16 de novembro

Brasil comemora Dia de Atenção à Dislexia

Especialista e pais falam sobre a dislexia como transtorno de aprendizagem

Denise Claro
Da Redação

Nesta quarta-feira, 16, é comemorado em todo o país o Dia de Atenção à Dislexia. A palavra “dislexia” é derivada do grego “dis” (dificuldade) e “lexia”(linguagem). A data foi instituída em 8 de janeiro de 2015, pela Lei nº 13.085.

Segundo a Associação Brasileira de Dislexia (ABD), a desordem é considerada um transtorno específico de aprendizagem de origem neurobiológica, caracterizada por dificuldade no reconhecimento preciso e/ou fluente da palavra, na habilidade de decodificação e em soletração.

Essas dificuldades normalmente resultam de um déficit no componente fonológico da linguagem e são inesperadas em relação à idade e outras habilidades cognitivas.

A dislexia pode ser hereditária e sua incidência maior é em meninos, numa proporção de 3/1, sendo que a ocorrência é de cerca de 10% da população mundial.

Silvana Oliveira, psicopedadoga./ Foto: Arquivo Pessoal.

Silvana Oliveira, psicopedadoga./ Foto: Arquivo Pessoal.

Para a psicopedagoga Silvana Oliveira, a importância em se comemorar a data está justamente em abordar o tema, pois ainda há muito desconhecimento e despreparo dos profissionais. “Ainda há muito a fazer, e contribuir para que as pessoas possam conhecer a dislexia, se identificar e buscar ajuda.”

A psicopedagoga lembra que a dislexia não é uma doença, portanto não há cura nem medicamentos. “A pessoa nasce com a dislexia. Quanto mais cedo este diagnóstico for feito, melhor, pois poderão ser feitas intervenções na área de fonoaudiologia, psicopedagogia, auxiliando no processo de alfabetização.”

A especialista ressalta que, se bem acompanhado, o indivíduo com dislexia pode se desenvolver bem, inclusive fazer uma faculdade e se tornar um profissional capacitado:

“O que acaba prejudicando a pessoa com dislexia é que dependendo da abordagem, se não for bem feita, ela corre o risco de fugir de tudo o que é leitura. Esta solução, obviamente, compromete seu aprendizado acadêmico, sua formação. Se não for bem acompanhado, o prejuízo pode ser grande, pois este aluno pode até deixar os estudos, não fazer uma faculdade, não seguir no desenvolvimento acadêmico, por não conseguir lidar com suas dificuldades”.

Sinais

Segundo o site da ABD, na pré-escola a criança já pode apresentar alguns sinais, como dispersão, falta de atenção, atraso do desenvolvimento da fala, linguagem, na montagem de quebra-cabeças, fraco desenvolvimento da coordenação motora e falta de interesse por livros impressos.

“As crianças disléxicas podem dar alguns sinais desde a primeira infância. Quando ela é pequenininha, o que se observam são dificuldades de aprender e lembrar músicas, dificuldades com rimas, lembrar e aprender a escrita do nome, mas o diagnóstico não é dado antes de ela iniciar de fato o processo de alfabetização.”, completa a psicopedagoga.

João Eudes e o filho Filipe./ Foto: Arquivo pessoal.

João Eudes e o filho Filipe./ Foto: Arquivo pessoal.

Testemunho

Joao Eudes é pai de Filipe, e percebeu as características da dislexia no filho logo cedo. 

“Apesar de nosso filho ter nascido normal segundo as normas de pediatria, quando estava com dois anos de idade suspeitamos do atraso na fala e começamos a averiguar as causas. Na época escolar, ele não conseguia gravar as letras. Tivemos a ajuda de vários especialistas, como fono, terapeuta ocupacional, neuro, psicólogo e pedagogo. Fizemos tudo o que estava ao nosso alcance, juntamente com os profissionais e a escola”. 

Bulling

A psicopedagoga ressalta a importância do apoio psicológico, em muitos casos, devido à baixa autoestima que a criança apresenta, causada pelos rótulos recebidos, e por ter sido vítima de bulling na escola, e até na própria família.

