Coletiva após viagem apostólica

"Meu interesse é que chegue a mensagem", diz Papa a jornalistas

Santo Padre conversou com jornalistas no voo de volta a Roma após viagem a Bangladesh

Rádio Vaticano

“Para mim, a viagem faz bem quando consigo encontrar o povo do país, o povo de Deus. Quando consigo falar ou encontrá-los ou a saudá-los”. Com estas palavras o Papa Francisco concluiu a coletiva de imprensa no avião que o levou de volta de Bangladesh, na noite de sábado, 2 de dezembro.

O encontro de 58 minutos com os jornalistas começou meia hora após o avião ter decolado do Aeroporto Internacional de Daca. Entre os temas tratados, o drama humanitário da etnia Rohingya, a questão nuclear, a possibilidade – ainda remota – de uma visita à China.

Eis a transcrição da entrevista:

Greg Burke:
Obrigado Santo Padre, antes de tudo obrigado: O senhor escolheu estes dois países interessantes para visitar, dois países muito diferentes, mas com algo em comum, que é uma Igreja pequena, em cada um destes países, mas muito ativa, plena de alegria, cheia de jovens e repleta de um espírito de serviço a toda a sociedade. Nós certamente vimos muito, aprendemos muito, mas nos interessa saber o que o senhor viu e aprendeu, Se o senhor quiser fazer uma saudação antes das perguntas.

Papa Francisco:
Boa noite…se pensamos aqui, ou boa tarde, se pensamos em Roma. Muito obrigado pelo trabalho de vocês e, como disse Greg, são dois países muito interessantes com culturas muito tradicionais, profundas, ricas. Por isto penso que o trabalho de vocês tenha sido muito intenso. Muito obrigado.

Greg Burke:
Se posso roubar o microfone por um segundo: a primeira pergunta é de Sagrario Ruiz de Apodaca, da Rádio Nacional da Espanha.

Sagrario Ruiz de Apodaca (RNE):
Boa tarde, Santo Padre. Obrigado. Eu faço a pregunta em espanhol, com a permissão de meus colegas italianos, porque ainda não confio no meu italiano, mas se o senhor quiser responder em italiano, seria perfeito para todos. A crise dos rohingya concentrou grande parte desta viagem à Ásia. Ontem, o senhor finalmente os chamou pelo nome, em bengali. O senhor teve vontade de ter feito o mesmo em Mianmar, de ter usado esta palavra para referir-se a eles, rohingya? E, o que sentiu ontem quando pediu a eles perdão?

Papa Francisco:
Não foi a primeira vez ontem. Várias vezes em público, desde a Praça São Pedro, no Angelus ou em audiências eu os nomeei…

Sagrario Ruiz de Apodaca:
Mas nesta viagem…

Papa Francisco:
Sim, porém quero sublinhar que já se sabia o que pensava e o que dizia. Porém sua pregunta é muito interessante, porque me leva…. A sua pregunta é interessante porque me leva a refletir sobre como eu procuro comunicar-me. Para mim, a coisa mais importante é que a mensagem chegue, e por isto procurar dizer as coisas passo a passo e ouvir as respostas, para que chegue a mensagem. Por exemplo, um exemplo da vida cotidiana: um jovem, uma jovem na crise de adolescência pode dizer aquilo que pensa, batendo a porta na cara do outro e a mensagem não chega, se fecha. Para mim interessa que esta mensagem chegue. Por isto, vi que se no discurso oficial tivesse pronunciado a palavra, teria batido a porta na cara. Mas descrevi a situação, os direitos, ninguém excluído, cidadania para permitir-se nos colóquios privados ir além. Eu fiquei muito, muito satisfeito pelos colóquios que pude ter, porque é verdade, não – digamos assim – não tive o prazer de bater a porta na cara, publicamente, uma denuncia: não, mas tive a satisfação de dialogar, de fazer o outro falar, de dizer a minha e assim a mensagem chegou. E chegou a tal ponto, que continuou e continuou e acabou ontem com aquilo. E isto é muito importante, na comunicação: a preocupação que a mensagem chegue. Tantas vezes, denúncias, mesmo na mídia – não querem ofender, mas que com alguma coisa de agressividade fecham o diálogo, fecham a porta e a mensagem não chega. E vocês, que são especialistas em fazer chegar a mensagem, entendem bem isto.

