Combate ao Bullying e à Violência

Professoras e psicólogo alertam sobre bullying e violência nas escolas

Brasil recorda, neste domingo, dia de combate ao bullying e à violência na escola. Para soluções, especialistas ressaltam papel de pais e educadores

Julia Beck,
Da redação

Segundo o psicólogo, Gleisson Andrade, o bullying afeta diretamente a autoestima do indivíduo/ Foto: Daniel Mafra/ Arquivo CN

No Brasil, desde 2016, o dia 7 de abril é considerado o Dia Nacional de Combate ao Bullying e à violência na Escola. A data recorda o massacre em uma escola do bairro Realengo, no Rio de Janeiro, ocorrido no dia 7 de abril de 2011, em que 12 crianças foram assassinadas a tiros por um ex-aluno que teria enfrentado, na infância, situações de bullying.

Oito anos após “o massacre de Realengo”, como ficou conhecido, o país vivenciou no dia 13 de março deste ano, 2019, “o massacre de Suzano”. Dois jovens encapuzados entraram na Escola Estadual Professor Raul Brasil, em Suzano, atirando. Na ação, 8 pessoas foram mortas. Em seguida, os atiradores cometeram suicídio.

Veículos oficiais na escola Raul Brasil, após a tragédia/ Foto: REUTERS -Amanda Perobelli

Com um histórico de bullying e violência, o Brasil soma resultados negativos de pesquisas relacionadas ao tema nas escolas. Em 2013, uma pesquisa global da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) colocou o Brasil no topo de um ranking de violência em escolas. Em 2016, uma pesquisa realizada pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), em parceria com o Ministério da Educação e a Organização dos Estados Interamericanos (OEI), concluiu que no país, a violência atinge 42% dos alunos da rede pública. Os dados englobaram também violência verbal e agressão por meio digital.

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Os resultados das pesquisas são alarmantes e mostram a realidade de muitas instituições de ensino do Brasil. “Infelizmente o bullying é algo presente na escola”, afirmou a professora Cláudia Côrrea, que atua na rede estadual de ensino em município do interior de São Paulo e diz já ter presenciado situações de bullying e violência. Assim como Cláudia, a também professora Maria Angelina Umberto afirma já ter visto acontecimentos semelhantes: “Já presenciei”.

Para o psicólogo Gleisson Andrade, a prática do bullying foi e ainda é negligenciada. “Frases como ‘na minha época a gente brincava assim’, ou então ‘a gente chamava de gordo mesmo e ninguém morria’, são muito comuns e ainda se perpetuam. A escola como espaço de educação e na maioria das vezes como promotora do primeiro contato que a criança tem com a sociedade deve estar sempre atenta, pois sua omissão pode legitimar esta prática. É no ambiente escolar, com a intervenção de profissionais qualificados, que regras são internalizadas e também valores como respeito, empatia e solidariedade”, frisou.

Segundo Andrade, tanto o bullying quanto a violência são fatores que estão interligados já que o primeiro é um fator que gera a violência. “Estamos acostumados a entender a violência apenas em seu aspecto físico, mas ela engloba gestos obscenos, piadas depreciativas, posturas invasivas e privação de direitos. Sendo assim, os dois fatores compõe um círculo ‘vicioso’, os índices de violência diminuiriam se o que os sustenta fosse exterminado”, revelou.

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“Quando o bullying acontece a reação é a violência”, comentou a professora Cláudia. De acordo com a docente, a aprendizagem é um dos fatores prejudicados pela prática que gera, além da violência, em alguns casos, o abandono escolar. Para o psicólogo, o bullying afeta diretamente a autoestima do indivíduo, pois na maioria dos casos as palavras dirigidas à pessoa ferem profundamente sua autoimagem. “Além disto, problemas como ansiedade e depressão podem ser acarretados à vida da pessoa que se encontra em sofrimento. Por vezes, as vítimas não demonstram ser alvo das ações agressivas, mas comportamentos como timidez e apatia são frequentemente observados nestes casos”.

A respeito do destaque dado pela mídia aos casos de violência nas escolas, o psicólogo pondera: “Acredito que falar dos casos é necessário, mas a forma sensacionalista como são divulgados parece despertar novas ideias sobre a prática. Sou extremamente contra a veiculação de vídeos e correntes que mostram a violência explícita, ‘fogo não é apagado com gasolina, mas com água!’”.

Sobre os fatores que podem levar crianças e adolescentes a praticarem o bullying e a violência, Andrade alerta: “Como diria Paulo Freire, ‘o oprimido quer se tornar um opressor’. Em muitos casos, o bullying só é perpetuado por ser aprendido e reproduzido. Crianças crescem e sofrem influência do meio em que se encontram, sendo assim, a prática será vista como algo ‘normal’ que acontece em vários lugares”.

“Percebemos nos alunos que praticam [o bullying] a dificuldade de se colocarem no lugar do outro. Vemos crianças quietas demais, crianças isoladas, outras com muito rancor e agressividade, e isso afeta no desenvolvimento intelectual e emocional do aluno, muitas vezes ele não consegue fazer trabalhos em grupo, ele não consegue trabalhar com o outro”, relata a professora Maria Angelina.

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Combatendo a prática

Para as docentes, é papel da escola e dos professores a prevenção e a atenção ao que acontece no ambiente escolar. “É preciso também fazer a interferência o quanto antes para solucionar o problema”, opina Cláudia. Para Maria Angelina, a instituição educacional precisa criar um ambiente de confiança e acolhimento, para que o aluno fale e coloque suas angústias com um grupo ou com pessoas em quem ele tenha confiança.

Dentro da realidade de bullying e violência, o psicólogo afirma que os pais devem sempre observar o comportamento dos filhos. “Crianças são, por natureza, cheias de energia. Quando um adolescente ou criança se retrai e se comporta de forma diferente que destoa de um parâmetro conhecido pela família, os pais devem se atentar uma vez que zelam pelo bem-estar e integridade deste filho”.

A maior participação dos pais na vida escolar dos filhos foi apontada pelas professoras como uma importante estratégia de prevenção destes tipos de situações. “Sempre falamos para os pais nas reuniões para que venham até a escola, que dividam conosco coisas que muitas vezes não estamos sabendo”, revela Maria Angelina.

O amparo de profissionais de psicologia no ambiente escolar seria, segundo Andrade, uma forma de aumentar a chance de obtenção de êxitos em planos e projetos de prevenção da violência. “Profissionais da Psicologia têm formação para ter um olhar diferenciado, que vai além da superficialidade, ou seja, a forma de compreender é ampla. Através de técnicas e aparatos teóricos, psicólogos trabalhariam com orientação aos alunos, pais, professores, enfim, com toda a equipe de gestão escolar”, concluiu.

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