Relatório

AIS alerta: cristianismo pode chegar ao fim em países do Oriente Médio

Relatório da AIS aponta que no Iraque 90% dos cristãos foram dizimados; atuação da comunidade internacional é questionada

Da redação, com AIS

Relatório foi apresentado nesta quarta-feira, 23/ Foto: AIS

A forte instabilidade no Oriente  Médio poderá acelerar o fim do cristianismo em países como a Síria e o Iraque, se a comunidade internacional não atuar rapidamente. Esta é uma das principais conclusões do Relatório “Perseguidos e Esquecidos?”, produzido pela Fundação Pontifícia Ajuda à Igreja que Sofre (AIS) e que foi divulgado nesta quarta-feira, 24, nas principais capitais europeias.

Em Lisboa, a sessão de apresentação deste Relatório, no Centro Nacional de Cultura, contou com a presença de Paulo Portas, ex-ministro dos Negócios Estrangeiros do país, que sublinhou a importância de o mundo não virar as costas a “este combate desigual” em defesa da comunidade cristã nesta região tão atribulada.

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“Temos o dever de lembrar às sociedades ocidentais que há muitos cristãos que são perseguidos, que não podem viver em liberdade, que uma parte da sua dignidade está capturada, que precisam ser lembrados, que precisam ser falados e uma maior atuação deve ser feita em sua defesa”, afirmou Portas.

Paulo Portas destacou os méritos do relatório produzido pela AIS: “Há muitos cristãos que são perseguidos em muitos países relevantes no mundo. Este relatório é uma enorme ajuda para que essa perseguição aos cristãos não fique em silêncio e não fique esquecida no conforto daqueles que não sentem essa perseguição”.

No entanto, parece que o mundo assiste com cumplicidade silenciosa à violência contra os cristãos que, em muitos lugares, não dá sinais de abrandar, apontou Portas. O relatório produzido pela AIS é categórico no que diz respeito ao Oriente Médio, onde é inegável “o impacto” da violência terrorista do Daesh:  “A presença dramaticamente reduzida” de cristãos ou de yasidis em diversas cidades ou vilas é um sinal claro da tentativa de genocídio que teve lugar durante os tempos em que vastas regiões do Iraque e da Síria caíram nas mãos do ‘califado’ jihadista”.

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Havia 1,5 milhões de cristãos no Iraque antes de 2003, mas em meados de 2019 esse número caiu para menos de 150 mil, havendo dados que apontam para menos de 120 mil. Trata-se de um declínio de cerca de 90% no curto espaço de tempo de uma geração. O mesmo se passa na Síria, onde o número de cristãos caiu cerca de dois terços desde o início do conflito em 2011.

Infelizmente, denuncia ainda a AIS, a Igreja “poderá desaparecer” se vier a ocorrer “outro ataque de responsabilidade de grupos islâmicos radicais” sobre as comunidades mais vulneráveis. Trata-se de uma ameaça credível baseada em relatos de jihadistas que escaparam da prisão. Uma ameaça que ganha novos contornos com a fuga, nos últimos dias, de centenas de jihadistas e seus familiares da prisão de Ain Issa, no Nordeste da Síria, após a intervenção militar da Turquia nesta região. Paulo Portas manifestou também a sua preocupação perante esta eventualidade: “Há o perigo do Daesh recuperar algum protagonismo. Será sempre um protagonismo letal”.

O Relatório da Fundação AIS sublinha que houve também uma degradação das condições de vida das minorias religiosas, isso inclui os cristãos, no Sul e Leste da Ásia e também na África. Portas sintetizou esta realidade afirmando que “há uma nova geografia de preocupações”.

Só no ano de 2017, por exemplo, foram relatados 477 incidentes contra as comunidades cristãs na Índia, instigadas essencialmente por um discurso nacionalista cada vez mais radical. Recorda-se que foi também nesta região, mais concretamente no Sri Lanka, que cerca de três centenas de pessoas perderam a vida e mais de 500 ficaram feridas na sequência de atentados contra três igrejas e outros lugares nas principais cidades do país no Domingo de Páscoa deste ano. As Filipinas foram outro país em que a comunidade cristã não escapou à violência jihadista.

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O Relatório da Fundação AIS revela um verdadeiro mapa de terror que transformou a vida de milhões de pessoas vítimas da intolerância religiosa. O continente africano não escapa a essa realidade. No período em análise, houve uma intensa violência contra a comunidade cristã. Em vários países africanos, os cristãos foram ameaçados por grupos radicais islâmicos que têm procurado eliminar a presença da Igreja. Na Nigéria, em especial na região norte e nordeste do país, os militantes jihadistas do Boko Haram continuam a desenvolver uma campanha de terror. Calcula-se que durante o ano de 2018, mais de 3700 cristãos foram mortos neste país.

A sessão de apresentação do relatório da Fundação AIS contou também com a presença do padre Gideon Obasogie, oriundo da diocese de Maiduguri, na Nigéria, um dos epicentros do terror do Boko Haram. O sacerdote testemunhou situações dramáticas vividas nos últimos anos pelas comunidades cristãs indefesas perante a brutalidade de um dos mais temíveis grupos terroristas da atualidade. Afirmando que “o terço tornou-se sua melhor arma”, padre Gideon acusou também a forma negligente como a comunidade internacional tem agido em defesa dos cristãos no seu país: “Há um silêncio estranho em que não se fala destas coisas”.

Agradecendo o trabalho da Fundação AIS no apoio à comunidade cristã na Nigéria, padre Gideon Obasogie defendeu que há muito a se fazer nas áreas mais atingidas pela violência terrorista. Reconstruir igrejas e capelas, seminários e estruturas de apoio social é fundamental, mas há algo mais urgente: “reconstruir a vida das pessoas”. Para isso, sublinhou o sacerdote nigeriano: “é preciso substituir sentimentos de ódio e vingança pela reconciliação”.

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Além da Nigéria, os radicais islâmicos tentam eliminar o cristianismo em outros países da África. Madagáscar, República Centro-Africana, Burkina Faso, Mali, Níger, Tanzânia, e agora, mais recentemente, até Moçambique, tornou-se parte do grupo de países onde crescem sinais de violência e intimidação.

Perante esta realidade, “é preciso denunciar”, diz Paulo Portas:  “É preciso denunciar o que acontece em algumas regiões do mundo, não deixar que o silêncio seja uma espécie de segunda condenação e esse é o trabalho que a AIS faz com o Vaticano, de dois em dois anos, com muitas dioceses que vivem em enormes dificuldades e com testemunhos que as vezes são confidenciais, já que as pessoas podem ser mortas”.

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