O bispo de Barra, na Bahia, Dom Luiz Flávio Cáppio, enviou nesta terça-feira, 27, uma carta ao presidente Luis Inácio Lula da Silva, na qual anuncia a retomada da greve de fome contra as obras de transposição do Rio São Francisco, já iniciadas pelo governo.
Na carta o bispo diz que já existem propostas concretas, alternativas à transposição, feitas inclusive por instituições públicas, como a Agência Nacional de Águas (ANA) e a Articulação do Semi-árido (ASA).
Dom Cappio fala direto ao presidente: "O senhor não cumpriu sua palavra, não honrou nosso compromisso, enganou a mim e a toda sociedade brasileira". Disse que o presidente não é um dirigente sério.
Segundo ele, Lula havia prometido iniciar um amplo diálogo governo e sociedade civil, na busca de solução para o semi-árido, e não cumpriu. E diz:
"Portanto retomo o meu jejum e oração, e só será suspenso com a retirada do exército nas obras do eixo norte e do eixo leste e o arquivamento definitivo do projeto de transposição de águas do Rio São Francisco. Não existe outra alternativa", conclui o bispo.
A carta foi apresentada em Brasília por membros da Pastoral da Terra, às 11h da manhã desta terça-feira, mesmo horário em que Dom Cappio iniciava o jejum numa capela dedicada a São Francisco ao lado da barragem de sobradinho na Bahia.
Segundo o bispo emérito de Goiás (GO), Dom Tomás Balduino, "a gente vê que o gesto de Dom Cappio é um gesto ligado à esperança que está inerente à caminhada do nosso povo".
Roberto Malvezzi, da Comissão Pastoral da Terram destacou que "quando o Governo foca na transposição ele foca principalmente na dimensão econômica da água, e a questão da sede humana e a descentralização dos a mais, fica em segundo plano. Há uma inversão dos valores que está na própria lei brasileira de recursos hídricos", apontou.
Criticando também a transposição, Éder Magalhães, do Conselho Indigenista Missionário, apontou que "se faz toda política para fazer a transposição do Rio São Francisco como uma mega obra, e não se destina recursos para fazer as pequenas obras que resolvem com maior consistência o problema da água do nordeste".
Dom Tomas acredita que o gesto do bispo visa a conscientização e o apoio da sociedade: "atinge exatamente este universo, muito mais do que a burocracia governamental".
Nota da Presidência da CNBB sobre a transposição do Rio São Francisco e o jejum de Dom Luiz Cappio
Ao tomar conhecimento, nesta terça-feira, 27 de novembro, da decisão de Dom Frei Luiz Flávio Cappio, OFM, bispo da diocese de Barra (BA), de retomar o "jejum e a oração" por causa do projeto de transposição do Rio São Francisco, a Presidência da CNBB reafirma o que já teve ocasião de expressar.
Em relação à transposição, a CNBB considera que:
O Estado tem a responsabilidade de garantir à população o acesso à água de boa qualidade, que é um direito humano e um bem público necessário aos seres humanos, aos animais e às plantas.
É necessário dar continuidade a um amplo diálogo visando a soluções adequadas e considerando as alternativas apresentadas pelas forças sociais populares envolvidas no processo, para promover o desenvolvimento sustentável, a preservação do meio ambiente, a agricultura familiar e a convivência com o semi-árido.
É preciso cuidar da revitalização do Rio São Francisco e do respeito ao direito à terra dos povos da região, particularmente indígenas, quilombolas, população ribeirinha.
Temos clareza que o tema da transposição do Rio São Francisco traz consigo muitas implicações, não havendo unanimidade nem mesmo na Igreja, o que julgamos perfeitamente compreensível.
Esperamos que o diálogo se estabeleça a fim de que a vida e a justiça prevaleçam sobre quaisquer outras razões.
Brasília, 27 de novembro de 2007
Dom Geraldo Lyrio Rocha
Arcebispo de Mariana
Presidente da CNBB
Dom Dimas Lara Barbosa
Bispo auxiliar do Rio de Janeiro
Secretário Geral da CNBB