Excelentíssimos senhores bispos, queridos irmãos e irmãs em Nosso Senhor Jesus Cristo, a liturgia de hoje nos convida para refletir sobre o tema do pão, já iniciado na celebração de ontem. O pão, dom de Deus, consubstanciado em Jesus Cristo, que colhemos pela fé, é o pão Eucarístico que recebemos na comunhão e o pão nosso de cada dia.
Lendo o capítulo 6 do Evangelho de São João, damo-nos conta de que Jesus é, realmente, o pão de Deus, no qual nós só podemos chegar se o Pai nos abrir o caminho. “Ninguém pode vir a mim se o Pai não o atrai” (João 6,44). Nós nos sentimos alegres em nos unir com todos que professam a sua fé em Jesus Cristo. Porém, sentimos que o Evangelho de São João nos convida para irmos mais longe. De fato, percebemos que Jesus fala do pão, não somente de maneira simbólica, mas de maneira bem real, como alimento. Antecipando-se à instituição da Eucaristia, Ele afirma, categoricamente: “Minha carne é verdadeiramente uma comida e o meu sangue, verdadeiramente uma bebida” (João 6,55).
Diante dos fariseus, escandalizados, que se retiram, Ele não reformula as suas expressões; antes, verificando que os próprios apóstolos estão incertos, desafia-os: “Vocês também querem ir embora?” (cf João 6, 67). Aqui, nós nos dissociamos de quem segue os exemplos dos fariseus. Imitando São Pedro, nós clamamos: “A quem iremos Senhor, só Tu tens palavras de vida eterna” (cf. João 6,68). Dissociamo-nos também daqueles que preferem o “sacramento da prosperidade” e trocam a Eucaristia por outros dons terrenos. Mas, ao lado do pão da fé e do pão da Eucaristia, é preciso cuidar também do pão nosso de cada dia. Depois do pecado de Adão, Deus lhe disse: “Comerás o pão com o suor do teu rosto” (Gênesis 3,19). Em outra oportunidade afirmou também: “O operário é digno de seu salário”. Então, o pão do céu e o pão da Eucaristia não dispensam o pão da terra. Na realidade, a busca do pão da terra afasta-nos do pão do céu, do pão Eucarístico. Vemos tantas pessoas que, embora batizadas, vivem longe de Deus e da Igreja; trabalhadores humildes, assoberbados pela necessidade de encontrar o pão de cada dia, esquecem-se de que Deus os convida para uma vida mais elevada. Vemos operários escravos dos horários, migrantes que caminham nas estradas do mundo buscando melhores condições de vida, mas, nos caminhos do êxodo (aspas), esquecem-se do seu relacionamento com Deus, que é princípio e fim de toda caminhada.
O que o Evangelho de hoje diz para nós bispos, pastores? O Cristo, pão de céu, certamente nos convida para viver profundamente a nossa fé e missão; convida-nos também para acolher o imperativo de Aparecida [referindo-se ao “Documento de Aparecida” de Bento XVI]: discípulos e missionários. Sejamos discípulos e missionários. Nós, em primeiro lugar, para, por meio de nosso exemplo, arrastarmos na mesma trilha os nossos presbíteros, o povo de Deus e todas as nossas dioceses.
O Cristo-Eucaristia nos convida para valorizar a nossa vocação de ministros desse grande mistério, que é o fundamental de nossa vocação e de nossa missão, convida-nos também para incentivar as nossas dioceses, os nossos presbíteros, a viverem da mesma forma em torno de Cristo.
Nesse momento, eu me recordo do que me dizia, há 40 anos, o meu padre espiritual um dia antes da minha ordenação: “Reze as suas missas como se fossem a primeira, como se fossem a última e como se fossem a única”. Deus nos conceda essa graça.
Para as nossas comunidades que, às vezes, vivem longe da Eucaristia, eu sinto que devemos facilitar as maneiras pelas quais o povo de Deus possa ter acesso à Comunhão Eucarística.
Diante do pão da Eucaristia, antes de qualquer coisa, como pastores, devemos nos sentir comprometidos com aquilo que foi afirmado em Aparecida e que aparece também em nossas diretrizes: a opção preferencial evangélica pelos pobres. Depois, queremos ser bons pastores, cuidar, sim, das ovelhas que estão em nossos apriscos, mas abrir os olhos também para mais longe, porque existem ovelhas que querem entrar no aprisco, embora não encontrem quem lhes abra as portas. Mesmo sendo um país de emigração, nós, aqui no Brasil, temos milhares de imigrantes que procuram inserir-se na nossa Igreja, mas, às vezes, não há quem lhes abra as portas. Devemos cuidar também daqueles que saíram do aprisco, urgidos pela necessidade e estão caminhando pelo deserto, ou melhor, pelas “estradas do êxodo”.
Hoje, o Brasil conta com cerca de 4 milhões de emigrantes e nós, Igreja de partida, somos co-responsáveis com as igrejas onde eles vivem. Às vezes, não nos damos conta dos problemas que vivem nossos filhos e filhas. Neste momento, ocorre-me um fato acontecido em Capa Rica, na praia de Lisboa há 4 anos. Estava participando de um encontro sobre emigração na Península Ibérica, representando o Brasil. Depois da celebração, encontramo-nos com um grupo de emigrantes, a maioria deles mineiros. Às vezes pensamos que todo emigrante faz um pé-de-meia, mas não é bem assim, pois, muitas vezes, encontram-se a curtir a amargura. Um dos participantes desse encontro me disse: “Senhor bispo, estou, aqui, angustiado, porque, em Minas Gerais, minha família espera que eu mande dinheiro para eles, mas, aqui, não encontro trabalho. Não tenho os papéis regularizados, e não os tenho porque não encontro trabalho. Assim, estou vivendo da caridade de meus companheiros. Estou rezando a Deus para conseguir os meios para voltar para casa”. O homem chorava como criança.
Queridos irmãos, no nosso zelo de pastores, olhemos para o nosso rebanho, para aqueles que estão fora [da Igreja], mas que gostariam de entrar. Olhemos também por aqueles que deixaram sua moradia e caminham pelos “caminhos do êxodo”. Peçamos a Jesus, o Bom Pastor, que nos ajude a sermos bons pastores e sermos, com Ele, construtores do Reino de Deus.