CATEQUESE
Praça São Pedro – Vaticano
Quarta-feira, 20 de abril de 2016
Boletim da Santa Sé
Tradução: Jéssica Marçal
Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
Hoje queremos nos concentrar em um aspecto da misericórdia bem representado pelo trecho do Evangelho de Lucas que ouvimos. Trata-se de um fato acontecido a Jesus enquanto era hóspede de um fariseu de nome Simão. Este quis convidar Jesus à sua casa porque tinha ouvido falar bem Dele como de um grande profeta. E enquanto se encontram sentados à mesa, entra uma mulher conhecida por todos na cidade como uma pecadora. Esta, sem dizer uma palavra, coloca-se aos pés de Jesus e cai aos prantos; as suas lágrimas banham os pés de Jesus e ela as enxuga com os seus cabelos, depois lhe beija e lhe unge com um óleo perfumado que levou consigo.
Ressalta o confronto entre as duas figuras: aquela de Simão, o zeloso servidor da lei, e aquela da pecadora anônima. Enquanto o primeiro julga os outros com base nas aparências, a segunda, com os seus gestos, exprime com sinceridade o seu coração. Simão, mesmo tendo convidado Jesus, não quer se comprometer nem envolver a sua vida com o Mestre; a mulher, ao contrário, se confia plenamente a Ele com amor e com veneração.
O fariseu não concebe que Jesus se deixe “contaminar” pelos pecadores. Ele pensa que se fosse realmente um profeta deveria reconhecê-los e manter-se distante para não ser manchado, como se fossem leprosos. Essa atitude é típica de um certo modo de entender a religião e é motivado pelo fato de que Deus e o pecado se opõem radicalmente. Mas a Palavra de Deus nos ensina a distinguir entre o pecado e o pecador: com o pecado não se deve ter compromisso, enquanto os pecadores – isso é, todos nós! – são como os doentes, que precisam ser curados, e para curá-los é preciso que o médico se aproxime deles, visite-os, toque-os. E, naturalmente, o doente, para ser curado, deve reconhecer ter necessidade do médico!
Entre o fariseu e a mulher pecadora, Jesus se une a esta última. Jesus, livre de preconceitos que impedem a misericórdia de se exprimir, deixa-a fazer. Ele, o Santo de Deus, deixa-se tocar por ela sem temor de ser contaminado. Jesus é livre, porque próximo a Deus que é Pai misericordioso. E esta proximidade a Deus, Pai misericordioso, dá a Jesus a liberdade. Antes, entrando em relação com a pecadora, Jesus coloca fim àquela condição de isolamento a que o julgamento impiedoso do fariseu e dos seus concidadãos – que a exploravam – a condenava: “Os teus pecados estão perdoados” (v.48). A mulher agora pode seguir “em paz”. O Senhor viu a sinceridade da sua fé e da sua conversão; por isso, diante de todos, proclama: “A tua fé te salvou” (v. 50). Por um lado, aquela hipocrisia do doutor da lei, por outro lado, a sinceridade, a humildade e a fé da mulher. Todos nós somos pecadores, mas tantas vezes caímos na tentação da hipocrisia, de acreditarmos ser melhores que os outros e dizemos: “Olha o teu pecado…”. Todos nós devemos, em vez disso, olharmos para o nosso pecado, as nossas quedas, os nossos erros e olhar para o Senhor. Esta é a linha da salvação: a relação entre o “eu” pecador e o Senhor. Se eu me sinto justo, esta relação de salvação não se dá.
Nesse ponto, um espanto ainda maior atinge os que estão à mesa: “Quem é este que perdoa até os pecados?” (v. 49). Jesus não dá uma resposta explícita, mas a conversão da pecadora está diante dos olhos de todos e demonstra que Nele resplandece o poder da misericórdia de Deus, capaz de transformar os corações.
A mulher pecadora nos ensina a ligação entre fé, amor e reconhecimento. Foram-lhe perdoados “muitos pecados” e por isso ama muito; “em vez disso aquele ao qual se perdoa pouco, ama pouco” (v. 47). Também o próprio Simão deve admitir que ama mais aquele ao qual foi condenado mais. Deus inclui todos no mesmo mistério de misericórdia; e deste amor, que sempre nos precede, todos nós aprendemos a amar. Como recorda São Paulo: “Em Cristo, mediante o seu sangue, temos a redenção, o perdão das culpas, segundo a riqueza da sua graça. Ele a derramou em abundância sobre nós” (Ef 1, 7-8). Neste texto, o termo “graça” é praticamente sinônimo de misericórdia e é dita “abundante”, isso é, além da nossa expectativa, porque atua o projeto salvífico de Deus por cada um de nós.
Queridos irmãos, somos reconhecidos pelo dom da fé, agradeçamos ao Senhor pelo seu amor assim grande e imerecido! Deixemos que o amor de Cristo se derrame em nós: neste amor o discípulo se baseia e se funda; deste amor cada um pode se alimentar e alimentar. Assim, no amor reconhecido que derramamos sobre nossos irmãos, nas nossas casas, em família, na sociedade se comunica a todos a misericórdia do Senhor.