Ser presença – enquanto comunidade de Fé –, nas favelas e periferias; ser estímulo à organização e conscientização das comunidades, buscando integrar mundos sociais diversos e diminuir os abismos da separação (João Paulo II, em 1980, no Morro do Vidigal) e trabalhar com o povo, para que todos os aspectos da vida social sejam respeitados, são alguns dos objetivos que regem há 35 anos a Pastoral das Favelas, criada em 1976, na gestão do então Arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Eugenio Salles.
No último domingo, 23, para comemorar esses 35 anos, a Pastoral das Favelas — que vem organizando durante todo o ano celebrações e ações nas diversas comunidades onde promove seu trabalho pastoral — apresentou a Deus suas intenções e gratidão numa Missa em Ação de Graças. O momento ainda recordou especialmente o “Caso Vidigal” – quando em setembro de 1977 os moradores sofreram ameaças de despejo, mas unidos e apoiados pela Igreja demonstraram resistência na luta pelo direito à moradia.
A Celebração Eucarística, que foi realizada na Capela Nossa Senhora das Graças, na comunidade Santa Marta, foi presidida pelo Arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Orani João Tempesta, concelebrada pelo Coordenador da Pastoral das Favelas, monsenhor Luiz Antônio Lopes, e pelo Pároco, padre Alex Coelho Sampaio, que acolheu todos os presentes destacando a alegria em poder celebrar os 35 anos da Pastoral das Favelas na comunidade.
"É com muita alegria que nós acolhemos a todos e celebramos aqui, na Capela Nossa Senhora das Graças, os 35 anos da Pastoral das Favelas. Agradeço a presença de Dom Orani e do Monsenhor Luiz Antônio, e não posso deixar de destacar o trabalho realizado nesta comunidade por algumas pessoas que me antecederam: Padre Pedro Velloso e aquela que chamo de “arquivo vivo”, pois já desenvolve seu trabalho pastoral aqui há mais de 30 anos, Irmã Maria da Glória. E é com muita felicidade que festejamos o trigésimo quinto ano da Pastoral", disse Padre Alex.
Dom Orani ressaltou o testemunho e o legado deixado por aqueles que precederam os atuais agentes da Pastoral das Favelas, e falou sobre a importância do trabalho realizado ao longo desses 35 anos de caminhada através da vivência do Evangelho, da justiça, da solidariedade humana e da participação no mundo eclesial.
"Com muita alegria nos sentimos acolhidos por todos da comunidade Santa Marta e por aqueles que não residem aqui, mas estão conosco hoje, representando todas as demais comunidades existentes no Rio de Janeiro. A Pastoral das Favelas começou com Dom Eugenio, e a Arquidiocese, juntamente com as pessoas que vivem nas favelas e em unidade com outras entidades, procura dar dignidade à pessoa humana, e nós fazemos isso por meio da fé cristã católica, numa presença constante. Nós queremos agradecer a Deus pelos que nos precederam e pelos agentes atuais, que tornam possível este trabalho que tem ainda muitos passos a serem dados. Pedimos também ao Pai para vivermos sempre tempos novos e que nunca percamos a esperança, rezando sempre por todos aqueles que nós representamos através do trabalho desta Pastoral", afirmou o Arcebispo do Rio.
Ressaltando as leituras do dia, em especial o Evangelho (Mc 9,30-37), durante a homilia Dom Orani recordou que Jesus convida a todos a terem um coração de criança para poder realizar a transformação no mundo e observou que este é o papel que a Igreja vem tentando realizar tanto no seu interno como nas preocupações sociais defendendo a vida em todas as instâncias.
"Aquela orientação que Jesus dá para seus discípulos, de serem servidores, a Igreja recebe como uma herança. Ser uma Igreja servidora de suas pastorais é o nosso papel, e, quando estamos junto das pessoas, cumprimos justamente o papel da Igreja enquanto servidora da humanidade. Somos pessoas que vivem esse serviço à humanidade, para que a vida aconteça; e a Pastoral das Favelas é a prova disso, nesses 35 anos. Vale ressaltar que, antes de se organizar, nós já tínhamos trabalhos nas favelas e, com o passar do tempo, nós nos organizamos cada vez mais e melhor. Vocês, agentes da Pastoral das Favelas, são testemunhas desse trabalho que não se resume só ao aspecto da assistência, mas que se estende politicamente na luta pelos direitos das pessoas que moram nas favelas. (…) Não levamos ódio no coração, mas a paz e a fraternidade, respeitando a diversidade diante das situações de injustiça. Com as parcerias, sonhamos que as famílias possam ter as suas casas e seus trabalhos, e eu creio que nesse aspecto temos um longo caminho a percorrer. Temos pessoas que foram vindo, outras que partiram para a casa do Pai, mas sempre com o objetivo de servir e deixar que o Evangelho realize, na prática, o nosso compromisso para que a vida continue acontecendo. Os sonhos de um mundo mais justo, fraterno e cristão estão sempre presentes em nossas vidas. Unidos, queremos continuar nossa vida de fé buscando a dignidade e a vida para todas as pessoas", salientou Dom Orani.
O Coordenador da Pastoral das Favelas, Monsenhor Luiz Antônio Lopes, destacou que as celebrações pelos 35 anos da Pastoral já foram realizadas também nas favelas da Formiga, Cidade de Deus, Juramento e em Jacarepaguá.
"Este ano nós temos ido a várias comunidades celebrando os 35 anos da Pastoral, mas este mês é o período exato em que a ação de despejo ia acontecer, em 1977, na favela do Vidigal. (…) Algumas pessoas tem me questionado por que não colocamos o nome Pastoral das Comunidades? Pastoral das comunidades ficaria muito amplo e Pastoral das Favelas caracteriza a presença, a opção, e a nossa identidade com os pobres. É importante nós caracterizarmos o nosso foco e, no final da celebração, vamos lançar uma Carta Aberta, com todos os parágrafos das Leis, pois o direito à moradia é um direito sagrado", ressaltou.