“É importante frisar que quando uma deficiência é física, perceptível, as pessoas compreendem melhor as limitações da criança. No caso do disléxico, por se tratar de crianças normais, inteligentes, rápidas e bonitas, muitas vezes, isso não é percebido, e suas dificuldades são encaradas como preguiça e falta de esforço. É um preconceito muito forte e cruel, muito danoso para o emocional da criança.”, avalia a especialista.

O pai de Filipe lembra que o filho foi vítima desta situação: “Meu filho sofreu bulling, mas a escola ajudou a desconstrução do preconceito. Hoje Filipe está com 14 anos, no oitavo ano da escola, passa com média em todas as matérias, inclusive línguas estrangeiras. O tratamento depende muito do apoio da família”. 

Outro caso 

Mônica Aviani é mãe de Emanuel, que também apresenta um quadro de dislexia. Ela conta que desde pequeno ele tinha dificuldade de responder aos comandos, e não tinha boa coordenação motora. “Além disso, Emanuel sempre foi muito alegre, e acabou tido como agitado. No primeiro ano, não passou, segundo a escola, devido a ser muito imaturo e não ter aprendido nada da alfabetização. Não diferenciava letras de números. Ao entender que repetiria o ano e perderia os colegas, ficou inconsolável, chorou o natal e as férias inteiras. Acabou fazendo a seguinte análise ‘Se todo mundo passou e eu não é porque a professora é boa e eu sou burro’.”

Apesar de nos anos seguintes ter tido bons professores, e acompanhamento profissional, após o diagnóstico, na quarta série Emanuel foi discriminado até mesmo pela professora. “Despreparada, o fez passar por diversas humilhações, a ponto de um colega defendê-lo para mim. Seu estado emocional estava entrando em sério comprometimento”. 

Como auxiliar a pessoa com dislexia

Muitas coisas podem ser feitas para auxiliar o disléxico em seu aprendizado. O importante, desde a infância, é a abordagem adequada junto à escola, a postura da família frente a dificuldade da criança, ajudando-a. “Após o diagnóstico feito, por exemplo, o disléxico tem o direito de que alguém leia para ele uma prova. Em um momento como o vestibular, é um recurso que torna para ele a competição mais justa.”, demonstra a psicopedagoga.

Dislexia na fase adulta

Mariana Teixeira, descobriu a dislexia há 5 anos./ Foto: Arquivo Pessoal.

Mariana Teixeira, descobriu a dislexia há 5 anos / Foto: Arquivo Pessoal.

Mariana Teixeira conta que desde criança tinha dificuldades na escola, mas que só recebeu o diagnóstico há pouco tempo, já adulta.

“Tinha muita vergonha, me sentia burra, trocava as letras, não sabia acentuar bem as palavras, nem ver horas em relógio de ponteiro… mas nunca soube que se tratava de um transtorno. Em 2011, fiz um vestibular em administração que não tinha redação, e passei. Um dia, comentando com a professora de português, ela detectou a dislexia. Foi como se tirasse um peso de mim. Com o diagnóstico, meus professores não podiam descontar os erros ortográficos que eu tinha. Fiz a maioria das avaliações em forma de trabalhos e apresentações. Hoje me formei e dou palestras.”

A psicopedagoga confirma que quando o diagnóstico da dislexia é feito de forma tardia, é recebido como um alívio, pois o adulto encontra nele uma justificativa para a dificuldade que sempre esteve lá. “Porém, isso não deve ser instrumento para que se esconda atrás do transtorno, mas como uma forma de ter seus direitos garantidos.”

Silvana ressalta que, em todo o processo de acompanhamento da pessoa com dislexia, a família tem um papel fundamental. “Quando se tem o olhar da família para a criança, em suas dificuldades em cada fase, sem resistência de busca de profissionais adequados, a criança tem muito mais chance de ter êxito na escola e na vida. O entendimento da família é muito importante para dar a ela o suporte, fortalecendo-a de forma emocional, e sabendo esperar seu tempo, o que contribuirá até sua vida adulta”. 

 

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