O senhor me pregunta o que eu senti ontem: isto não estava programado, assim. Eu sabia que encontraria os rohingya. Não sabia nem onde e nem como, mas esta era a condição da viagem, para mim, e se preparavam as formas. Depois de tantas tratativas, também com o governo, com a Caritas, o governo permitiu esta viagem, destes que vieram ontem. Porque o governo, que os protege e dá a eles hospitalidade – e isto é grande: o que faz Bangladesh por eles é grande, é um exemplo de acolhida. Um país pequeno, pobre, que recebeu 700mil… eu penso em países que fecham as portas. Devemos ser agradecidos pelo exemplo que nos deram. O governo deve trabalhar por relações internacionais com Mianmar com permissões, diálogo, porque estão em campo refugiados, um estado [estatuto, condição] especial. Mas, afinal, vieram. Assustados. Não sabiam. Também, alguém ali havia dito [a eles]: “Saúdem o Papa, mas não digam nada”, e assim…alguém que não era do governo de Bangladesh…gente que se ocupava dos trâmite… A um determinado ponto, após o diálogo inter-religioso, a oração inter-religiosa, isto preparou o coração de todos nós: estávamos religiosamente muito abertos. Eu, ao menos, me sentia assim. E chegou o momento que eles vieram me saudar. Em fila indiana – não gostei disto, mas…um, o outro… – mas logo queriam mandá-los embora do cenário. E ali eu me irritei e gritei um pouco – sou pecador… – e disse tantas vezes a palavra “respeito”: respeito. Parei, e eles ficaram ali. Depois de tê-los ouvido um a um com a intérprete que falava a sua língua, eu comecei a sentir coisas dentro: “Mas, eu não posso deixá-los ir sem dizer uma palavra”, e pedi o microfone. E comecei a falar… não recordo o que disse. Sei que em determinado momento pedi perdão. Acredito que duas vezes, não me recordo. Mas a sua pergunta é “o que senti”: no momento, eu chorava. Procurava que não vissem. Eles também choravam. E depois, pensei que estávamos em um encontro inter-religioso, e [enquanto] os líderes das outras tradições religiosas, os religiosos estava, distantes: “não, venham vocês também: eles são os rohingyas de todos nós”. E eles saudaram, ali…e eu não sabia o que mais dizer porque olhavam para eles, saudava… e pensei: “Todos nós falamos, os líderes religiosos. Mas, um de vocês, que faça uma oração, um de vocês…”.
E acredito que fosse um Imã, um “clérigo” da religião deles, que fez aquela oração, e também eles rezaram ali, conosco. E vendo tudo o que se passou, todo o caminho, eu senti [que] a mensagem tinha chegado. Não sei se satisfiz a sua pergunta, mas parte era programado, mas a grande parte aconteceu espontaneamente. Depois, hoje teve – me disseram – um programa feito por um de vocês – não sei se está aqui ou não está aqui – o TG1: é um programa longo, longo…quem o fez, a senhora o sabe?

Greg Burke:
Está ainda em Bangladesh, TG1

Papa Francisco:
E que depois foi repetido no TG4, não sei… Eu não vi, mas alguns que estão aqui viram. Uma reflexão: a mensagem chegou não somente aqui. Vocês viram hoje as capas dos jornais: todos receberam a mensagem. E eu não ouvi nenhuma crítica. Talvez existirão, mas eu não ouvi nenhuma.

Greg Burke:
A próxima pergunta é de George Abraham Kallivayalil, um indiano que viaja conosco pelo “Deepika Daily”:

George Abraham Kallivayalil, “Deepika Daily”:
Santo Padre, espero que a sua viagem à Ásia, a dois países, tenha sido de grande sucesso. Nós sabemos que nesta mesma ocasião, o senhor gostaria de ter ido à Índia […]. Qual foi exatamente a razão que fez com que a hipótese de ir à Índia caiu por terra? Milhões de pessoas na Índia, incluindo os nossos fiéis, ainda desejam e esperam que o Santo Padre visite a Índia no próximo ano: podemos esperá-lo na Índia em 2018?

