DISCURSO

Papa: que as sombras da guerra não dissipem o sonho de paz

No discurso às autoridades e ao Corpo Diplomático, as palavras de Francisco são acompanhadas pela imagem da rosa dos ventos: o norte lembra a Europa, o oeste está ligado aos ocidentais, o sul junta-se à questão migratória e o leste recorda os ventos de guerra

Da redação, com Vatican News

Papa Francisco com o presidente de Malta, George Vella / Foto: Reprodução Youtube Vatican News

O primeiro compromisso do Papa Francisco em Malta na manhã deste sábado, 2, foi o encontro com as autoridades, o Corpo Diplomático e os representantes da sociedade e do mundo da cultura no Palácio Presidencial de Valeta.

Ao agradecer as amáveis palavras do presidente George Vella, o Pontífice recordou que os antepassados malteses deram hospitalidade ao Apóstolo Paulo e seus companheiros, durante a sua viagem a Roma, tratando-os com “extraordinária benevolência”.

Referindo-se à Ilha de Malta, coração do Mediterrâneo, Francisco recordou que “há milênios, o entrelaçamento de acontecimentos históricos e o encontro de populações fizeram daquelas ilhas um centro de vitalidade e cultura, espiritualidade e beleza; uma encruzilhada que soube acolher e harmonizar os influxos migratórios de muitas partes.

Esta diversidade de influxos nos leva a pensar na variedade dos ventos, que caracterizam o país. Não é por acaso que, nos antigos mapas do Mediterrâneo, a “Rosa dos Ventos” era colocada perto de Malta”.

Tomando a imagem da “Rosa dos Ventos”, que localiza as correntes de ar segundo os quatro pontos cardeais (Norte, Sul, Leste e Oeste), o Papa delineou quatro aspectos essenciais da vida social e política do país.

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O vento Norte, recorda a União Europeia, onde vive uma grande família, unida na salvaguarda da paz. A paz brota da unidade. Eis a importância de trabalhar juntos, sem divisões, revigorando as raízes e valores, que forjaram a unidade da sociedade maltesa. Mas, para garantir uma boa convivência social, é preciso também reforçar os alicerces da vida comum, com base no direito, legalidade, honestidade e justiça. Por isso, o esforço de eliminar a ilegalidade e a corrupção deve ser forte como o vento do norte, que purifica as costas do país, erradicando a inércia e a criminalidade. A Casa Europeia compromete-se com a promoção dos valores da justiça e equidade social e a tutela de uma casa mais ampla: a Casa da Criação.

O vento Norte, disse Francisco, mistura-se, às vezes, com o vento que sopra do Oeste. Este país europeu, sobretudo os jovens, partilham dos estilos de vida e pensamento ocidentais, dos valores da liberdade e da democracia, mas também dos riscos da ambição do progresso, que os podem separar das raízes.

Os malteses defendem a vida e salvam tantas pessoas. Por isso, Francisco os encorajou a continuar a defender a vida, desde o início até ao seu fim natural, mas também preservá-la sempre, sobretudo a dignidade dos trabalhadores, dos idosos e dos doentes.

Continuando a comparação com a “Rosa dos Ventos”, o Santo Padre convidou a olhar para Sul, de onde vêm tantos irmãos e irmãs em busca de esperança. Malta, disse, significa “porto seguro”. O crescente afluxo dos migrantes gera medo e insegurança, desânimo e frustração. O fenômeno migratório marca a nossa época e traz consigo injustiças, exploração, mudanças climáticas, conflitos e suas consequências. Multidões de pessoas partem do sul, pobre e povoado, e se dirigem para o norte rico. E Francisco acrescentou:

“O agravamento da emergência migratória, pensemos nos refugiados da atormentada Ucrânia, exige respostas amplas e partilhadas. Apenas alguns países não podem arcar com todo este problema, diante da indiferença de outros! Países civis não podem ratificar, por interesses próprios, acordos obscuros com criminosos que escravizam as pessoas. O Mediterrâneo precisa da corresponsabilidade europeia, para voltar a ser teatro de solidariedade e não lugar de trágicos naufrágios.”

Recordando o naufrágio do Apóstolo Paulo que, de modo inesperado, chegou àquelas costas e foi socorrido, o Papa exortou, em nome do Evangelho, que ele pregou naquela Ilha, a “abrir os corações para descobrir a beleza de servir aos mais necessitados. Não devemos encarar o migrante como ameaça, mas como irmão a ser acolhido, segundo o ideal cristão.

Por fim, o Pontífice referiu-se ao vento que sopra do Leste, do Oriente, de onde provêm ventos de guerra, invasões, combates e ameaças atômicas, que só causam mortes, destruição e ódio. Que estas sombras obscuras não levem a dissipar o sonho de paz da humanidade. E, ao expressar seu desejo de que o risco de uma “guerra fria alargada” não ceife mais vidas de gerações e inteiros povos, afirmou:

“A guerra é preparada com grandes investimentos e tráficos de armas. Quanto é triste ver que o entusiasmo pela paz, surgido após a II Guerra Mundial, se enfraqueceu nas últimas décadas; em âmbito internacional, alguns poderosos avançam, por conta própria, à busca de espaços e regiões de interesse. Assim, não só a paz, mas também tantas questões importantes, como a luta contra a fome e as desigualdades, foram canceladas das agendas dos políticos.”

O Papa concluiu seu discurso, dirigindo, mais uma vez, seu olhar ao Leste europeu e um pensamento ao Oriente Médio, a fim de que sigam o exemplo dos malteses, que geram benéficas convivências, apesar das diversidades. É disto que precisam o Líbano, a Síria, o Iêmen e outros contextos, dilacerados por problemas e violência”.

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