CATEQUESE
Praça São Pedro – Vaticano
Quarta-feira, 1º de março de 2017
Boletim da Santa Sé
Tradução livre: Jéssica Marçal
Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
Neste dia, Quarta-Feira de Cinzas, entramos no tempo litúrgico da Quaresma. E já que estamos desenvolvendo o ciclo de catequeses sobre esperança cristã, hoje gostaria de apresentar-vos a Quaresma como caminho de esperança.
De fato, esta perspectiva é logo evidente se pensamos que a Quaresma foi instituída na Igreja como tempo de preparação para a Páscoa e, portanto, todo o sentido deste período de quarenta dias é iluminado pelo mistério pascal para o qual é orientado. Podemos imaginar o Senhor Ressuscitado que nos chama a sair das nossas trevas e nós nos colocamos em caminho para Ele, que é a Luz. E a Quaresma é um caminho para Jesus Ressuscitado, é um período de penitência, também de mortificação, mas não com fim em si mesmo, mas sim finalizado a nos fazer ressurgir com Cristo, a renovar a nossa identidade batismal, isso é, renascer novamente “do alto”, do amor de Deus (cfr Jo 3, 3). Eis porque a Quaresma é, por sua natureza, tempo de esperança.
Para compreender melhor o que isso significa, devemos nos referir à experiência fundamental do êxodo dos israelitas do Egito, contada pela Bíblia no livro que leva este nome: Êxodo. O ponto de partida é a condição de escravidão no Egito, a opressão, os trabalhos forçados. Mas o Senhor não esqueceu o seu povo e a sua promessa: chama Moisés e, com braço forte, faz os israelitas sair do Egito e os guia pelo deserto para a Terra da liberdade. Durante este caminho da escravidão à liberdade, o Senhor dá aos israelitas a lei, para educá-los a amá-Lo, como único Senhor, e a amar-se entre eles como irmãos. A Escravidão mostra que o êxodo é longo e turbulento: simbolicamente dura 40 anos, isso é, o tempo de vida de uma geração. Uma geração que, diante das provações do caminho, é sempre tentada a lamentar-se pelo Egito e voltar atrás. Também todos nós conhecemos a tentação de voltar atrás, todos. Mas o Senhor permanece fiel e aquele pobre povo, guiado por Moisés, chega à Terra prometida. Todo esse caminho é cumprido na esperança: a esperança de chegar à Terra e justamente nesse sentido é um “êxodo”, uma saída da escravidão à liberdade. E esses 40 dias são também para todos nós uma saída da escravidão, do pecado, à liberdade, ao encontro com o Cristo Ressuscitado. Cada passo, cada cansaço, cada prova, cada queda e cada retomada, tudo tem o sentido interno do desígnio de salvação de Deus, que quer para o seu povo a vida e não a morte, a alegria e não a dor.
A Páscoa de Jesus é o seu êxodo, com o qual Ele nos abriu o caminho para chegar à vida plena, eterna e bem aventurada. Para abrir este caminho, esta passagem, Jesus precisou despojar-se da sua glória, humilhar-se, fazer-se obediente até a morte e a morte de cruz. Abrir-nos o caminho da vida eterna lhe custou todo o seu sangue e graças a Ele nós fomos salvos da escravidão do pecado. Mas isso não quer dizer que Ele fez tudo e nós devemos fazer nada, que Ele passou pela cruz e nós vamos ao paraíso de carruagem. Não é assim. A nossa salvação certamente é dom seu, mas, uma vez que é uma história de amor, requer o nosso “sim” e a nossa participação no seu amor, como nos demonstra a nossa Mãe Maria e depois dela todos os santos.
A Quaresma vive dessa dinâmica: Cristo nos precede com o seu êxodo e nós atravessamos o deserto graças a Ele e atrás Dele. Ele foi tentado por nós e venceu o Tentador por nós, mas também nós devemos, com Ele, enfrentar as tentações e superá-las. Ele nos dá a água viva do seu Espírito e a nós cabe buscar a sua fonte e beber, nos Sacramentos, na oração, na adoração; Ele é a luz que vence as trevas e a nós é pedido para alimentar a pequena chama que nos foi confiada no dia do nosso Batismo.
Neste sentido, a Quaresma é “sinal sacramental da nossa conversão” (Missal Romano, Oraç. Coleta I Dom. de Quar.); quem faz o caminho da Quaresma está sempre no caminho da conversão. A Quaresma é sinal sacramental do nosso caminho da escravidão à liberdade, sempre a renovar. Um caminho difícil, como é justo que seja, porque o amor é um desafio, mas um caminho cheio de esperança. Ou melhor, direi mais: o êxodo quaresmal é o caminho em que a própria esperança se forma. O cansaço de atravessar o deserto – todas as provações, as tentações, as ilusões, as miragens…tudo isso serve para formar uma esperança forte, sólida, segundo o modelo da Virgem Maria, que em meio às trevas da paixão e da morte do seu Filho continuou a acreditar e a esperar na sua ressurreição, na vitória do amor de Deus.
Com coração aberto a este horizonte, entramos hoje na Quaresma. Sentindo-nos parte do povo santo de Deus, comecemos com alegria este caminho de esperança. Obrigado.