Papa Francisco:
Sim: o plano inicial era de ir à Índia e Bangladesh, mas depois as tratativas para ir se alongaram, o tempo urgia e escolhi estes dois países. Bangladesh permaneceu, mas com Mianmar. Foi providencial, porque para visitar a Índia é necessária uma única viagem: você deve ir ao Sul, ao Centro, a Leste, a Oeste, ao Norte, dali, pelas diversas culturas da Índia… espero poder fazer em 2018, se estiver vivo. Mas a ideia era Índia e Bangladesh. Mas depois o tempo nos obrigou a fazer esta escolha. Obrigado.

Greg Burke:
E agora, do grupo francês, Santo Padre, Ettiene Loraillere di Kto, que é da televisão católica.

Etiene Loraillère, Kto:
Santidade, tem uma pergunta do grupo de jornalistas da França. Alguns colocam em oposição diálogo inter-religioso e evangelização. Durante esta viagem, o senhor falou de diálogo para construir a paz. Mas qual é a prioridade: evangelizar ou dialogar pela paz? Porque, evangelizar significa suscitar conversões que provocam tensões e às vezes conflitos entre os que acreditam; portanto, qual é a prioridade, evangelizar ou dialogar?

Papa Francisco:
Obrigado. Primeira distinção: evangelizar não é fazer proselitismo. A Igreja cresce não por proselitismo, mas por atração, isto é, por testemunho, Isto o disse o Papa Bento XVI.
O que é a evangelização? É viver o Evangelho, é testemunhar como se vive o Evangelho, testemunhar as bem-aventuranças, testemunhar Mateus 25, testemunhar o Bom Samaritano, testemunhar o perdão 70 x 7. Neste testemunho o Espírito Santo trabalha e acontecem conversões. Mas nós não somos muito entusiasmados para fazer logo as conversões. Se vêm, esperam , se fala, a tradição de vocês, procurar que uma conversão seja a resposta a algo que o Espírito Santo moveu em meu coração diante do testemunho do cristão.

No almoço com os jovens na Jornada Mundial da Juventude em Cracóvia, eram cerca de 15, e um deles me fez esta pergunta: O que devo dizer a um colega de universidade, bom amigo, mas que é ateu? O que devo dizer para mudá-lo, para convertê-lo? A resposta foi esta: a última coisa que tu deves fazer é dizer algo. Tu viva o Evangelho e se ele te pergunta porque fazes isto, podes explicar a ele porque o fazes e deixe que o Espírito Santo o atraia. Esta é a força e a mansidão do Espírito Santo na conversão. Não é convencer mentalmente, com apologética, razão. É o Espírito que faz a conversão. Nós somos testemunhas do espírito, testemunhas do Evangelho. Testemunha, uma palavra grega que diz mártires. O martírio de todo o dia, o martírio também de sangue quando chega. E a sua pergunta: o que é prioritário, a paz ou a conversão? Mas quando se vive com testemunho e respeito, se faz a paz. A paz começa a se romper neste campo quando começa o proselitismo. E existem tantos modos de proselitismo. Isto não é Evangelho. Não sei se respondi.

Greg Burke:
Obrigado, Santidade. Agora, do grupo anglófono, Joshua McElwee do “National Catholic Reporter”:

Joshua McElwee, Ncr:
Muito obrigado, Santidade, e uma mudança total de tema. Durante a Guerra Fria, o Papa São João Paulo II disse que a política mundial de dissuasão nuclear era julgada como moralmente aceitável. No mês passado, em uma conferência sobre o desarmamento, o senhor disse que a simples posse de armas nucleares deve ser condenada. O que mudou no mundo que o levou a fazer esta mudança? Que papel tiveram os insultos e as ameaças entre o Presidente Donald Trump e Kim Jong-um nas suas decisões? E o senhor, o que diz aos políticos que não querem renunciar aos arsenais nucleares e tampouco reduzi-los?

Papa Francisco:
Eu preferiria que antes fossem feitas as perguntas sobre a viagem, digo isto a todos; mas faço uma exceção porque você fez a pergunta. Mas agora, finalizemos tudo sobre a viagem. Depois, eu gostaria de dizer alguma coisa sobre a viagem e depois vem as outras perguntas.

O que mudou: mudou a irracionalidade. Me vem em mente a Encíclica “Laudato Si”, a custódia da Criação. Desde o tempo em que o Papa São João Paulo II disse isto até hoje passaram-se tantos anos, quantos? Tens a data?

