“As relações do Vaticano com o mundo islâmico devem ser reiniciadas do zero, porque os muçulmanos insistem em interpretar erradamente os recentes comentários do Papa Bento XVI sobre a religião deles”, disse o principal cardeal alemão em artigo nesta quarta-feira (04/10). Karl Lehmann, presidente da Conferência Alemã de Bispos Católicos, acusou os críticos muçulmanos de moverem uma campanha contra o Papa, e disse que o Pontífice não tem por que se desculpar.
Os comentários do cardeal Lehmann parecem ter sido motivados por uma decisão da Organização da Conferência Islâmica (OIC), que reúne 56 países, de exigir que Bento XVI se retrate. O apelo foi feito um dia depois de o Papa receber embaixadores muçulmanos no Vaticano e repetir que lamenta o mal-entendido em torno do seu discurso de 12 de setembro, no qual citou um imperador bizantino do século 14, segundo quem o Islã só havia trazido coisas ruins e violentas ao mundo.
"Essas ameaças abertas ou veladas precisam parar", disse o cardeal no semanário da diocese de Mogúncia. "Obviamente temos de começar da estaca zero, porque não estamos falando aqui do importante conteúdo de um diálogo necessário, mas das exigências fundamentais para que tal diálogo tenha sucesso."
"Há liberdade de religião e de expressão na nossa civilização. O Papa também pode ser criticado. Mas há regras elementares que valem para contatos mútuos justos e factuais e com declarações claras", acrescentou Lehmann. "Não se pode repetir constantemente mal-entendidos completamente infundados quando os textos são tão claros."
O discurso de Bento XVI, que no passado já havia se manifestado contra a adesão da Turquia à UE por causa da cultura islâmica do país, distanciou ainda mais as duas religiões. De nada adiantou o Papa dizer várias vezes nas últimas semanas que discorda da frase do imperador bizantino. Alguns muçulmanos o acusam de destruir as pontes construídas durante anos por seu antecessor. "Quando João Paulo II era o Papa, não havia problema para os muçulmanos", disse o ativista turco Cemal Usak. "O Papa Bento XVI pode não gostar do Islã, mas tem de respeitar os muçulmanos."
Lehmman disse no artigo que o discurso do Papa, feito na sua Baviera natal, inicialmente não provocou protestos, nem mesmo perguntas de jornalistas durante a entrevista coletiva que o cardeal concedeu naquela semana. "Só alguns dias depois começou uma campanha vinda de fora", afirmou.