Coordenador nacional da Pastoral Carcerária também aponta soluções e relata testemunhos marcantes em seus 25 anos de trabalho nos presídios
Luciane Marins
Da redação
Os bispos do Brasil se manifestaram na última semana sobre uma prática aplicada na maioria dos presídios do país: a revista vexatória. A CNBB considera esta prática “vergonhosa e desumana”.
Sob o argumento de evitar que objetos ilícitos entrem nos presídios, as pessoas que visitam os presos são submetidas a procedimentos humilhantes como o desnudamento, a manipulação de suas partes íntimas por agentes do Estado e outras práticas degradantes.
Sobre esse tema, o Canção Nova em Foco desta semana conversa com o coordenador nacional da Pastoral Carcerária, padre Valdir João Silveira. Ele fala ainda sobre o que considera ser o maior desafio do sistema prisional no país, explica como os agentes da pastoral atuam junto aos presidiários e conta experiências emocionantes de perdão e solidariedade que já presenciou em 25 anos atuando nesse trabalho.
Há mais de 8 anos, a Pastoral Carcerária recebe cartas de presos e familiares que desabafam suas angústias diante da revista vexatória. O padre conta que há anos a pastoral “luta” contra esta prática.
“Com isso, muitas mães não visitam seus filhos nem maridos. Crianças passam por essa revista também, muitos pais e mães presos não querem o contato de sua família devido a essa revista terrível.”
Ouça íntegra da entrevista
Tanto a nota da CNBB como o coordenador nacional da Pastoral destacam a comprovação de que a maioria dos objetos ilícitos encontrados nos presídios não entra com quem visita os presos. Como exemplo, citam os estados de Goiás e Espírito Santo que já aboliram essa prática e não houve alteração na quantidade de materiais proibidos encontrados com os presos. Como solução, o padre e a CNBB apontam o uso de detectores de metais e scanners corporais.
“É uma agressão muito grande. A punição é estendida ao familiar; quem cometeu crime está preso, mas os familiares são punidos pela revista vexatória”, lamenta o padre.
O Sistema Judiciário é apontado por padre Valdir como o principal desafio do sistema prisional brasileiro. “Tem estados que chegam a 70% de presos provisórios, presos aguardando por anos a primeira audiência no fórum.”
Pastoral Carcerária
Os agentes da Pastoral atuam diretamente nos presídios, visitando os encarcerados. Padre Valdir explica que a primeira tarefa desses voluntários é estar junto ao preso e anunciar a Palavra de Deus.
Em toda diocese do Brasil há uma equipe que trabalha com a pastoral. Além das visitas, os agentes realizam celebrações e encontros de reflexões com presos e atuam em parceria com os poderes públicos.
“O agente faz um curso, preparação, tem encontros periódicos de atualização e tem que pertencer a uma comunidade paroquial.”
Padre Valdir explica que para o preso não basta ter seus direitos jurídicos respeitados. Ele acredita que a maioria destas pessoas já sofreu muito e precisa de um acompanhamento espiritual para superar a dor, a vingança, o ódio e, enfim, ter liberdade espiritual para, mesmo presa, continuar a viver em paz.
Experiências
Em 25 anos de dedicação aos encarcerados, padre Valdir conta que já presenciou muitas histórias marcantes de solidariedade, perdão e pedidos de confissão. Um desses fatos o afetou pessoalmente por se tratar do assassinato de um amigo pessoal (ouça outro relato no áudio).
“A viúva tinha 3 crianças, ela queria visitar o assassino do seu marido. Eu a levei até a cadeia, falei para o assassino: a esposa quer falar com você. Ele ficou meio apavorado. Quando os dois se encontraram, a primeira pergunta da viúva foi: ‘porque mataste meu marido’? Ele começou a chorar, ela começou a chorar, de repente os dois se abraçaram e choraram alto, foi um abraço de mais de vinte minutos e choro alto, depois, uma longa conversa. Quando saímos da cadeia ela disse: ‘padre, agora enterrei meu marido, a vida continua, eu precisava desse encontro para que minha vida continuasse’”.