Uma oração noite adentro como uma luz na escuridão, um ato de fé dos membros da Pastoral de Rua, uma súplica a Deus para que ilumine os caminhos, as esquinas e becos a serem percorridos e os irmãos que serão encontrados.
Formada por homens e mulheres diferentes em tudo, mas unidos pela mesma causa e com um mesmo propósito: a solidariedade. São pessoas dispostas a encontrar, alimentar, cuidar e amar o Amor que não é amado. Um Amor que, transfigurado em um ser humano, está escondido nas roupas sujas e rasgadas e esquecido embaixo de casas de papelão, vivendo nas ruas entre lágrimas e sorrisos, com nomes e sentimentos.
Nas ruas, a pequena van que leva a solidariedade é reconhecida de longe pelos pobres caminhantes que vagam sem destino e sem esperança. Dentro dela, homens e mulheres, que insistem em amar o próximo – ação incomum nos dias de hoje –, percorrem as cidades de Guaratinguetá e Aparecida, no interior de São Paulo, para fazer o bem.
O caminho escolhido para chegar até as pessoas em situação de rua é estreito, cheio de desafios e superação. Nessa jornada, não há espaço para o preconceito; é necessário não se deixar levar pelas aparências, para não tirar conclusões precipitadas.
Durante o percurso, são encontradas pessoas desfiguradas pelas drogas, pelos sofrimentos e problemas psicológicos, mas que, mesmo diante das dificuldades do dia a dia, não desistem de viver.
O trabalho da Pastoral de Rua não é simples e exige uma completa entrega de cada um dos seus oito membros. Além de proporcionar o alimento que sustenta o corpo, levar comida a quem tem fome, é preciso levar também o alimento que sustenta a alma: o amor.
O verdadeiro amor exige atos concretos. Há dois anos percorrendo as ruas e levando amor a quem não é amado, a quem está excluído e esquecido, os membros dessa pastoral dão um belo exemplo em cada uma de suas ações. O olhar atento no meio da noite, determinado a encontrar qualquer irmão que esteja se escondendo do frio ou de uma sociedade indiferente.
É o mesmo olhar que vê, na casa improvisada com pedaços de madeira e restos de uma porta velha, o doce lar de uma vida passageira e momentaneamente amarga. Escondida em seu casebre, a pobre mulher aos prantos pensa em seu consorte, sua grande paixão e companheiro na sorte, que mais uma vez, como todas as outras vezes, a trocou pelo vício.
Ou o acolhimento do pobre homem, andarilho, que se perde na noite à procura de não se sabe o quê. Acostumado com olhares de indiferença e rejeição, sorri para o desconhecido, que piamente olha nos olhos dele, tentando entender toda a situação.
A experiência vivida dentro dessa pastoral é única, difícil de imaginar e mais difícil ainda de se esquecer. Em uma sociedade incrédula de si mesma, é quase irreal ver o cuidado e o carinho para com o pobre lazarone que, debilitado por suas feridas, tem apenas o cão amigo para lhe fazer companhia. Entender o abraço fraterno e acolhedor, que ultrapassa as barreiras impostas pelo lugar indigno para um ser humano e pelas roupas sujas fedendo a urina, é quase impossível se não houver amor.
Por falta desse amor, as pessoas julgam aqueles que mais precisam ser amados, apontam-lhes o dedo por não conhecerem sua história. Em um mundo onde todas as pessoas se intitulam racionais e completamente sãs, o pobre André insiste em tratar todos como se fossem uma única pessoa, um André como ele, acolhedor, feliz e sonhador, que termina seu dia sorrindo, apesar do lugar que vai dormir e acordar. Para ele existe apenas o hoje; o amanhã a Deus pertence.
O amor é onde tudo começa e termina! Uma única noite foi o suficiente para que oito pessoas pudessem reconfortar 40 irmãos em situação de rua. O amor abundantemente oferecido por cada um dos membros da pastoral foi retribuído quase que de imediatamente com um sorriso, um gesto simples de carinho oferecido pelos pobres que foram ajudados.
É preciso lembrar, sempre, que fazer o bem faz bem e só exige de nós, no mínimo, um pouco de tempo!