e o CLC52A3, que são genes que farão este transporte da riboflavina, uma substância importante para o nosso organismo, para dentro da célula. Quando estes genes estão alterados, este transporte não acontece corretamente e a célula não produz energia, uma de suas funções fundamentais. E esta falta de produção energética leva às característica clínicas da doença”, acrescenta.

Ainda de acordo com Flock, os primeiros sinais da moléstia podem se manifestar na infância. Alguns casos, inclusive, já apresentam sinais nos primeiros meses de vida. “Como, por exemplo, apresentar uma fraqueza muscular. Mas alguns indivíduos só vão desenvolver sintomas mais graves da doença na vida adulta. Inclusive, há relatos de indivíduos em que se chega ao diagnóstico da doença na quarta ou quinta década de vida”, detalha o médico.

Padre Márlon Múcio é portador da Deficiência do Transportador de Riboflavina (RTD) / Foto: Arquivo Pessoal

Padre Márlon Múcio foi um desses casos de descoberta tardia da doença — embora os sinais tenham se manifestado já na sua infância, mas os especialistas não conseguiam diagnosticar corretamente o que atingia o padre.

“Os primeiros sinais eu tive aos 7 anos quando fiquei surdo dos dois ouvidos e tive que passar pela minha primeira cirurgia — e já foram 14 até agora. Só neste ano, 9. Depois, aos 14 anos, eu tinha dificuldade de engolir e mastigar. Mastigar me cansava. Eu não queria mais comer. Eu tenho uma forma branda da RTD. Ela foi se manifestando ao longo da minha vida lentamente, com vários sinais, mas ninguém sabia o que eu tinha. Nem mesmo os médicos”, conta o padre Márlon.

As perdas causadas pela doença

Além da musculatura respiratória, a RTD também afeta a deglutição — ou seja, atinge o simples ato de engolir alimentos. “E isso pode levar à broncoaspiração [entrada de substâncias pouco usuais, como alimentos e saliva, na via respiratória]. Ou seja, este indivíduo acaba engasgando e isso pode levar a complicações pulmonares, como uma pneumonia aspirativa, que leva líquido ou comida para o pulmão”, detalha Fock.

Por conta deste pormenor, muitas vezes o paciente precisa de um suporte de gastrostomia, ou seja, um tubo que faz uma ligação direta com o estômago por meio de um tubo que facilita a ingestão de alimentos.

Ocorre ainda a fraqueza muscular, que apresenta seus primeiros sinais na infância e, na vida adulta, leva a piores progressivas. De acordo com especialista, os portadores da RTD necessitam de um suporte para se locomover (andadores ou até cadeira de rodas).

“Essa fraqueza também pode atingir a face. Como se esses músculos tivessem caído”, conta-nos Fock. “Outro sintoma importante desta doença pode ser a perda auditiva. Às vezes, especialmente nos casos em que o diagnóstico é feito na vida adulta, já percebemos que existia uma história de perda auditiva precoce. Então, crianças que apresentam dificuldade auditiva e que, posteriormente, começam a falar sobre fraqueza, podem ser sinais da RTD”.

Segundo Fock, a língua desses pacientes tem um movimento involuntário, que os médicos chamam de fasciculação. “É como se a língua estivesse o tempo todo tremendo. Isso é uma característica que observamos nestes pacientes”.

O tratamento

Além do uso da Riboflavina para combater a doença, os pacientes precisam de outras terapias de estimulação, como fisioterapia, fonoterapia e terapia ocupacional. “Elas são extremamente importantes”, ressalta Fock. “Elas ajudarão a garantir qualidade de vida a estes indivíduos e nunca poderão ser ignoradas”, pondera.

A importância de associações e encontros

Para o médico, é muito importante que encontros como este, organizado pelo Instituto Vidas Raras, divulguem doenças como esta, que são raras. “Esses movimentos são muito importantes, um grande auxílio aos portadores da doença e os profissionais de saúde”, afirma.

É por meio destas associações que a busca por recursos e profissionais que podem se especializar para atender estes pacientes. “As associações de forma geral, incluindo a RTD Foundation, fomentam a possibilidade de recursos para ajudar esses pacientes, ajudam pessoas que não tivessem este diagnóstico cheguem a ele, e os profissionais, que não têm este conhecimento, pois se trata de uma doença rara”, estabelece.

Rosely Maria Cizotti, diretora de comunicação do Instituto Vidas Raras, recorda que o número de pacientes no Brasil (atualmente, são nove) pode ser muito maior. Como há pouca informação disponível acerca da doença, é muito provável que haja mais pessoas que sofram, ou tenham sofrido, de RTD e não sabem.

“É impossível que haja apenas estes pacientes. Como se trata de uma doença muito agressiva, provavelmente eles morrem antes do diagnóstico”, lamenta Rosely. “Ou estão numa cama sendo tratados com algo que ninguém sabe. O intuito deste encontro é gerar interação, representatividade, o diagnóstico precoce e fortalecer o vínculo entre os pacientes, para que possamos lutar pela cura da RTD”, diz.

“Sem conscientização não há informação, pesquisas, terapias mais eficientes e não se chegará à cura”, emenda padre Márlon. “Tenho uma doença rara, mas a minha doença não tem a mim. O nosso diagnóstico não nos define e com a graça de Deus e a nossa força de vontade (mesmo que faltem forças físicas, como é o caso de nós, pacientes da RTD), podemos mudar a nossa história e as outras histórias. Aprendi a fazer dos limões que a vida dá uma limonada”, finaliza o religioso.

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