O novo Arcebispo metropolitano de Belém (PA), Dom Alberto Taveira Corrêa, concedeu uma entrevista ao Jornal O Liberal na última terça-feira, 23. Ele fala sobre a expectativa para a nova missão, os desafios, o que já pôde conhecer da arquidiocese e os projetos para os próximos anos.
Leia alguns trechos da entrevista
1. Primeiro gostaria de saber qual foi seu primeiro pensamento quando foi informado que passaria a administrar a Arquidiocese de Belém?
Passada a primeira surpresa, pois não tinha planos de deixar a Arquidiocese de Palmas, à qual me dediquei plenamente, brotou imediatamente o desejo de servir e fazer o bem. No dia de minha nomeação, manifestei ao povo da Arquidiocese de Belém a alegria com que acolhi a nomeação feita pelo Papa Bento XVI. A partir daí, um processo de conhecimento progressivo, ainda que limitado, da realidade de Belém.
2. Qual sua expectativa com relação a administração da Arquidiocese? Durante sua rápida visita à cidade, o que pôde perceber com relação à religiosidade do povo paraense?
A visita que fiz a Belém me impressionou fortemente, pois encontrei um povo acolhedor e aberto, com sinais de muita piedade e desejo de vida de Igreja. Minha expectativa é de servir bem a Deus e a seu povo, trabalhando junto com todas as forças vivas da Arquidiocese de Belém.
3. O que o senhor imagina que será o seu maior desafio?
Prefiro antes conhecer a imaginar desafios e fazer conjecturas. Os que existirem serão provocações positivas à criatividade de todos, Bispo, Padres, Diáconos, Religiosos e Religiosas e especialmente dos leigos, com os quais quero estabelecer um caminho de comunhão e participação.
4. Em uma cidade grande e cheia de contrastes como Belém, aumenta a responsabilidade da igreja no trabalho de evangelização?
Jesus deu aos seus Apóstolos e à Igreja a missão de ir até os confins da terra, evangelizando. Jesus “venceu o mundo”, não como um exército que vence uma batalha, mas Ele o conquistou e conquista por amor e no amor. A Arquidiocese de Belém, e não só o Arcebispo, tem uma missão de levar a Palavra do Evangelho a todos. Esta é nossa responsabilidade e queremos assumi-la juntos.
5. O senhor tem planos de aproximar igreja dos ilhéus e dos ribeirinhos?
Ao invés de estabelecer planos, quero seguir os passos que já foram dados, no trabalho evangelizador e de promoção humana no qual a Arquidiocese, com suas forças pastorais e de atuação social, já está realizando. Dentro de poucos dias, será inaugurado um dos projetos nos quais se envolveu a Cáritas Metropolitana, de implantação de sanitários ecológicos. A Arquidiocese não pode e não vai fugir de todas as suas responsabilidades. Os ilhéus e os ribeirinhos são membros de nossa Igreja, são pessoas a serem amadas e acolhidas e, sendo os mais pobres, são preferidos de Deus e da Igreja.
6. A Arquidiocese de Belém enfrenta alguns problemas financeiros, um dos impasses atuais é a falta de um abrigo para os padres idosos e doentes. Duas pessoas estão abrigadas na casa do arcebispo e segundo o administrador da Arquidiocese, devem ser retiradas de lá com a sua chegada. O senhor já estava a par desse problema? O que pretende fazer a respeito?
Ninguém será “retirado” da Residência Episcopal, muito menos os sacerdotes, que são amados pelo Arcebispo e pelos seus irmãos sacerdotes. O que vamos procurar juntos é o caminho para a assistência adequada aos sacerdotes idosos e enfermos, residam eles na Residência Episcopal ou em outra casa, desde que tudo feito com a dignidade e o respeito que merecem. Queremos fazê-lo juntos, com a participação de toda a Igreja e com a colaboração de muitas pessoas de boa vontade. Quanto à Administração da Arquidiocese, aproveito para manifestar minha gratidão e reconhecimento ao Mons. Raimundo Possidônio, ao Monsenhor Marcelino e a todo o Colégio de Consultores da Arquidiocese, que assumiram as tarefas que lhes couberam com grande competência e dedicação. Com eles, procuraremos equacionar a administração da Arquidiocese de Belém, superando as dificuldades existentes.
7. O senhor esteve 14 anos à frente da Arquidiocese de Palmas. Quais ações que deram certo lá que devem ser implementadas na Arquidiocese de Belém?
Em Palmas, todas as estruturas pastorais, humanas e materiais foram implantadas nestes primeiros anos, a partir de um magnífico trabalho que já encontrei em andamento, por parte das Dioceses às quais pertenciam o território da Arquidiocese.
