Artigo Frei Moser

Copenhague: qual a verdadeira questão ecológica?

Com certeza, meados de dezembro de 2009 ficará na história. Os debates por vezes acesos referentes às questões ecológicas revelam de antemão que há uma nova e forte consciência que vai se firmando em toda a humanidade. Se quiser sobreviver a humanidade deverá levar mais a sério o que hoje se denomina ecoesfera.

Nesse sentido, até as crianças já sabem o que é ecologicamente correto e o que se constitui crime ambiental. Sabem também que vivemos num mundo que sofre as mais variadas formas de poluição que contaminam os elementos fundamentais para que a vida possa continuar existindo na Terra.

Qualquer criança é capaz, ainda, de falar sobre o efeito estufa, resultando de uma crescente emissão de gás carbônico e, porque não, até de gás metano. Nem os animais ruminantes deixam de ser corresponsabilizados pela degradação do meio ambiente. Sempre é mais fácil culpabilizar os animais do que os seres humanos; os pobres do que os ricos. Por isso mesmo há até quem julgue que a causa principal do drama ecológico seja a superpopulação.

Talvez já seja bem tempo de arriar a bandeira da "explosão demográfica" para substituí-la pela da "explosão do envelhecimento". Claro que viver muito é uma bênção, mas desde que longevidade se conjugue com qualidade; e qualidade de vida, entre outros componentes, pressupõe políticas públicas adequadas.

É do conhecimento geral que não apenas estamos vivendo uma onda crescente de calor, como também sob as ameaças de desertificação, da falta de água, com tudo o que isso representa. Hoje já seriam 200 milhões de pessoas que, sobretudo por razões climáticas e dos males delas decorrentes, vivem em estado de migração. Nosso planeta corre sérios riscos de se tornar inabitável.

Quem tem um conhecimento ecológico mais aprofundado relativizará um pouco os gritos de certas vozes por demais apocalípticas. Ao longo da história de milhões de anos a Terra conheceu fenômenos parecidos. Maremotos, terremotos, enchentes e secas fazem parte da história humana. O que podemos conceder é que essas tragédias estão se tornando mais acentuadas e mais frequentes.

De qualquer forma, a gravidade dos problemas deslocou milhares de pessoas para Copenhague. Só o Brasil sozinho conta com uma invejável comitiva de algumas centenas de pessoas. Claro que nem todos que lá estão irão poder contribuir eficazmente para localizar os problemas e, conseqüentemente, para encontrar caminhos de solução. Mas essa grande comitiva poderá ao menos reforçar os gritos de alerta.

Conferências anteriores realizadas no Rio de Janeiro e em Kyoto, parecem não haver conseguido grandes resultados além de popularizar a consciência ecológica e a linguagem que é repetida em todas as longitudes e latitudes. Copenhague, contudo, promete algo mais no sentido de comprometimentos com metas concretas de redução do que se visualiza como fatores responsáveis pelo agravamento dos problemas. E ninguém pode deixar de se alegrar com isso.

Assim mesmo cabem algumas interrogações que, quando muito, são tocadas apenas levemente. A primeira interrogação diz respeito ao fato de haver grande empenho em fazer um levantamento dos inegáveis sinais de degradação, sem, contudo, as conseqüentes interrogações quanto às causas dos problemas.

De fato, ficar apenas nos sintomas pode ser um primeiro passo, mas, em hipótese alguma, pode se constituir no grande passo a ser dado. Um primeiro fator decisivo aponta para a economia. Bem se sabe que desde a Revolução Industrial a economia mundial se caracteriza pelo extrativismo e pelo consumismo. Ela não atende às necessidades vitais de todos, mas, pelo contrário, cria necessidades fictícias e alimenta artificialmente o consumismo, e isso de tal forma que consumimos muito mais do que a terra pode produzir.

Mas, quando se fala em mudanças nos modos de produção está se mexendo com interesses que vão no sentido contrário. Ninguém quer investir em mudanças mais estruturais. Por isso mesmo, todos vão jogando para o futuro eventuais mudanças: dentro de 20 anos, dentro de 30, 40, 50 anos… Isso é sintomático. Até lá sobrará pouco para ser resgatado.

Entretanto, há um outro passo mais urgente a ser dado, se não quisermos ficar em meros discursos. Tal passo remete para um certo tipo de consciência. Enquanto os seres humanos se julgarem senhores da criação, nada de mais significativo acontecerá no campo da ecologia. O máximo que se conseguirá serão pequenos "curativos".

Para ser mais claro: a verdadeira questão ecológica remete para uma concepção antropológica, no sentido de os seres humanos compreenderem quem são e qual é seu papel nesse imenso universo. Assim sendo, podemos afirmar com todas as letras que a questão ecológica é fundamentalmente uma questão ética.

Não é demais recordar nesse contexto a figura de São Francisco de Assis, patrono da ecologia. Seu ponto de partida era a compreensão de que todos somos filhos e filhas de um Pai comum. Por isso mesmo, todos devemos viver como irmãos e irmãs, tanto nas relações diretamente humanas quanto nas relações com as demais criaturas. Por isso, no seu "Cântico das criaturas" ele reverencia os sol, a lua, as estrelas, e todas as demais criaturas, como manifestação do amor que Deus tem para conosco. É que Francisco compreendeu o mistério da Encarnação do Filho de Deus, Primogênito de toda a Criação. Tudo foi feito por Ele e para Ele. Desde que Deus fez sua morada na Terra, não apenas ela e tudo o que nela existe, mas também todo o universo, assumem outro sentido. Assim os seres humanos só se sentirão em casa se compreenderem e abraçarem todas as criaturas e, por meio delas, chegarem ao Criador.

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