Greve não foi unanimidade; várias pessoas foram impedidas de chegar aos locais de trabalho por falta de transporte
Reuters
A greve geral realizada nesta sexta-feira, 28, para protestar contra as reformas trabalhista e da Previdência teve como ponto principal a adesão dos trabalhadores dos transportes públicos e manifestações e bloqueios em importantes vias de diversas cidades do país.
O movimento foi marcado também por confrontos violentos, que começaram logo cedo e atingiram seu pico no início da noite, no Rio de Janeiro, onde pelo menos oito ônibus foram incendiados, com carros e lojas depredados. Em São Paulo, houve tumulto em frente à residência do presidente Michel Temer, que estava em Brasília.
Segundo as centrais sindicais, além dos funcionários dos transportes públicos, também aderiram à paralisação portuários, aeroviários, professores, petroleiros, metalúrgicos e bancários, entre outros trabalhadores.
“Acho que essa greve tinha que ter parado tudo e ninguém vir. A reforma trabalhista não tem que ser como eles estão querendo fazer e a reforma da Previdência também, a gente morre e não aposenta”, disse Lurdes da Silva, auxiliar de limpeza em São Paulo, de 51 anos, que teve problemas para pegar o trem a caminho do trabalho.
Mas a paralisação não foi unanimidade. Várias pessoas que tentavam chegar a seus locais de trabalho reclamavam da falta de transporte.
“Greve? Eu preciso trabalhar. O pessoal está com medo é de perder o emprego, a gente que tem trabalho tem mais é que agradecer todo dia”, disse Michelle Barbosa, funcionária de uma padaria que abriu normalmente no centro do Rio.
Os serviços de metrô, trem e ônibus de São Paulo estavam paralisados no início da manhã, apesar de decisões judiciais obtidas pela prefeitura e o governo do Estado que determinavam o funcionamento de ao menos um percentual do sistema de transporte coletivo, sob pena de multa em casos de descumprimento.
O metrô voltou a funcionar parcialmente ao longo da manhã, assim como os trens urbanos. Os ônibus não estavam circulando, com exceção dos micro-ônibus que prestam serviços locais.
Grandes avenidas foram bloqueadas logo cedo em São Paulo, assim como no Rio de Janeiro, incluindo a Ponte Rio-Niterói.
No final da tarde, ocorreram grandes manifestações em São Paulo, onde os organizadores calcularam em 70 mil os participantes, e no Rio de Janeiro.
Avaliações divergentes
Sindicalistas comemoraram os resultados da greve, com o presidente da Força Sindical, o deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP), o Paulinho da Força, estimando a adesão em 40 milhões de trabalhadores, no que seria a maior paralisação em duas décadas.
“O recado foi dado. O governo agora terá oportunidade de abrir negociações para fazer uma reforma justa e civilizada”, disse Paulinho a jornalistas. A CUT não fez uma estimativa com números, dizendo que todos aderiram à paralisação.
O governo, por sua vez, considerou o movimento “pífio”.
“Não há nem direito o que avaliar. Há uma tranquilidade no país”, disse à Reuters o ministro da Justiça, Osmar Serraglio. “Houve o chamado para uma ‘greve geral’, que é uma coisa para impressionar, mas foi um movimento pífio. Está tudo funcionando, os serviços, a indústria.”
À noite, Temer divulgou nota em que lamentou os atos de violência e bloqueios em ruas e estradas, e garantiu que as reformas seguirão em frente.
“O trabalho em prol da modernização da legislação nacional continuará, com debate amplo e franco, realizado na arena adequada para essa discussão, que é o Congresso Nacional”, disse o presidente, na nota.
Cientistas políticos ouvidos pela Reuters, no entanto, disseram que não se pode desprezar o impacto desta sexta-feira na tramitação das reformas.
“Isso bate no Congresso, isso de alguma forma sensibiliza deputados e senadores? Sim, porque eles percebem que há uma mobilização de setores da sociedade de contrariedade”, disse o cientista político do Insper Carlos Melo. “Vamos lembrar que a gente esta às vésperas de um ano eleitoral.”
Visões sobre a reforma
O dia de paralisações ocorreu na mesma semana em que a Câmara dos Deputados aprovou o projeto de reforma trabalhista que tem como eixo principal a prevalência dos acordos e negociações sobre a legislação vigente, e em meio à tramitação da reforma da Previdência.
A reforma trabalhista também retira a obrigatoriedade da contribuição sindical, o que tem sido apontado como um enfraquecimento das centrais sindicais.
O cientista político e professor da Universidade de Brasília (UnB) Flávio Britto considerou justamente a questão da contribuição sindical como “pano de fundo que vejo que está por trás da mobilização de hoje”.
A greve geral foi convocada como protesto contra ambos os projetos, alegando que vão tirar direitos e prejudicar os trabalhadores, enquanto o governo defende que as duas reformas são fundamentais para a recuperação econômica do país, que enfrenta a pior recessão da história.
“É um movimento legítimo, apesar de muitas pessoas tentarem esvaziar esses movimentos por uma questão ideológica”, disse a advogada Eduarda Bolso, que foi trabalhar normalmente no centro do Rio. “No fundo acho que o panorama não tem outro jeito. Chegou a um extremo, acho que é a única maneira de realmente enxergarem o quão grave é a situação política atual do país.”