Joshua McElwee, Ncr:
1982.

Papa Francisco:
1982, 1992, 2002, 2012 e quatro: 34 anos. No nuclear, em 34 anos, se foi além, além, além. Hoje estamos no limite: isto pode ser discutido, mas é a minha opinião; mas a minha opinião convicta: eu estou convencido disto. Estamos no limite da legitimidade de ter e usar armas nucleares. Por que? Porque hoje, com o arsenal nuclear assim tão sofisticado, se corre o risco da destruição da humanidade, ou ao menos de grande parte da humanidade. Por isto relaciono com a “Laudato Si”. O que mudou? Isto. O crescimento do armamento nuclear, mudou também…são sofisticadas e também cruéis, também são capazes de destruir as pessoas sem tocar as estruturas. Estamos no limite, e porque estamos no limite eu me faço esta pergunta, e isto não como Magistério Pontifício, mas é a pergunta que se faz um Papa: hoje é lícito manter os arsenais nucleares [assim] como estão, ou hoje, para salvar a Criação, salvar a humanidade não é necessário retroceder? Volto a uma coisa que havia dito, que é de Guardini, não é minha. Existem duas formas de incultura: antes a incultura que Deus nos deu para fazer cultura, com o trabalho, com a pesquisa e em frente, fazer a cultura…mas, pensemos nas ciências médicas, tanto progresso, tanta cultura, na mecânica, em tantas coisas. E o homem tem a missão de fazer cultura da cultura recebida. Mas chegamos a um ponto em que o homem tem em mãos, com esta cultura, a capacidade de fazer uma outra incultura: pensemos em Hiroshima e Nagasaki. E isto, há 60, 70 anos. A destruição. E também isto acontece quando na energia atômica não se consegue ter todo o controle: pensem nos incidentes na Ucrânia… Por isto, voltando às armas, que são para vencer destruindo, eu digo que estamos no limite da legitimidade.

Greg Burke:
Obrigado Santidade. Agora me assinalaram que as perguntas mudam da viagem a outras, portanto, se o senhor quiser dizer alguma coisa sobre a viagem…

Papa Francisco:
Eu gostaria de mais alguma sobre a viagem, porque poderia parecer que não tenha sido tão interessante, não?

Delia Gallagher, Cnn:
Santidade, não sei o quanto o senhor possa ou não responder, mas estou muito curiosa a respeito de seu encontro com o General Hein, porque eu aprendi muito sobre esta situação, estando lá, e entendi que à parte Aung San Suu Kyi, há também este militar que é muito importante na crise, que o senhor encontrou pessoalmente. Que tipo de encontro foi e como fez para conversar com ele?

Papa Francisco:
Inteligente a pergunta, bela. Mas eu distinguiria entre dois encontros, dois tipos de encontros. Os encontros em que eu fui encontrar as pessoas e os encontros nos quais eu recebi as pessoas. Este general, ele pediu para conversar: eu o recebi. Eu nunca fecho a porta. Você pede para conversar? Venha! Falando não se perde nada, se ganha sempre. Foi uma bela conversa. Eu não poderia revelar, porque foi privada, mas eu não negociei a verdade, asseguro para vocês. Mas o fiz de tal forma que ele entendeu um pouco, que um outro caminho, como era nos tempos difíceis, renovado hoje, não é viável. Foi um belo encontro, civilizado; e também ali, chegou a mensagem.

Gerry O’Connell, “America Magazine”:
Obrigado, Padre. A minha é de certa forma o desenrolar da pergunta da Delia. O senhor encontrou Aung Sam Suu Kyi, o Presidente, os militares, o monge que cria um pouco de dificuldade, e depois o senhor foi a Bangladesh, encontrou também a Primeira Ministra, o Presidente, os líderes islâmicos de lá e os líderes budistas em Myanmar A minha pergunta: o que o senhor traz de todos estes encontros? Qual é a sua análise de todos estes encontros? Quais perspectivas para o futuro em um desenvolvimento melhor para estes dois países, também considerando a situação dos rohingya?