E trabalhamos em três direções: evangelização, vida sacramental e vida comunitária, na caridade, que correspondem às missões confiadas por Jesus à Igreja: Ensinar, santificar e pastorear. O que procurei fazer foi estabelecer relacionamento e diálogo com todas as pessoas. E deu certo! Ora, em Belém encontro uma Arquidiocese com duzentos e noventa e um anos de criação, com uma belíssima caminhada pastoral. A mim, cabe querer bem as pessoas, dialogar, visitar e colocar-me à disposição de Deus e de seu povo, realizando as missões correspondentes ao mandato dado por Jesus.
8. O que a comunidade da nossa arquidiocese pode esperar de seu novo Pastor?
Só tenho uma coisa a oferecer: a minha vida! Ela pertence a Deus e ao povo da Arquidiocese de Belém. Juntos, temos que esperar muito, mas de Deus, que é Senhor da história e da Igreja.
9. O Pará é um Estado marcado pelos conflitos fundiários e confrontos entre policiais e membros de movimentos sociais são comuns em vários pontos daqui. Como o senhor avalia a questão fundiária?
Não é segredo para ninguém que se trata de uma tarefa exigente para todas as autoridades, às quais cabe a responsabilidade de realizar uma adequada reforma agrária. Ainda que muito tenha sido feito em nosso país, temos uma longa estrada a percorrer. Todas as forças vivas da sociedade podem e devem participar do processo.
a. Na sua opinião, qual a melhor maneira de realizar a reforma agrária?
Desejo que seja conhecida a orientação da Igreja sobre a reforma agrária. Penso que temos muito a ajudar, ainda que não nos caiba “fazer” a reforma agrária, por não podermos realizar o que cabe às autoridades.
b. Como a Arquidiocese deverá se posicionar com relação aos movimentos sociais que optam por formas de pressão radicais?
Até hoje, tenho experimentado que existe um caminho para o relacionamento com todos os agentes sociais, que é o diálogo. O radicalismo, aprendemos com a história, não constrói. Tanto os diversos grupos da sociedade, como as organizações classistas de qualquer setor da sociedade, assim como as autoridades constituídas serão tocadas com o esforço de diálogo, capacidade de mediação, quando formos chamados e nos derem as condições para tanto. Somos cristãos católicos e somos cidadãos. Participamos da construção do mundo, e sonhamos junto com todas as pessoas de boa vontade com a implantação da justiça e da verdade.
c. O senhor acredita que as invasões ou ocupações à propriedade alheia são uma espécie de mal necessário?
Não me cabe papel de juiz, pois a sociedade tem as autoridades constituídas e habilitadas para avaliar as ações de grupos que nela atuam.
d. O que pode ser feito para proteger os bispos que estão ameaçados de morte, no Estado?
Até hoje, Dom Erwin, Dom José Luiz Azcona e Dom Flávio, irmãos Bispos de grande zelo e ardor apostólico, têm sido exemplos irrepreensíveis para nós Bispos e para todo o povo. Saiba a sociedade paraense que nós estamos profundamente unidos a eles e os admiramos, pois são agora perseguidos por causa de bandeiras da dignidade da pessoa humana que pertencem não só aos Bispos, como também a toda a Igreja, aqui incluídos todos os cristãos conscientes da força do Evangelho. Depois, desejamos que as autoridades constituídas ofereçam os meios de segurança àqueles que são perseguidos por causa da verdade.
10. Que postura a Igreja deverá adotar para evitar a fuga de fiéis? Existe algum plano traçado para isso? Há uma política voltada especialmente para atrair os mais jovens?
A Arquidiocese de Belém tem seu plano de pastoral, com a prioridade dada à Evangelização, com um projeto que abrange a todos, adultos, jovens, famílias. Queremos viver a vida da Igreja, para que ela seja como uma cidade construída sobre o monte, como diz Nosso Senhor em seu Evangelho, atraindo a todos. A Igreja atrai e chama as pessoas através do testemunho e este é nosso caminho.
11. Algumas paróquias de Belém já realizam a segunda união de casais. O que o senhor acha disso? Esse trabalho pode ser ampliado para as demais paróquias? Por que até pouco tempo atrás a segunda união era algo completamente condenável? O que mudou?
Não tenho conhecimento de realização de segunda união de casais na Igreja e, se existir esta prática, não está correta e não corresponde às orientações da Igreja Católica. O matrimônio é e continua indissolúvel. O que a Igreja procura fazer é uma “pastoral dos casais em segunda união”.
