Pós-doutorado em História Antiga e Teologia, professor Luiz Alexandre Rossi comenta características das cartas de São Paulo e do livro do Apocalipse
Gabriel Fontana
Da Redação

Foto: Wesley Almeida
Últimos livros da Bíblia a serem escritos, as diversas cartas e o livro do Apocalipse compõem o restante do Novo Testamento junto dos Evangelhos. Esses escritos registram a expansão do cristianismo após a morte e ressurreição de Jesus e são o tema da última matéria da série especial do noticias.cancaonova.com para este Mês da Bíblia.
Pós-doutorado em História Antiga pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e em Teologia pelo Seminário Teológico Fuller, na Califórnia, o professor Luiz Alexandre Rossi destaca que as cartas são uma reflexão pastoral e teológica. Antes delas, já havia a preocupação com o registro da vida de Jesus por meio dos Evangelhos.
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“Era preciso contestar uma fé que se constituía alienada e que acabava separando o Jesus histórico, aquele que se encarnou e viveu entre os homens, do Cristo confessado pela fé, o ressuscitado”, afirma Rossi. Ele acrescenta ainda que os Evangelhos provocavam e fortaleciam a fé das comunidades cristãs e apresentavam a maneira com que Jesus viveu, levando a uma transformação de vida que deveria também testemunhar e transmitir Cristo aos demais.
O testemunho de São Paulo
São Paulo também realizou isso por meio de suas cartas – ao todo, foram 13 escritos. Nelas, o apóstolo relata a sua experiência com Jesus que o mudou completamente, chegando a escrever “eu vivo, mas não eu: é Cristo que vive em mim” (Gl 2,20). “Em cada uma de suas cartas, ele deixa transparecer o caminho do discipulado que fazia e como cada um dos irmãos das mais diferentes comunidades deveriam viver de forma comprometida com os valores do Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo”, complementa o professor.
Ele observa também que as comunidades que estavam surgindo também possuíam características próprias, sendo formadas por pessoas diferentes. “Por isso, as orientações pastorais de Paulo procuram orientar os irmãos e irmãs de cada comunidade a como viver o projeto mais fascinante da vida, que é Jesus”, salienta Rossi.
Uma vez que as dificuldades das comunidades eram diferentes, São Paulo contou como um “raro discernimento espiritual”, como descrito pelo professor, para orientá-las. “Portanto, o contexto de cada comunidade é de extrema importância para compreender os motivos de Paulo escrever e aconselhar de uma determinada maneira”, acrescenta o professor.
Revelação
O livro do Apocalipse, por sua vez, é ao mesmo tempo fácil e difícil de ser lido, pontua Rossi. “Só quem conhece o contexto em que foi escrito e o gênero literário empregado consegue entender o seu conteúdo.”
“O autor faz uso de muitos sinais, símbolos, números, animais, códigos, órgãos do corpo, elementos do universo, uso de datas, locais e pessoas do passado. O povo das comunidades conhecia toda esta linguagem”, explica o professor. A palavra “Apocalipse”, em grego, significa “revelação”, prossegue, tratando-se de uma revelação da parte de Deus de algo que está oculto e que não pode ser compreendida por aqueles que não conhecem a mensagem cristã.
O livro do Apocalipse e a esperança
Além disso, o livro do Apocalipse é uma profecia, recuperando uma tradição do Antigo Testamento. “Os profetas sempre foram mensageiros de Deus que surgiam em tempos de crise e opressões sobre o povo de Deus”, aponta Rossi. Para ele, a missão dos profetas pode ser resumida nos verbos “denunciar” e “anunciar”, ou seja, a denúncia contra os poderes que dominam e oprimem o povo e o anúncio da Boa Nova.
No caso do livro do Apocalipse, o objetivo é denunciar o poderio e a tirania do império romano e anunciar que tempos melhores irão chegar se o povo se mantiver fiel à Palavra de Deus e ao testemunho de Jesus. Além disso, busca animar as pequenas comunidades, indicando que o Império Romano, embora poderoso, vai desaparecer, ao passo que as comunidades vão sobreviver porque perseveram e confiam em Deus.
“É neste sentido que o livro do Apocalipse se torna vivo e atual. Hoje, as perseguições são outras: os impérios continuam oprimindo, os poderosos continuam explorando os mais fracos, as comunidades resistem e muitos irmãos pagam com o martírio da própria vida por causa da sua fidelidade ao Reino de Deus e sua fé no testemunho de Jesus de Cristo. Então a profecia do Apocalipse e sua mensagem podem ser atualizadas para a realidade de hoje e servir para animar e trazer esperança para a comunidades cristãs que resistem e perseveram diante das crises e dificuldades”, manifesta o professor.
Dicas de leitura
Entre as dicas de leitura, Rossi salienta a necessidade de um profundo compromisso com a Palavra de Deus. “O fiel que não lê a Bíblia não se alimenta e, por isso, fraco, pode ser arrastado para doutrinas que não são bíblicas e estranhas à Igreja”, afirma.
O professor sugere ainda a organização de grupos de reflexão bíblica e motiva o investimento de tempo para estudar as Escrituras. “Faça também cursos de especialização em Bíblia, ou de atualização bíblica”, indica.
A nível individual, Rossi orienta a separar diariamente um tempo devocional para, individualmente, ler a Bíblia e orar. “Tenha sempre ao seu lado, além da Bíblia, alguns livros que ajudem a explicar o contexto em que os livros foram escritos e também explicar o próprio texto bíblico. Mas, acima de tudo, apaixone-se pelas Sagradas Escrituras e, a partir dela, a maturidade, a espiritualidade e o compromisso com Jesus Cristo aumentarão”, conclui.