Papa Francisco:
Não será fácil, para seguir em frente em um desenvolvimento construtivo, e não será fácil para quem quiser voltar atrás. Estamos em um ponto em que as coisas devem ser estudadas. Alguém – não sei se é verdade: isto não sei se é verdade – me disse que o Estado de Rakhine é um Estado muito rico em pedras preciosas e que talvez poderiam existir interesses de ser uma terra um pouco sem pessoas para trabalhar. Mas não sei se é verdade: estas são hipóteses que se fazem, também sobre a África se fazem tantas. Mas acredito que estamos em um ponto onde não será fácil seguir em frente, no sentido positivo, e não será fácil voltar atrás porque a consciência, hoje, da humanidade… o fato – e volto aos rohingya – de que as Nações Unidas tenham dito de que os rohingya são hoje a minoria religiosa e étnica mais perseguida do mundo, este é um ponto que, a quem quer voltar atrás, deve pesar. Estamos em um ponto, ali, que com o diálogo, começar um passo e outro passo, talvez meio passo para trás e dois para frente, mas como se fazem as coisas humanas: com benevolência, com diálogo, nunca com agressões, nunca com a guerra. Não é fácil. Mas é um ponto de virada: se faz, este ponto de virada, para o bem, ou se faz, este ponto de virada, para voltar atrás? Ah, sim, a esperança eu não a perco, não? Porque, sinceramente, se o Senhor permitiu isto que vivemos ontem e que vivemos de maneira reservada, exceto dois discursos, o Senhor permite alguma coisa para prometer outra. Eu tenho a esperança cristã, não se sabe nunca…

Valentina Alazraki, “Televisa”:
Sobre a viagem, era um pergunta que queríamos ter feito ao senhor antes e acabou não dando. Nós gostaríamos de saber: um Papa que todos os dias fala de refugiados, migrantes. O senhor gostaria de ter ido a um capo de refugiados dos rohingya? E por que não foi?

Papa Francisco:
Não, é verdade. Eu gostaria de ter ido. Gostaria de ter ido, mas não foi possível. Se estudaram as coisas, não foi possível. Por vários fatores, também o tempo, também a distância, mas também outros fatores. Mas o campo refugiado veio até mim, como representação. Eu teria gostado, mas não foi possível.

Greg Burke:
O senhor decide? Escolhe o senhor?

Papa Francisco:
Não: eu vi ali que vinha para frente…

Enzo Romeo, Rai:
Santidade, obrigado. Eu gostaria de perguntar duas coisas, rapidamente. Uma sobre globalização, porque vimos sobretudo em Bangladesh, e é motivo da pergunta ligada à viagem, que é um país que está buscando sair da pobreza, mas com sistemas que parecem para nós realmente pesados. Fomos até o Rana Plaza, aquele lugar onde desabou o prédio que era utilizado pelas indústrias têxteis: 110 pessoas mortas, 5 mil feridos, por 60 euros ao dia, trabalhavam. Em nosso restaurante, para comer um prato de pizza, se pagava 50 euros. Isto parece incrível. Na sua opinião, daquilo que o senhor viu e ouviu, é possível sair deste mecanismo? E a outra coisa é esta, que pensamos todos: sobre a questão-rohingya, parecia que havia também o desejo por parte de alguns grupos jihadistas de intervir, al Qaeda, Isis, que, pelo que parece, tentavam tornar-se os tutores deste povo, da liberdade deste povo. É interessante que o líder da cristandade tenha se mostrado mais amigo, de qualquer forma, destes grupos extremistas: é correta esta sensação?

Papa Francisco:
Parto da segunda: havia grupos terroristas ali, que tentavam se aproveitar da situação dos rohingya, que são gente de paz. Eles são como todas as etnias e todas as religiões, sempre existe um grupo fundamentalista. Também nós católicos os temos. Os militares justificam a sua intervenção por causa destes grupos. Eu não escolhi falar com esta gente: eu escolhi falar com as vítimas desta gente. Porque as vítimas eram o povo rohingya, que por um lado sofria aquela discriminação, e por outro era defendido pelos terroristas. Mas pobrezinhos! O governo de Bangladesh tem uma campanha muito forte – assim me disseram os ministros – de tolerância zero com o terrorismo, e não somente por isto: para evitar outros pontos. Mas estes que se alistaram no Isis, mesmo que sejam rohingya, mas é um grupo fundamentalista extremista, pequeno. Mas isto fazem os extremistas: justificam a intervenção que destruiu bons e maus.

