CN em Foco

Especialista avalia Copa dentro e fora dos gramados

Para Maurício Murad, a Copa dentro dos estádios foi espetacular, já o legado do Mundial para o Brasil deixou a desejar

Luciane Marins e Padre Roger Araújo

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Maurício Murad, doutor em sociologia do esporte / Foto: universo.edu.br

O Canção Nova em Foco desta semana faz uma análise da Copa do Mundo 2014. O doutor em sociologia do esporte, Maurício Murad, que avalia o mundial dentro e fora dos gramados, destaca três momentos do evento: o antes, o durante e o depois.

Para o pesquisador, o antes ficou a desejar, quer seja no planejamento e organização, no superfaturamento de obras e desapropriação de famílias carentes, ou ainda na falta de preparo da sociedade para que aproveitasse o Mundial além do futebol. “Como por exemplo uma experiência de cumprir palavras, objetivos, de cidadania e educação que o esporte permite”.

Já a análise do durante deve ser dividida entre a Copa dentro dos estádios e fora deles.

“Em relação à primeira [dentro dos estádios], foi espetacular.” Ele considera que o Mundial teve bons jogos, com alta média de gols, baixa média de faltas e que, de modo geral, o comportamento do público e dos jogadores foi pacífico, embora tenha havido problemas pontuais de ambos os lados.

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A hospitalidade do povo brasileiro, que teve aprovação de 95% dos turistas, segundo pesquisa Datafolha publicada no último dia 15, foi um dos pontos mais bem avaliados por Murad fora dos estádios.

“Eu caminhei muito por aí e vi as pessoas extremamente solidárias, receptivas, fraternas e generosas com os turistas estrangeiros. Agora, é preciso dizer que isso não foi uma conquista do planejamento da Copa, isso já é da cultura brasileira.”

Murad acredita que o resultado foi melhor do que se esperava e defende que os brasileiros tiveram grande contribuição, já que a paixão pelo futebol se impôs aos movimentos reivindicatórios que, embora justos e legítimos em alguns momentos, acabam em vandalismo. “Eles não tiveram espaço, porque a paixão futebolística, a simbologia e a importância do futebol acabou fazendo esses movimentos refluírem.”

Porém, na avaliação do pesquisador, o transporte público de qualidade, que deveria ser um dos principais legados da Copa para o Brasil, foi uma promessa não cumprida. “Como foi resolvido isso nos dias da competição, para dar a impressão de que a coisa estava fluindo de maneira confortável? Com feriados, inclusive escolares.”

Embora o movimento nos aeroportos tenha fluído de maneira positiva, Murad chama à atenção para o fato de que a demanda por passagens aéreas foi menor do que se esperava.

“Então aproveitamos a Copa numa escala boa, mas poderíamos ter aproveitado numa escala muito, muito melhor, especialmente para a população mais carentes, para os setores mais pobres e mais necessitados da população”.

Quanto ao depois, o sociólogo espera que autoridades governamentais, o comitê organizador, os clubes e toda a sociedade aproveite esse momento para aprofundar questões nacionais que o Brasil precisa, e aqui, ele destaca como prioridade a educação.

“Que a sociedade pense muito mais em ser do que em ter. Se conseguirmos minimamente isso, e o esporte é uma grande simbologia pra gente levantar essas questões, aí sim, o depois da Copa será vitorioso.”

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Murad aponta várias questões que contribuíram para a derrota do Brasil na Copa. Para ele, houve autossuficiência, clima do “já ganhou”, além da própria estrutura do futebol brasileiro que não prioriza o esporte educacional e cidadão.

Citou como exemplo o trabalho desenvolvido na Alemanha, que, na última década, investiu no esporte como medida educacional, cívica e humanitária.

“A questão mais importante do esporte é trazer educação, valores de generosidade, compaixão, civismo, humanitários, de justiça, de paz. E depois de massificar isso para a infância e juventude, desse universo surgirão promessas; aí sim essa promessa de grandes craques futuros é que deverá ser lapidada, visando o mundo profissional do esporte. Mas não é o contrário”.

Para o sociólogo, a seleção demonstrou instabilidade emocional. Ele defende que os jogadores foram submetidos ao chamado “compromisso do êxito”, ou seja, ter que ganhar a qualquer preço, o que pesa sobre a pessoa, de maneira que até a mais competente pode falhar.

“Criou-se um clima, um compromisso de que esses rapazes deveriam vencer para o Brasil vencer, o Brasil como nação, a coletividade, a história. Criou-se um peso grande, porque eles seriam a redenção da derrota de 1950”.

O doutor em sociologia do esporte defende que qualquer profissional, por melhor que seja, é passível de erro, mas explica que o erro exige melhoras.

“Chegamos ao fundo do poço, e chegar ao fundo do poço deve trazer uma experiência de aprendizado, que é a gente fazer autocrítica para renovar, superar e retomar”, aponta.

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