Seu ponto de partida é a Exortação Apostólica “Familiaris Consortio”, de João Paulo II, especialmente no número 79: “Exorto vivamente os pastores e a inteira comunidade dos fiéis a ajudar os divorciados, promovendo com caridade solícita que eles não se considerem separados da Igreja, podendo, e melhor devendo, enquanto batizados, participar na sua vida. Sejam exortados a ouvir a Palavra de Deus, a frequentar o Sacrifício da Missa, a perseverar na oração, a incrementar as obras de caridade e as iniciativas da comunidade em favor da justiça, a educar os filhos na fé cristã, a cultivar o espírito e as obras de penitência para assim implorarem, dia a dia, a graça de Deus. Reze por eles a Igreja, encoraje-os, mostre-se mãe misericordiosa e sustente-os na fé e na esperança. A Igreja, contudo, reafirma a sua práxis, fundada na Sagrada Escritura, de não admitir à comunhão eucarística os divorciados que contraíram nova união. Não podem ser admitidos, do momento em que o seu estado e condições de vida contradizem objetivamente aquela união de amor entre Cristo e a Igreja, significada e atuada na Eucaristia. Há, além disso, um outro peculiar motivo pastoral: se se admitissem estas pessoas à Eucaristia, os fiéis seriam induzidos em erro e confusão acerca da doutrina da Igreja sobre a indissolubilidade do matrimônio. A reconciliação pelo sacramento da penitência – que abriria o caminho ao sacramento eucarístico – pode ser concedida só àqueles que, arrependidos de ter violado o sinal da Aliança e da fidelidade a Cristo, estão sinceramente dispostos a uma forma de vida não mais em contradição com a indissolubilidade do matrimônio. Isto tem como consequência, concretamente, que quando o homem e a mulher, por motivos sérios – quais, por exemplo, a educação dos filhos – não se podem separar, «assumem a obrigação de viver em plena continência, isto é, de abster-se dos atos próprios dos cônjuges». Igualmente o respeito devido quer ao sacramento do matrimônio quer aos próprios cônjuges e aos seus familiares, quer ainda à comunidade dos fiéis proíbe os pastores, por qualquer motivo ou pretexto mesmo pastoral, de fazer em favor dos divorciados que contraem uma nova união, cerimônias de qualquer gênero. Estas dariam a impressão de celebração de novas núpcias sacramentais válidas, e consequentemente induziriam em erro sobre a indissolubilidade do matrimônio contraído validamente. Agindo de tal maneira, a Igreja professa a própria fidelidade a Cristo e à sua verdade; ao mesmo tempo comporta-se com espírito materno para com estes seus filhos, especialmente para com aqueles que sem culpa, foram abandonados pelo legítimo cônjuge”.
12. Outro ponto marcante no Estado é o grande número de casos de abuso e exploração sexual envolvendo menores de idades.
Os abusos e a exploração sexual estão presentes, infelizmente, em nossa sociedade, como também em outros tempos. Hoje a divulgação é muito maior, pela profusão dos meios de comunicação social. Já estamos pagando um preço, e muito alto, pela corrupção dos costumes, que traz consigo uma desvalorização da pessoa humana e de sua dignidade, como templos do Espírito Santo, que somos de verdade. Tenho experimentado que os jovens, acolhendo o Evangelho, acolhem também a proposta da castidade, do matrimônio indissolúvel, fiel e fecundo. Prefiro anunciar o bem e as propostas de santidade!
13. Dentro da Igreja católica também há muitas denúncias envolvendo essa prática criminosa. O senhor acha que o fim do celibato seria uma saída para acabar com o problema?
Não, de forma alguma. O celibato é um valor presente na Igreja desde os primeiros tempos. A castidade é um valor permanente, bastando conferir as máximas do Evangelho. A Igreja tem o direito de escolher para a ordenação sacerdotal varões que tenham a vocação do sacerdócio e também a vocação ao celibato por causa do Reino de Deus, para ser como o Senhor Jesus. O homem e a mulher se realizam quando descobrem sua forma de viver a grande vocação humana, o amor. E é amor a vida matrimonial, e é também amor (e maior!) dar a vida para servir e construir a família dos filhos de Deus. Quanto às pessoas de Igreja que realizem as referidas práticas criminosas, são chamadas ao arrependimento e à mudança de vida, assim como devem responder pelos seus atos eclesiástica e civilmente.
Siga o Canção Nova Notícias no twitter.com/cnnoticias
Conteúdo acessível também pelo iPhone – iphone.cancaonova.com