Greg Burke:
E a globalização, não?, a primeira pergunta:

Papa Francisco:
É um dos problemas mais sérios. Falei disto nos encontros pessoais. Eles estão conscientes disto, estão conscientes também do fato de que a liberdade até um certo ponto é condicionada, não somente pelos militares, mas pelos grandes trust internacionais. E apostaram na educação, acredito que tenha sido uma escolha sábia. Existem planos educativos… me mostraram percentuais dos últimos anos, como decresceu o analfabetismo. Esta é a escolha deles, quem dera que vá bem, porque eles sustentam que com a educação o país crescerá.

Jean-Marie Guénois, « Le Figaro » :
Boa noite. Hoje, portanto, Birmânia, o país do qual vem… Antes disto, o senhor esteve na Coreia, nas Filipinas, no Sri Lanka… dá a impressão de fazer uma volta ao redor da China… Portanto, duas perguntas sobre a China. Está em preparação uma viagem sobre a China? E, a segunda pergunta: que coisas o senhor aprendeu nesta viagem sobre a mentalidade asiática e também em vista deste projeto sobre a China? Qual foi a lição para o senhor?

Papa Francisco:
….colocar o nariz na China… Hoje a Sra. Conselheira de Estado de Mianmar foi a Pequim: se vê que existem diálogos ali. Pequim tem uma grande influência na região, porque é natural: Mianmar não sei quantos quilômetros tem de fronteira ali; também nas Missas havia chineses que vieram… Acredito que nestes países que circundam a China, também o Laos, o Camboja, têm necessidade de boas relações, são vizinhos. E isto eu acho sábio, politicamente construtivo se pode avançar. Porém, é verdade que a China hoje é uma potência mundial: se a olharmos sob esta ótica, pode mudar o panorama. Mas serão os cientistas políticos a nos explicar, eu não posso, não sei. Mas me parece natural que tenham uma boa relação.

A viagem à China não está em preparação: fiquem tranquilos, no momento não está em preparação. Mas voltando à Coreia, quando me disseram que estávamos atravessando o espaço aéreo chinês, se queria dizer alguma coisa: que gostaria muito de visitar a China! Gostaria, não é um segredo. As tratativas com a China são de alto nível cultural: hoje, por exemplo, nestes dias, há uma Mostra dos Museus Vaticanos na China, depois terá outra – ou teve uma, não sei – dos Museus chineses no Vaticano… as relações culturais, científicas, os professores, padres que ensinam na Universidade estatal chinesa, existem… É uma coisa. Depois, existe o diálogo político, sobretudo pela Igreja chinesa, com aquela história da Igreja Patriótica, a Igreja clandestina, que se deve caminhar passo a passo, com delicadeza, como se está fazendo. Lentamente. Acredito que nestes dias, hoje ou amanhã, começará uma reunião em Pequim da Comissão mista. E isto, com paciência. Mas as portas do coração estão abertas, E acredito que fará bem a todos, uma viagem à China. Eu gostaria muito de fazê-la…

James Longman, “Abc News”:
Me desculpo, mas eu não falo italiano. Obrigado pela possibilidade de estar em seu voo: para mim é a primeira vez. Gostaria de perguntar ao senhor se soube das tantas críticas feitas a Aung San Suu Kyi? E se pensa que as críticas que foram dirigidas ao senhor por não ter se expressado de maneira explícita sobre a questão rohingya sejam leais.

Papa Francisco:
Ouvi tudo aquilo, ouvi as críticas, ouvi a crítica por não ter ido à Província de Rakhine. Depois ela foi, ela foi por meia jornada, mais ou menos. Em Mianmar é difícil avaliar uma crítica sem perguntar: foi possível fazer isto? Ou: como será possível fazer isto? Com isto não quero dizer que não tenha sido um erro ir, não ir; mas em Mianmar a situação política… é uma Nação em crescimento, politicamente em crescimento; é uma Nação em transição que tem tantos valores culturais na história, mas politicamente está em transição. E por isto, as possibilidades devem ser avaliadas também sob esta ótica. Neste momento de transição, teria sido possível ou não fazer isto, ou aquilo? E ver se foi um erro ou não foi possível. Não somente para a Sra. Conselheira de Estado: também para o Presidente, para os deputados, para o Parlamento… em Mianmar, se deve olhar sempre em frente a construção do país. E ali se faz como disse no início: dois passos em frente, um atrás, dois em frente, um atrás… a história nos ensina isto. Não sei responder de outra forma, com o pouco conhecimento que tenho sobre o lugar. E eu não gostaria de cair naquilo que fazia um filósofo argentino, que era convidado a proferir conferências em países da Ásia: uma semana, e quando voltava, escrevia um livro sobre a realidade daquele país. Isto é presunçoso.

