noticias.cancaonova.com: Falar em código de Direito Canônico, parece algo distante, o que na prática ele representa para os católicos?
Padre Vicente: "Toda Sociedade que se organiza tem necessidade de um Ordenamento Jurídico, isto é, um corpo de leis que regulem e disciplinem a vida e a convivência de seus membros. Então o Código de Direito Canônico, para a Igreja Católica, para os católicos, se constitui neste corpo de leis reguladoras e disciplinadoras da vida e da convivência social. Trata-se, portanto, de um conjunto de normas que amplamente estabelecem e prevêem as diversas situações, com normas gerais para todos e especificas sobre as articulações da vida social e das atividades da Igreja. Permitam-me aqui usar citando, como muito bem exprimiu o Papa João Paulo II, de feliz memória, “… objetivo do Código de Direito Canônico não é, de forma alguma, substituir, na vida da Igreja e dos fieis, a fé, a graça, os carismas, nem muito menos a caridade. Pelo contrário, sua finalidade é, antes, criar na sociedade eclesial uma ordem que, dando a primazia ao amor, à graça e aos carismas, facilite ao mesmo tempo seu desenvolvimento orgânico na vida, seja da sociedade eclesial, seja de cada um de seus membros”. Poder-se-ia perguntar: Normas, não bastariam os Evangelhos? Responde-se que o ser humano tem necessidade de leis postivisadas, ou seja, normas que obriguem, regulem e disciplinem, são imperativas na vida social dos fieis e de cada um individualmente, pois os Evangelhos são anúncio de salvação e não têm a força de obrigar, regulando e disciplinando a vida e a convivência. Como se pode ver, o Código tem um fim pastoral, existe para a pastoal".
noticias.cancaonova.com: Quando surgiu o Código, e porque? Era para responder a quais necessidades da Igreja?
Padre Vicente: "O Código de Direito Canônico surgiu na solenidade de Pentecostes do ano de 1917, fruto de uma pesquisa apurada e reunião das muitas leis, decretos, Bulas Papais e outros documentos existentes até então. E o Código, atendendo as necessidades de uma Igreja mais organizada, também pela necessidade de consagrar aquelas normas já existentes e expurgar aquelas que não respondiam mais às necessidades. Havia o imperativo de revisão e codificação das esparsas normas, dando forma unitária e orgânica ao Direito Canônico, à imitação do que já haviam realizado os códigos civis, Então o Papa São Pio X, em 19 de março de 1904 decretou e organizou os trabalhos de codificação e nomeou uma Comissão Pontifícia de Cardeais com uma junta de Consultores para elaborar o Código e torna-lo mais orgânico. Foi um trabalho de mais de mais de treze anos árduos, com consulta aos Bispos do mundo inteiro. E em 27 de maio de 1917, sendo já Papa Bento XV promulgou o Código que entrou em vigor no dia 19 de maio de 1918. Em 1959, dada a necessidade de uma revisão requerida pela Igreja do mundo inteiro, o Papa João XXIII, ao convocar o Concílio Ecumênico Vaticano II decidiu também pela revisão do Código. A exemplo do Código de 1917, o Código de Direito Canônico atual foi revisto por uma Comissão Pontifícia de Cardeais, com varias comissões de consultores e com consultas aos Bispos do mundo inteiro. Depois um trabalho de longos anos, mais de vinte, em 25 de janeiro de 1983, o Papa João Paulo II promulgou o novo Código e este entrou em vigor no primeiro dia do Advento do mesmo ano. A revisão do Código se fazia necessária para adequar as normas à realidade atual, da vida e da convivência da sociedade e de cada um individualmente".
noticias.cancaonova.com: E a Lei da Igreja, o que mudou com a vinda do Novo Código? O que mudou?
Padre Vicente: "Muitas normas foram aprimoradas, algumas suprimidas por estarem em desuso e outras acrescentadas para atender à realidade da vida em sociedade e individualmente nos tempos pós-modernos. O Código recebeu uma estrutura mais orgânica e unitária, distribuindo melhor as diversas matérias em que a lei tem como função regular e disciplinar. Uma das mudanças foi a melhor adequação do Código à realidade atual. Sobressai-se como mudança de destaque a presença no Código do Estatuto dos direitos e deveres dos fieis cristãos, tantos clérigos como leigos, que no Código anterior tinha muitas lacunas. Assim sendo, hoje o Código apresenta normas claras sobre os direitos e deveres dos fiéis cristãos, normas tão importantes para os dias atuais".
noticias.cancaonova.com: O que é mais importante no seu conteúdo? Quais são os pontos mais polêmicos?
Padre Vicente: "Primeiramente, uma normatização com princípios codificadores modernos, obedecendo a um método rigorosamente científico. Segundo, o Código oferece, como não podia ser diferente, uma imagem da Igreja do ponto de vista normativo, muito mais accessível ao povo, pois horizontaliza, isto é, mostra e revela claramente a igualdade de todos os fieis cristãos, sem distinção de quem quer que seja. Acrescente-se que definiu melhor quem é o Povo de Deus, trouxe e enriqueceu a doutrina sobre os sacramentos e definiu melhor o múnus de ensinar na Igreja, com conteúdo muito rico. Existem algumas normas polemicas. Mas, ser polemico não significa equívoco. O equívoco pode estar em quem polemiza ou não foi capaz de assimilar todas as normas. Como exemplo de polêmico, pode-se citar as normas sobre sanções na Igreja. Mas, polêmica irrelevante, porque ao ser humano não agrada normas que restrinjam direitos ou os suprime, impondo deveres. Foi sempre assim, mas nem por isso as normas sancionadoras de penas podem ser suprimidas, porque garantem a ordem social e a conduta individual"
noticias.cancaonova.com: Daqui pra frente, o Papa Bento deve fazer alguma mudança e qual seria?
Padre Vicente: "Não existe nenhum projeto ou pensamento de mudança, a menos que esteja eu desinformado. As leis têm necessidade de acompanhar as necessidades da vida social e individual. Mas, são posteriores, pois a vida social sendo dinâmica, o direito também o é, porque o agir segue o ser e a lei tem como fim regular conduta já existente. Apenas as normas processuais sobre beatificação dos Servos de Deus respeita uma nova sistemática, ou seja, o processo está a depender mais do seu trâmite na fase diocesana e definido nesta mesma fase. Não se pode esquecer que o Espírito Santo preside as cabeças das pessoas que têm a missão de governo na Igreja e Ele nunca as deixará desastidas para que governem com sabedoria e prudência, como prometeu o divino fundador da Igreja, Nosso Senhor Jesus Cristo. Farão mudanças quando forem necessárias, certamente".
Padre Vicente: "Agradeço a oportuna entrevista e a oportunidade de oferecer minha simples contribuição neste dia 25 de janeiro, comemoração do 25º ano da promulgação do Código de Direito Canônico revisto e da celebração da conversão de São Paulo, o Apostolo das gentes. Deus continue abençoando a Canção Nova".