Carta ao governador do Pará

Bispos do Marajó pedem instalação de um hospital de campanha na região

Pedido foi realizado em carta enviada ao governador do Pará; Hospital mais próximo do povo marajoara é o de Belém – com pandemia, local apresenta sistema de saúde saturado 

Da redação

Os bispos do Marajó solicitaram ao governador do Pará, Hélder Barbalho, uma atenção especial com a região sul do arquipélago, conhecida como Marajó Oriental. Em carta enviada nesta segunda feira, 27, os prelados pediram a instalação de um hospital de campanha na região. Segundo os bispos, o local evitaria que o povo marajoara se deslocasse por meio de embarcações até a capital paraense, que já está com o sistema hospitalar saturado.

Um diálogo e pedido de apoio ao Governo Federal que mantém o programa “Abrace o Marajó” através do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos também foi sugerido. Confira a carta na íntegra:

Ao
Exmo. Sr. Governador do Estado do Pará
Helder Zahluth Barbalho

ASSUNTO: Retaguarda de leitos de UTI no Marajó para Combate a CV-19

“Todas as vezes que fizestes isso a um desses menores que são meus irmãos, foi a mim que o fizestes” (Mt 25,40).

Nós, abaixo assinados, D. Evaristo Pascoal Spengler e D. Teodoro Mendes Tavares, Bispos da Prelazia do Marajó e da Diocese de Ponta de Pedras, respectivamente, vos saudamos cordial e respeitosamente. Dirigimo-nos a Vossa Excelência, neste tempo de muitas provações, por causa da crise sanitária, para apresentar-lhe o clamor do povo marajoara diante da expansão da pandemia do novo Coronavírus, que já atinge quase dois terços dos
seus municípios do Arquipélago do Marajó e solicitar providências cabíveis.

Estamos acompanhando com bastante atenção e solicitude o enfrentamento do seu governo diante da crise sanitária que assola o mundo e o Brasil com a propagação da pandemia do novo Coronavírus (SARS – CoV – 2), causador da doença COVID-19.

Manifestamos nosso apoio às medidas e ações que o seu governo tem tomado frente a essa pandemia. Continuamos colaborando, seguindo as normas e recomendações dadas pelas autoridades sanitárias e competentes. Divulgamos todas as medidas para a contenção do avanço do novo Coronavírus. Nossas celebrações, reuniões e atividades pastorais foram todas suspensas. Estamos rezando constantemente pela saúde de todos e pelo fim desta
pandemia. Mas, com o decorrer do tempo, percebemos que a situação no Marajó está ficando cada vez mais crítica e poderá ficar insustentável, pois tem aumentado substancialmente o número de pessoas infectadas e mortas por causa desta pandemia do novo Coronavírus.

Observamos que o planejamento anunciado pelo Estado prevê a construção de um hospital de campanha em Breves, região ocidental do Marajó, para atender os municípios de Breves, Anajás, Bagre, Curralinho, Gurupá, Melgaço e Portel. Por outro lado, a região oriental será atendida pelo sistema de saúde de Belém. Tememos que essa medida colocará muitas vidas em risco, devido ao colapso da saúde na capital paraense. A imprensa local e
nacional têm evidenciado que a estrutura de saúde de Belém, tanto a municipal quanto a estadual, já está comprometida. Ou seja, há pouco mais de um mês do primeiro caso de COVID-19, o Pará já alcançava, em 21 de abril, 97% da utilização de leitos de UTI’s – Unidades de Terapia Intensiva – disponíveis no Estado. Em Belém a situação já era mais grave: 100% dos leitos já estão ocupados e 80% deles com pacientes suspeitos ou confirmados com a Doença (cf. Estadão, 21.04.2020). Hoje a situação está mais grave, tanto que o prefeito de Belém anunciou medidas mais rigorosas para o controle da pandemia.

Nesse sentido, vimos solicitar a Vossa Excelência que viabilize a instalação de UTI’s nos Hospitais municipais, para que em caso de necessidade, se possa atender a população nos próprios municípios, evitando assim sobrecarregar ainda mais a estrutura da capital. Tendo em vista a situação emergencial que se apresenta e os limites do Estado em atender a essa necessidade premente, propomos a instalação de um hospital de campanha com
os devidos equipamentos e equipe de profissionais de saúde que atenda à região oriental/sul do Marajó (municípios de Soure, Salvaterra, Cachoeira do Arari, Santa Cruz do Arari, Ponta de Pedras, Muaná e São Sebastião da Boa Vista). A distribuição dos hospitais, assim como ofertas de leitos de UTI’s, equipamentos e pessoal, são decisivos para preservar a vida dos doentes. E nesse ponto, a desigualdade pode ser fatal no Marajó.

É fato público que por falta de estrutura no Marajó, grande parte da população tem que se deslocar para Belém em navios com grande aglomeração para receber seus benefícios sociais. Tememos que este fato potencialize a transmissão do novo Coronavírus no Marajó. Por isso, solicitamos a viabilização de estruturas suficientes para atender a necessidade da população no recebimento dos seus benefícios em cada município. Além disso, solicitamos que seja reduzido o número de embarcações para o transporte de passageiros, com uma fiscalização eficiente para tal.

O Marajó, historicamente, foi esquecido pelos governos federal e estadual. Prova disso é que os municípios desta região apresentam os piores IDH´s do Estado do Pará e do Brasil. Tememos que, mais uma vez, o(a) cidadão(ã) paraense residente no Marajó fique relegado(a) ao descaso ou desamparado(a). Mas esperamos que não seja necessário fazer escolhas entre quem vai viver e quem vai morrer, razão pela qual fazemos este apelo a Vossa Excelência, aguardando uma resposta positiva, rápida e eficaz, pelo que muito agradecemos.

Sabemos que o governo federal tem disponibilizado recursos para ajudar a solucionar os problemas da saúde por causa desta pandemia. Para nós, é urgente que o Estado solicite recursos para a construção de um hospital de campanha na região oriental do Marajó. Ao mesmo tempo, ousamos sugerir, respeitosamente, que o Governo do Estado dialogue com a Sra. Damaris Regina Alves, Ministra de Estado da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, que lançou o Programa “Abrace o Marajó”. Este é o momento crucial em que o Marajó mais necessita de um abraço afetuoso e carinhoso dos poderes estadual e federal para ser defendido e cuidado. Quem é solidário e propõe que se abrace o Marajó, neste momento não poderá ficar de braços cruzados, nem indiferente a este apelo clamoroso do povo marajoara.

Senhor Governador, conhecemos sua identidade católica e sua fé no Deus da vida que sempre socorre os fracos e desvalidos. Gostaríamos de contar com o seu compromisso para com a nossa população marajoara, já tão vulnerável. Acreditamos profundamente que haja caminhos de esperança e que, juntos, unidos e solidários uns com os outros, venceremos essa luta pela saúde e pela vida digna do nosso povo. O Cristo Ressuscitado, que está no meio de nós, seja a nossa força e a nossa vida!

Atenciosamente,

D. Teodoro Mendes Tavares
Bispo da Diocese de Ponta de Pedras

D. Evaristo Pascoal Spengler
Bispo da Prelazia do Marajó

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