Phil Pullella, Reuters:
Gostaria de voltar à viagem, se possível. O encontro com o general era originalmente previsto, acredito, para a quinta-feira de manhã, e se não me engano, com os generais. Mas ao invés disto, o senhor deveria ver antes Aung San Suu Kyi. Quando o general pediu para vê-lo antes, isto é, justamente no dia da chegada, na sua opinião foi um modo de dizer “aqui comando eu, o senhor deve ver primeiro a mim”? E naquele momento ali, talvez, o senhor sentiu que ele queria manipulá-lo?

Para Francisco:
Entendo. O pedido foi porque ele deveria ir à China e sempre que acontecem estas coisas, se eu posso tranferir um encontro, o faço. As intenções, não sei. Mas para mim interessava o diálogo. Um diálogo pedido por eles e que eles viessem a mim: não era prevista a minha visita, ali. E acredito que fosse mais importante o diálogo do que a suspeita de que fosse justamente aquilo que a senhora disse: “Nós comandamos aqui, sejamos os primeiros”.

Phil Pullella:
Posso perguntar se é – o senhor disse que não pode dizer o que disse durante os encontros privados, porém posso pedir ao menos se durante aquele encontro o senhor usou a palavra “rohingya”, com o general?

Papa Francisco:
Eu usei as palavras para chegar a mensagem e quando vi que a mensagem era aceita, ousei dizer tudo aquilo que queria dizer (…).

Jornalista
Boa noite, Santidade. Eu tenho uma pergunta: ontem, quando estivemos com os padres que fizeram os votos. Pensei se não têm medo de ser padres católicos neste momento da vida católica neste país, e se eles pediram ao senhor, a Sua santidade, o que fazer quando vem o medo e não sabe o que fazer..

Papa Francisco:
Esta é a sua primeira viagem não?

Jornalista:
Sim …

Papa Francisco:
Imiti Valentina, eh? Mas, se acomode…eu tenho o hábito, sempre, de cinco minutos antes da ordenação, falar com eles privadamente. Mas pareceram serenos, tranquilos, conscientes, tinham consciência da missão: pobres, normais. Normais. Uma pergunta que eu fiz foi: “Vocês jogam futebol?” – “Sim”, todos. Isto é importante. Uma pergunta teológica, era aquela… Mas não percebi medo. Eles sabem que devem estar próximos ao seu povo; sentem que devem estar apegados ao povo, e isto me agradou: gostei disto. Depois falei com os formadores, algum bispo, que me disse; antes de entrar no seminário, se faz um pré-seminário de forma que aprendam tantas coisas, também hábitos, também que aprendam perfeitamente o inglês. Isto, para dizer uma coisa prática: se não sabem inglês, começam no seminário, a tal ponto que a ordenação não é aos 23, 24 anos, mas aos 28, 29, mais ou menos. Parecem crianças, porque eles parecem todos jovens, todos, também os grandes. Os vi seguros…mas aquilo sim, o tinham: próximos ao povo. Isto sim. E levam a sério, eh! Porque cada um deles pertence a uma etnia e isto levam a sério, obrigado.

Agradeço a vocês, porque me dizem que o tempo passou. Agradeço pelas perguntas, agradeço por tudo aquilo que vocês fizeram. E, o que pensa o Papa de sua viagem? Para mim, a viagem faz bem quando consigo encontrar o povo do país, o povo de Deus. Quando consigo falar ou encontrá-los ou a saudá-los: encontros com as pessoas. Falamos dos encontros com os políticos, com… Sim, é verdade: se deve fazer; com os padres, com os bispos…mas, com a gente. Isto, o povo. O povo que é justamente o profundo de um país. O povo. E isto, quando o encontro, quando consigo encontrar, então sou feliz. Agradeço muito a vocês pelo trabalho, muito obrigado. E obrigado pelas perguntas, pelas coisas que aprendi com as perguntas de vocês. Obrigado. Boa janta!

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