Há um ano, explosão no porto de Beirute se somou à crise que o Líbano já vivia; Dom Edgar Madi destaca esperança de futuro
Thiago Coutinho
Da redação
Há exatamente um ano, o Líbano sofria um golpe fatal em sua já frágil situação: uma explosão em um galpão contendo 2570 toneladas de nitrato de amônio destruiu prédios, casas e o comércio local. Foi considerada a maior explosão não nuclear da história.
O povo libanês já vinha sofrendo com a escassez de alimentos, medicamentos, combustível, energia elétrica e a desvalorização da moeda nacional. Essa tem sido a pior crise econômica já vista no país. E ainda enfrenta-se a pandemia de Covid-19.
“A crise que os libaneses passam hoje é a maior de sua história. Os bancos sequestraram o capital do povo. Um sistema bancário que era confiável, hoje passa por uma crise muito grande”. Quem comenta é o arcebispo Maronita no Brasil, Dom Edgard Madi.
Além desta crise monetária, o bispo lembra que há uma desvalorização da moeda libanesa, que perdeu mil vezes seu valor. “É uma situação muito difícil. Há ainda a pandemia, que piorou a situação econômica”, comenta.
“Trata-se de uma economia baseada basicamente no dólar. Além disso, é um país que depende muito de importação, com uma economia pouco dinâmica, o que faz com que os preços subam. Por isso o risco inflacionário deles se tornou uma coisa gigantesca”, explica o especialista em Política e Relações Internacionais, Fábio Cervezão.
O especialista acrescenta que, somado a isso, o governo começou a impor impostos para aumentar a arrecadação do país, o que acabou gerando insatisfação popular. “Ainda teve a pandemia. Ou seja, é um país mergulhado em problemas”, pontua Fábio.
Crise política
A crise política é outro fator que afeta os libaneses. O cenário é marcado por escândalos envolvendo casos de corrupção e inércia diante de diversas crises. “Existe enriquecimento ilícito, corrupção etc. Dizem até que o Líbano pode se tornar uma nova Venezuela. Mudanças políticas no Oriente Médio são muito complicadas. O Líbano é um exemplo de democracia participativa, mas vemos que isso não está sendo efetivado”, pondera Cervezão.
Após a Guerra Civil, que durou de 1975 a 1990, um governo de coalizão foi formado no Líbano. Definiu-se que o presidente deve ser cristão maronita, o primeiro-ministro, muçulmano sunita e o presidente do parlamento, muçulmano xiita.
“Todos se sentam à mesa e é definido cada qual com seu cargo. Como se tem uma diversidade religiosa — é um país com muitos muçulmanos, mas também muitos cristãos — dá ares de uma democracia participativa, mas eles não conseguem se acertar”, detalha Cervezão.
Muitas manifestações chegaram a pedir a intervenção da França (na partilha do Oriente Médio, os líderes políticos parisienses ficaram responsáveis pela região). “É um cenário bem nebuloso. Um misto de risco inflacionário, que já é muito severo, e lideranças políticas que têm dificuldade de acertar os ponteiros”, afirma o especialista em Política e Relações Internacionais.
Apelo do Papa e esperança
O Papa Francisco, sensível a todos os imbróglios que afligem o povo libanês, chegou a decretar, no início de julho, um Dia de Reflexão e Oração pela nação. “O Papa quis chamar a atenção da comunidade internacional e estabelecer uma ligação entre seres humanos e Deus. Ele colocou esperança no coração do povo libanês”, ponderou o bispo.
Dom Edgard recorda que o Papa Francisco frisou em sua mensagem ao Líbano que a vida de Jesus Cristo não acabou em Sua morte. “A morte não era a última cena da vida de Jesus”, enfatiza o bispo maronita.
“O país já passou por muitas crises e as superou. Temos esperanças que a União Europeia, os países árabes e a comunidade internacional percebam que o Líbano não pode morrer. Por isso, para mim, o Líbano hoje é um país ferido, sangrando, mas que vai superar pela intercessão de todos os santos e de Deus”, finaliza Dom Edgar.