Amados irmãos no episcopado, prezados presbíteros e diáconos, queridos consagrados e consagradas, amados irmãos e irmãs que participam desta Eucaristia, neste Santuário de Dom Bosco, caros telespectadores e rádio-ouvintes, o tema central desta 48ª Assembleia Geral da CNBB, que estamos por encerrar: “Discípulos e servidores da Palavra de Deus e a missão da Igreja no mundo” recebe especial iluminação das leituras há pouco proclamadas.
São Lucas faz do discurso de Paulo, no areópago de Atenas, uma das expressões fulminantes de sua atividade missionária. O ponto de partida é a constatação dos fatos, mas o ponto de chegada é o anúncio explícito da salvação em Cristo ressuscitado e o consequente apelo à conversão. Judeu com os judeus, o apóstolo Paulo sabe fazer-se grego com os gregos, passa do ambiente fechado e restrito da sinagoga à praça pública para pregar o Cristo ressuscitado. Não seria forçado se disséssemos que ele se apresenta como modelo daquilo que o Documento de Aparecida chama de conversão pastoral. Este discurso do apóstolo dos gentios reflete a reação de um missionário diante da cultura pagã e da vida intelectual e religiosa grega, pois o apóstolo fala a partir da profundidade da fé e não tem receio de anunciar suas convicções ancoradas em Cristo ressuscitado. Ele busca adaptar-se à mentalidade de seus ouvintes, demonstra simpatia por sua cultura e até cita seus poetas, mas não cai em acomodações fáceis que levam a renunciar a verdade. Inicia seu discurso com elogio para captar a benevolência dos ouvintes, porém, suas palavras contêm um certo tom de ironia que os leitores cristãos logo iriam perceber.
“Homens atenienses, em tudo eu vejo que sois extremamente religiosos. Com efeito, passando e observando os vossos lugares de culto encontrei também uma altar com esta inscrição: ‘Ao Deus desconhecido’. Pois bem, esse Deus que vós adorais sem conhecer, é exatamente Aquele que eu vos anuncio” (Atos 17,22-23). Paulo não começa seu discurso com elementos do monoteísmo filosófico grego, mas com expressões religiosas presentes no povo ateniense. “Esse Deus que vós adorais sem conhecer, é exatamente Aquele que eu vos anuncio”. Em sua argumentação o apóstolo afirma a relação de Deus com o mundo. Ele é o Criador e o Conservador de todas as coisas, sua natureza é descrita com termos do Antigo Testamento e também da filosofia grega. O Senhor fez o mundo e tudo o que nele existe, sendo o Senhor do céu e da terra. Aqui há uma ressonância do Salmo 146, bem como de textos do profeta Isaías. O Deus anunciado por Paulo não necessita de nada, nem mesmo de templos construídos pelas mãos humanas. Ele não está longe de cada um de nós, pois n’Ele vivemos, nos movemos e existimos. A mensagem de Paulo é uma proclamação de sua fé em um só Deus, um Deus que, na verdade, não é desconhecido dos gregos. Na conclusão de seu discurso, ele faz alusão a Jesus Cristo como juiz de cada indivíduo. O Todo-poderoso estabeleceu um dia em que irá julgar o mundo com justiça por meio do Homem que Ele designou diante de todos, oferecendo uma garantia ao ressuscitá-Lo dos mortos. Em nossa missão evangelizadora também nós experimentamos oposições, rejeições e outras dificuldades, como as experimentou o apóstolo Paulo, muitos são os que se fecham à pregação do Evangelho e não querem ouvir o que a Igreja tem a dizer do mundo de hoje. Em Atenas, o apóstolo dos gentios encontra um ambiente sacralizado, embora embebido de religião natural. Nosso mundo, entretanto, é marcado pelo secularismo, dominado pelo relativismo e mergulhando sempre mais no ateísmo.
Apesar de seu esforço o êxito de Paulo não pode ser considerado tão brilhante. Entretanto, também não se pode dizer que ele tenha fracassado em sua intuição missionária, pois alguns se uniram a ele e abraçaram a fé. Isso nos encoraja, pois em nossa ação evangelizadora podemos não obter sucessos vistosos, mas a graça de Deus sempre opera e fecunda a semente lançada em terra boa. À Comunidade de Corinto o apóstolo Paulo vai dizer: “Minha palavra e minha mensagem não se basearam em discursos persuasivos de sabedoria, porém, na manifestação do Espírito e de seu poder para que vossa fé não se fundasse na sabedoria humana, mas no poder de Deus” (I Cor 2, 4).
No Evangelho João nos fala sobre o envio do Paráclito, Jesus mostra que, mesmo ao término de Sua vida terrena, há ainda muitas coisas que Ele não pode dizer, pois os discípulos não poderiam compreender. Eles devem esperar o envio iluminador do Espírito da verdade, que os conduzirá à plena verdade. A ação reveladora do Espírito Santo de Deus continuará a obra de Jesus Cristo. O Paráclito guiará para a verdade e fará compreender o que o próprio Jesus havia dito. A glorificação que o Filho recebe do Pai e que é, por sua vez, glorificação do Pai, continua na Igreja por meio da atividade do mesmo Espírito, que perpetua a obra de Cristo. O Espírito Santo ilumina e guia a Igreja e a estimula a interpretar a Palavra do Senhor e a atualizar Sua mensagem nas diversas circunstâncias da vida e nos diferentes contextos históricos e culturais. A Palavra de Deus é uma palavra viva e atual e não um depósito de proposições cristalizadas e anacrônicas. Sábias são as palavras do patriarca Atenágoras, tantas vezes, recordadas: “Sem o Espírito Santo, Deus estaria distante, o Cristo permaneceria no passado, o Evangelho se tornaria letra morta, a Igreja seria apenas uma organização, a autoridade se converteria em poder, a missão se tornaria uma propaganda, o culto se converteria em arcaísmo e a ação moral se tornaria uma ação de escravo. Mas no Espírito Santo o cosmos é enobrecido pela geração do Reino, o Cristo ressuscitado se faz presente, o Evangelho se faz força do Reino, a Igreja realiza a Comunhão Trinitária, a autoridade se transforma em serviço, a liturgia é memorial e antecipação e a ação humana se diviniza”.
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