Entrevista com Dom Petrini

Divórcio não é única opção para problemas no relacionamento

Segundo uma pesquisa divulgada nesta quarta-feira, 30, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de divórcios em 2010 foi o maior desde 1984, chegando a 1,8%, ou seja, 1,8 divórcios para cada mil pessoas de 20 anos ou mais.

O estudo "Estatísticas do Registro Civil" aponta ainda que o aumento se deve à eliminação dos prazos para requerer o divórcio, que antes eram mais demorados, e foram facilitados pelo Divórcio Instantâneo, aprovado em julho de 2010.  

O presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e a Família da CNBB, Dom João Carlos Petrini, concedeu uma entrevista ao noticias.cancaonova.com sobre o assunto. Para ele, atualmente é "mais fácil e rápido desfazer um matrimônio do que desfazer um contrato com a operadora de telefone", fato que evidencia como as relações humanas, especialmente as relações conjugais e familiares, estão sendo banalizadas.

Segundo o bispo, muitos acham que o divórcio é a única solução para o problema no relacionamento, mas na verdade, há muitas soluções para essas dificuldades sem precisar terminar o casamento. Entre as opções está a retomada do carinho e respeito entre o casal, a busca por um amadurecimento do amor e a partilha e apoio de casais ou amigos mais experientes.

Confira a entrevista na íntegra

noticias.cancaonova.com: O IBGE divulgou uma pesquisa sobre o aumento do número de divórcios em 2010, provavelmente devido a lei do divórcio instantâneo, aprovado no ano passado. Quais os riscos de uma lei como essa que facilita a separação entre os casais?

Dom Petrini: Hoje em dia parece mais fácil e rápido desfazer um matrimônio do que desfazer um contrato com a operadora de telefone! Não somente isto corresponde à sociedade onde tudo deve ser rapidinho para não retirar tempo das coisas consideradas mais importantes, mas é um sinal da banalidade que toma conta das relações humanamente mais significativas, como são as relações conjugais e, de modo mais amplo,  familiares, com o perigo de não ponderar de forma adequada as implicações, as consequências da ruptura do vínculo conjugal para si e para os eventuais filhos. As exigências individuais se sobrepõem com relativa facilidade à vida em família.  

noticias.cancaonova.com: O senhor acredita que os casais que decidem se separar precipitadamente podem vir a se arrepender dessa atitude?

Dom Petrini: Uma separação pode acontecer por muitas razões, inclusive uma paixão que se despertou por outra pessoa e que, inevitavelmente, vai se apagando em pouco tempo, como costuma acontecer com todas as paixões. É necessário dar passos de crescimento para passar do amor vivido de maneira um tanto primitiva, como na adolescência: “eu gosto dela, quero ela para mim” para um patamar mais maduro de amor: “eu gosto dela, estou disposto a doar minha vida para o bem, para a felicidade dela”.

Esta qualidade de amor tem mais condições de perdurar no tempo, atravessar tempestades e tornar-se sempre mais fonte de realização e de felicidade. Mas, longe da Igreja e do Evangelho de Jesus Cristo, não conheço outras oportunidades que permitam a um casal crescer e apreender esta maneira de amar.

noticias.cancaonova.com:
A Igreja não aconselha o divórcio em nenhuma circunstância?  

Dom Petrini: A Igreja entende que a separação é a última medida a ser tomada quando, por alguma razão, a continuidade da convivência conjugal põe em perigo a incolumidade física ou a saúde psíquica ou a fé das pessoas envolvidas, depois de ter esgotado todas as possibilidade em busca de entendimento e conciliação.

Em geral, quem casa deseja que seu amor seja “para sempre”. Faz parte da estrutura humana este desejo de estabilidade e permanência na relação conjugal para partilhar tudo da vida durante a vida inteira. Na realidade, é necessária um grande cuidado párea reconhecer os primeiros e mínimos sinais de distância e de estranheza para que o casal imediatamente procure uma compreensão do problema e uma maneira de superá-lo. Nesse sentido, é importante que o casal peça ajuda a amigos mais experientes ou a uma pessoa de confiança porque é mais difícil que encontrem o caminho de saída do problema apenas entre eles.

O casal que participa de uma comunidade cristã, que está familiarizado com a oração, com a leitura da palavra de Deus, que tem amigos em quem confia terá mais facilidade para dar a volta por cima e encontrar-se, depois de atravessado o problema, numa relação mais profunda. O casal mais desligado e solitário tem maiores probabilidades de achar que a única solução ao problema enfrentado é a separação e o divórcio.

noticias.cancaonova.com: Quais as orientações da Igreja para os casais que passam por dificuldades no relacionamento?

Dom Petrini: Para que quotidianamente se renove o afeto que liga os esposos é necessário cultivar não somente a paixão, mas a estima pela outra pessoa, a vontade de partilhar as diversas circunstâncias da vida, numa abertura cheia de atenção para com a outra pessoa, feita de palavras e de atitudes que acolhem, valorizam e reafirmam a alegria por ter casado e a vontade de continuar unidos, porque considera a união conjugal como um grande bem.

O perigo é considerar estas atitudes desnecessárias, o afeto como um dado óbvio. Então, o relacionamento perde beleza, podendo tornar-se mais duro, pesado e vulgar. É evidente que o casal cristão, que procura crescer na fé e no amor, que busca a luz de Cristo para orientar seus passos e a sabedoria do Evangelho para discernir as diversas situações, que se alimenta de Cristo na Eucaristia, terá muito mais capacidade de construir uma família que não somente dura no tempo, mas que se renova no amor e se torna sempre mais fonte de satisfação e de realização humana.

Por isso, a orientação da Igreja para os casais é: não se isolem, procurem uma comunidade cristã, um movimento católico de modo a cultivar a amizade com Jesus e com as outras pessoas. Na simplicidade da proposta, este é o caminho para um crescimento humano e cristão que ajuda o casal a vivenciar cada circunstância como ocasião para crescer no amor.

Leia mais
.: É preciso facilitar reconciliação e não divórcio, diz padre
.: Assessor da CNBB lamenta aprovação de medida que acelera divórcio

Evite nomes e testemunhos muito explícitos, pois o seu comentário pode ser visto por pessoas conhecidas.

↑ topo