Reflexão

Dom Evaristo Spengler comenta data contra o Tráfico de Pessoas

Presidente da Comissão Episcopal Pastoral Especial para o Enfrentamento ao Tráfico Humano reforça que tráfico de pessoas é uma chaga aberta em uma sociedade sem empatia

Thiago Coutinho
Da redação

Dom Evaristo Spengler, presidente da Comissão Episcopal Pastoral Especial para o Enfrentamento ao Tráfico Humano (CEPEETH) da CNBB

Dom Evaristo Spengler / Foto: Franciscanos

Nesta segunda-feira, 8, celebra-se o Dia Internacional de Oração e Reflexão contra o Tráfico de Pessoas. O Papa Francisco, em uma mensagem em vídeo, reforçou o caráter desta data junto à sociedade contemporânea: dar um fim a este crime e promover uma economia que não use as pessoas com fins mercadológicos.

“O tráfico de pessoas é uma chaga aberta em uma sociedade sem empatia, que deixa o lucro nortear todas as suas ações”, critica Dom Evaristo Pascoal Spengler, que responde pela Comissão Episcopal Pastoral Especial para o Enfrentamento ao Tráfico Humano da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). “Nessa visão de mundo, movida pelo lucro, o ser humano é um mero objeto, do qual pessoas ou grupos podem se apropriar para gerar lucro”, reitera.

A Igreja, segundo Dom Evaristo, sempre se postou veementemente contra este fenômeno. No entanto, de acordo com o religioso, foi em 2008 que a CNBB, após um seminário em caráter nacional, com a participação dos Regionais de todo o país, resolveu articular esta luta de maneira mais organizada. “Em 2009, avançou-se com a criação de um Grupo de Trabalho (GT) específico para articular o enfrentamento ao tráfico de pessoas. Um dos grandes frutos do trabalho desse GT foi a Campanha da Fraternidade de 2014 com o tema ‘Fraternidade e Tráfico Humano’, que despertou a Igreja do Brasil a abraçar essa causa. Em 2016, deu-se um novo passo com a criação da Comissão Episcopal Pastoral para o Enfrentamento ao Tráfico Humano”, explicou.

Os aliados da Igreja

São diversos grupos dentro da Igreja que trabalham para pôr fim ao tráfico humano. Existe a Rede ‘Um Grito Pela Vida’, da Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB), a Cáritas Brasileira, O serviço Pastoral do Migrante, o Setor da Mobilidade Humana da CNBB entre outros.

“É importante frisar que a Igreja não faz o combate ao tráfico, isso pertence às forças de segurança do Estado. O trabalho do Estado compreende a prevenção, a repressão e a punição. A Igreja faz o enfrentamento. As principais ações da Igreja, nesse sentido, são a articulação com as diversas forças da sociedade; a capacitação de lideranças para atuarem no enfrentamento ao tráfico de pessoas; e atuar na prevenção, na incidência política e na denúncia. Muitos grupos da Igreja Católica fazem um belíssimo trabalho de acompanhamento às vítimas do tráfico”, advertiu Dom Evaristo.

Além desses esforços, a CNBB publicou um manual, “Orientações Pastorais sobre o Tráfico de Pessoas”, no qual disseca todo o assunto e o posicionamento cristão nesta batalha contra o tráfico humano. “Convido a todos os cristãos que ainda não sabem como se engajar na luta contra o tráfico de pessoas a conhecerem esse texto. Ele ilumina a ação pastoral da Igreja que se posiciona a favor da liberdade e da vida, com preciosas orientações práticas que podem ser aproveitadas pelos diversos grupos pastorais”, disse Dom Evaristo.

Mais igualdade social

Os órgãos internacionais, como a Organização das Nações Unidas (ONU) e mesmo a Igreja reconhecem que a desigualdade social é um dos principais fatores que propiciam o tráfico humano. “Com certeza, o alvo preferencial dos traficantes são os mais vulneráveis, entre eles migrantes e pessoas desempregadas”, alerta o religioso. “Sem dúvida, um país e um mundo com maior justiça social, com menos desigualdades, com pessoas estabilizadas, com direito a estudo, trabalho, moradia e renda, faria diminuir esse problema”, reitera.

Dom Evaristo, porém, afirma que a raiz deste mal é uma só: a busca pelo lucro exacerbado. “Enquanto o mundo deixar-se guiar pelo princípio do lucro e considerar a pessoa humana pelo que possui, sempre haverá aliciadores prometendo vida fácil, riqueza e fama a vítimas inocentes que confiam cegamente em promessas enganadoras. É tempo de a humanidade doente pelo lucro deixar-se curar pela fraternidade e pela solidariedade”, pondera.

O tráfico humano durante a pandemia

Ainda não há dados certos a respeito, mas é provável que a pandemia pode ter piorado o tráfico humano. “Ainda não temos os números finais do ano 2020, mas estudos preliminares apontam que com a pandemia do Coronavírus, ao invés de diminuir, aumentou a situação do tráfico no Brasil e no mundo”, lamenta Dom Evaristo. “Muitos países entraram em recessão, milhares de pessoas no mundo estão sem trabalho, fora da escola e sem apoio social. Isso é um indicador de que a situação do tráfico venha piorar ainda mais”.

O presidente da Comissão Contra o Tráfico assegura que os cuidados da Igreja, especialmente nestes dias pandêmicos, foram redobrados. “A Igreja no Brasil está sendo incansável, durante a pandemia, em apoiar grupos vulneráveis, especialmente contribuindo na segurança alimentar. Contudo é visível em todo o país o aumento da fome, da exploração do trabalho infantil e da exploração sexual. Esses crimes estão naturalizados em nossa sociedade. Fechar os olhos para essa realidade é fechar os olhos para o tráfico humano que decorre deles e persiste como uma atividade crescente e invisível em nosso meio”, finaliza.

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