Dom Walmor Azevedo afirma que a Amazônia pode ajudar a Igreja de Cristo na exigente tarefa de percorrer caminhos novos e encontrar novas respostas
Dom Walmor Oliveira de Azevedo*
Presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)
Alinhados com os sonhos de Francisco
“Sonho com uma Amazônia que lute pelos direitos dos mais pobres, dos povos nativos, dos últimos, de modo que a sua voz seja ouvida e sua dignidade promovida. Sonho com uma Amazônia que preserve a riqueza cultural que a caracteriza e na qual brilha de maneira tão variada a beleza humana. Sonho com uma Amazônia que guarde zelosamente a sedutora beleza natural que a adorna, a vida transbordante que enche os seus rios e as suas florestas. Sonho com comunidades cristãs capazes de se devotar e encarnar de tal modo na Amazônia, que deem à Igreja rostos novos com traços amazônicos”, é o que partilha, sábia e corajosamente, o Papa Francisco na Exortação Apostólica Querida Amazônia.
Fruto esperançoso do abençoado Sínodo dos Bispos para a Amazônia, a Exortação Apostólica, com sua linguagem sapiencial, poética e profética, tem força de convocação: todos são desafiados a seguir o percurso indicado em suas linhas, para promover a vida e ser fiel à missão de toda a Igreja. Cada pessoa, especialmente os evangelizadores, se comprometa a cultivar um novo modo de viver no horizonte intocável do Evangelho de Jesus Cristo. Assim a Igreja inteira assume o compromisso de dedicar-se, sempre mais, à Amazônia, que se apresenta aos olhos do mundo com todo o seu mistério, o seu esplendor e o seu drama.
Dedicar-se à Amazônia exige abertura para o diálogo, escutando especialmente os que mais entendem da realidade desse território, os povos amazônicos e, assim, ajudar de maneira mais qualificada os pobres, excluídos, indígenas, quilombolas, ribeirinhos e migrantes. “Deus queira que toda a Igreja se deixe enriquecer e interpelar por este trabalho; que os pastores, os consagrados, as consagradas e os fiéis leigos da Amazônia se empenhem na sua realização e que, de alguma forma, possa inspirar todas as pessoas de boa vontade”, eis o primeiro sonho do Papa Francisco apresentado na Exortação Apostólica Querida Amazônia.
A Exortação Apostólica, além de indicar a necessidade do cuidado com a Amazônia, orienta a Igreja e o mundo a aprender com o próprio território amazônico, escola de experiências, sabedorias e lições, para mudar dinâmicas e possibilitar vivências coerentes com os ensinamentos de Jesus Cristo. Particularmente, a Amazônia pode ajudar a Igreja de Cristo na exigente tarefa de percorrer caminhos novos e encontrar novas respostas. Consequentemente, contribuir, sempre mais, para que o mundo contemporâneo se aproxime dos valores atemporais do Evangelho. Na Exortação Apostólica, o Papa Francisco convida a Igreja a sonhar. E os sonhos partilhados pelo Santo Padre, se acolhidos como meta e lição, terão propriedade para se tornar realidade na Igreja, no território da Amazônia e em todos os lugares. São quatro sonhos indicados pelo Papa Francisco: um sonho social, um sonho cultural, um sonho ecológico e um sonho eclesial.
No coração pulsante de cada uma das aspirações indicadas na Exortação Apostólica estão interpelações norteadoras. Sonhos que, acolhidos como se espera, reconfiguram juízos e escolhas, fortalecendo a Igreja. Desmontarão, assim, o que já não tem força missionária e reavivará a nova profecia – a ser anunciada na voz da Igreja – para interpelar o mundo a estar no horizonte e a caminho do Reino de Deus, possibilitando novas lógicas de organização e governos, mais fraternidade, justiça e paz para todas as sociedades. Esse caminho leva ao verdadeiro desenvolvimento integral, com novos hábitos, práticas e lógicas.
O Papa Francisco, em seu sonho social, detalha uma Amazônia que deve integrar e promover todos os seus habitantes, para que possam consolidar o “bem viver”, com a força de um grito profético e um árduo empenho dedicado aos mais pobres. Para isso, são necessárias atitudes que façam frente às injustiças e aos crimes cometidos, aos que ferem o meio ambiente e seus povos. No âmbito cultural, o Papa Francisco sonha com ações que busquem cuidar das tradições. Nas raízes do povo amazônico está a força para se contrapor “à visão consumista do ser humano, incentivada pelos mecanismos da economia globalizada, que tende a homogeneizar as culturas e a debilitar a imensa variedade cultural, que é um tesouro da humanidade”.
O sonho ecológico do Papa trata da oportunidade para se conquistar a libertação das escravidões a partir de nova aprendizagem. Se o cuidado com as pessoas é inseparável da dedicação aos ecossistemas, isso se torna ainda mais evidente na realidade amazônica. Sobre o sonho eclesial, o Papa indica o desafio da Igreja na busca de novos caminhos, por sábia e profética inculturação, do ministério e na liturgia, assegurando serviços pródigos a todos. A Igreja deve valorizar sempre mais a religiosidade dos povos e procurar, continuamente, novos modos de servir, para que todos sejam contemplados com os dons dos sacramentos, especialmente a Eucaristia. O sacerdócio seja capaz de oferecer novas respostas e a Igreja se configure, cada vez mais, como Casa da Palavra de Deus, a partir da força vivificante das mulheres, com práticas criativas, inovadoras, autênticas respostas às demandas de evangelização.
No coração de cada pessoa esteja a força interpelante dos sonhos partilhados pelo Papa Francisco e, assim, aprendidas as lições da Exortação Apostólica Querida Amazônia.
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*O Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte, Dom Walmor Oliveira de Azevedo, é doutor em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Gregoriana (Roma, Itália) e mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico (Roma, Itália) e presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), entre os anos de 2019 e 2022.